Beto Veríssimo, como é mais conhecido por seus parceiros que estudam e trabalham na e pela Amazônia, é reconhecido como um dos mais importantes especialistas na dinâmica econômica e social da região, além de ser autor de estudos relevantes usados como base para políticas públicas no Pará e em toda a Amazônia. Em entrevista ao jornalista Dal Marcondes durante a Conferência Internacional do Instituto Ethos 2008, em São Paulo, Beto alertou sobre a necessidade de inovar na busca de soluções para a região e destacou a questão fundiária como uma das mais urgentes.
Instituto Ethos: Por que a regularização da posse da terra é importante para a Amazônia?
Adalberto Veríssimo: Mais de 70% da região não tem titulação e isso torna muito difícil responsabilizar autores de crimes ambientais. O modelo cartorial existente hoje no Brasil não vai conseguir resolver este desafio, porque as escalas na Amazônia são imensas. Se utilizarmos as novas tecnologias de internet e de localização por satélite, podemos ter um avanço rápido na identificação de posse e de uso da terra. Para o governo, boa parte da Amazônia é terra de ninguém.
IE: E como isso pode ser feito?
AV: Em um primeiro momento, precisamos fazer uma regularização ambiental e, em seguida, de titulação. Para trabalhar a parte ambiental, os ocupantes de glebas de terras se autodeclaram como detentores da posse. Com isso, passamos a ter pessoas ou empresas que podem ser responsabilizadas pelas ocorrências em suas terras. Depois, é preciso fazer um mutirão para a regularização documental. Aí sim os proprietários têm de entrar em acordos sobre divisas e respeitar regulamentações de posse e de uso da terra na região. Esta questão é fundamental para o desenvolvimento, os Estados Unidos fizeram isso em 1870.
IE: Este é um desafio de tamanho chinês?
AV: Sim, e é preciso que a Amazônia esteja presente no núcleo duro do governo, como prioridade, para que os órgãos públicos se articulem para realizar esta empreitada. A falta de regularização fundiária é a origem de muitos conflitos na região. Esta regularização é condição para que o desenvolvimento local seja minimamente sustentável. Hoje a área regularizada na Amazônia é do tamanho do Estado de São Paulo, e precisa ser multiplicada por quatro.
IE: O novo ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, tem a visão desta urgência?
AV: Acredito que não. No entanto, a Marina deixou o governo em posição delicada. Ficou claro que o governo precisa da Amazônia sob o ponto de vista energético e de recursos naturais, mas não tem caixa nem vontade política para cuidar da Amazônia. O ministro Minc vai ter de colocar a região na pauta econômica e social. Nos próximos anos o desmatamento vai crescer, por pressão econômica, dos preços das comoditties, e o governo tem de ter um plano para enfrentar isto. E não adianta querer fazer na marra, tem de ser um plano que envolva os atores econômicos. Não existe uma solução mágica, a Amazônia não é um cenário de soluções únicas. Enquanto for mais barato desmatar do que usar áreas degradadas, a floresta vai ser arrasada.
(Envolverde/Instituto Ethos)