Rio de Janeiro, 1º de setembro (Terramérica) - Estão em moda na América Latina as iniciativas para neutralizar gases causadores do efeito estufa provenientes de atividades como a produção industrial, viagens de avião ou o mundial de futebol e, de passagem, expiar as culpas dos poluidores. Carbono zero contra a mudança climática é o lema, na maioria dos casos como forma de marketing, para atrair consumidores, usuários, espectadores ou turistas, aos quais se oferece plantar árvores que capturam a mesma quantidade desses gases – como o dióxido de carbono – emitida por eles.
Freqüentemente, seus fins são comerciais, mas contribuem de alguma forma para a educação ambiental e a mobilização popular na mitigação do aquecimento global. Alguns projetos, como o brasileiro Clickarvore e o Neutralízate, no México, vão além da simples tentativa de apagar rastros ecológicos de indivíduos ou empresas. O Clickarvore é anterior à atual onda de compensar o carbono emitido. O programa da Fundação SOS Mata Atlântica, com apoio do não-governamental Instituto Ambiental Vidágua e da Editora Abril, começou em 2000 com o objetivo de recuperar a devastada Mata Atlântica do Brasil.
Em um extenso território da costa oriental
brasileira, do Nordeste ao extremo sul, este ecossistema perdeu 93% de sua área
original ao acolher a maior parte das áreas urbanas e das indústrias do país,
afetando o abastecimento de água, a terra submetida a forte erosão e a rica
biodiversidade local. Cada clique no site http://www.clickarvore.com.br significa uma árvore plantada na
Mata Atlântica, e já foram semeados mais de 16 milhões de exemplares, doados a
930 projetos de reflorestamento em 350 municípios. O objetivo inicial era a
educação ambiental, "envolver as comunidades na conservação" do ecossistema,
disse ao Terramérica Ludmila Pugliese, coordenadora de Restauração Florestal da
SOS Mata Atlântica.
Tratava-se de fazer com que "as pessoas se sentissem
plantando árvores", contribuindo para seu próprio bem-estar e para minimizar o
aquecimento do planeta. Os internautas só podem fazer um clique por dia e os
campeões do mês ganham uma visita para conhecer a SOS ou camisetas. "Houve um
que fazia religiosamente todos os dias e, quando foi hospitalizado, nos
telefonava para não perder a liderança", contou Pugliese. Os doadores podem ver
pela internet as áreas reflorestadas com "suas árvores". A crescente adesão
levou a uma "visão restauradora, conectando fragmentos isolados de florestas",
de maneira a recuperar funções perdidas, com realimentação de mananciais e
aumento da fauna por meio de corredores biológicos, disse Pugliese, bióloga com
mestrado em Recursos Florestais.
Aos objetivos ambientais foram
incorporados outros, sociais. Milhões de mudas plantadas, além de expandir
negócios privados, permitiram criar cinco viveiros comunitários para que
organizações não-governamentais e comunidades pudessem obter sua própria renda e
empregar mais trabalhadores. Coordenado diretamente por cinco membros da SOS, o
programa ficou mais complexo ao envolver os internautas que clicam,
proprietários de terras que querem reflorestar, patrocinadores que oferecem as
mudas, viveiros privados e comunitários e empresas que dão assistência
técnica.
A restauração correta exige uma diversidade que, em alguns
Estados, como São Paulo, se fixa em um mínimo de 80 espécies por hectare. E não
podem ser espécies importadas, mas nativas da Mata Atlântica, recomendando-se
uma quantidade maior de frutíferas para alimentar a fauna, destacou a bióloga.
Alguns latifundiários começaram plantando cinco mil árvores, suficientes para
três hectares, e "gostaram tanto da experiência que a repetiram várias vezes",
acrescentou.
A expansão também levou a outro programa, o Floresta do
Futuro, onde empresas especializadas são contratadas para desenvolvimento de
projetos técnicos, já que possuir terras não implica saber reflorestar,
especialmente em grandes extensões que exigem "investimento e esforço", disse
Pugliese. Seus patrocinadores são grandes empresas ou bancos interessados em
neutralizar suas emissões de gases causadores do efeito estufa, bem como
programas de televisão, bandas de rock ou simplesmente pessoas que organizam sua
festa de casamento, acrescentou.
No México, a ong Pronatura promove,
desde o início de 2007, o programa Neutralízate, que está criando um mercado
voluntário de carbono. Empresas, instituições e indivíduos podem compensar suas
emissões de gases que provocam o efeito estufa comprando bônus para atividades
de redução do desmatamento e restauração de ecossistemas. Os certificados
adquiridos, que podem ser negociados no mercado, representavam em maio, ao ser
inaugurada a iniciativa, a neutralização de 15,5 mil toneladas de dióxido de
carbono e o pagamento de US$ 150 mil anuais a dez comunidades indígenas pobres
do Estado de Oaxaca, contribuindo também para combater a pobreza.
Parte
da quantia provém do pagamento de serviços ambientais impulsionado pela
governamental Comissão Nacional Florestal. A meta é expandir o sistema,
atendendo inclusive interessados do exterior, e alcançar a "auto-suficiência do
mercado", dispensando a ajuda estatal, disse ao Terramérica José Antonio
Ordoñez, diretor-adjunto do Programa de Mudança Climática da Pronatura.
A
prioridade inicial foi para comunidades pobres que conservam "a floresta de
neve", ou mesófilo de montanha, "um ecossistema vulnerável e emblemático" por
sua rica diversidade biológica que precisa de corredores entre fragmentos de
florestas e que é importante para a captação de água, explicou Ordoñez. Esta
renda melhora a vida dessas comunidades, especialmente das mulheres, que são
maioria, e evita mais emigrações para os Estados Unidos, acrescentou. Além
disso, a recuperação florestal afastou outra ameaça. Em 2007, as comunidades
"sacrificaram cinco jaguares que se aproximavam muito das residências porque seu
hábitat estava muito fragmentado" e este ano não houve nenhum caso, concluiu
Ordoñez.
As iniciativas de reflorestamento se multiplicam em muitos
países, de forma participativa ou convencional. No Peru, começou, em julho, o
plantio de 28 milhões de árvores, uma para cada habitante do país, a partir de
Manantay, distrito da amazônica região de Ycayali, no leste. O projeto reúne
esforços de duas organizações não-governamentais espanholas, Iberoquipu e
Sotermun, e diferentes entidades peruanas.
O buscador ecológico Ecoogler,
que usa tecnologia Yahoo, promete doar dinheiro para plantar uma árvore na
Amazônia para cada dez mil buscas através de seu sistema. No dia 26 de agosto,
já havia 2.224 árvores plantadas. Porém, enquanto os grandes projetos de
reflorestamento atingem dimensões de milhares de hectares, apenas o desmatamento
amazônico avança milhões de hectares a cada ano.
* O autor é
correspondente da IPS. Com colaborações de Emilio Godoy (México) e Milagros
Salazar (Peru).