Os moradores da cubana Ciénaga de Zapata enfrentam o desafio de mudar um futuro anunciado: o desaparecimento deste pântano por causa do aquecimento global.
CIÉNAGA DE ZAPATA, Cuba, 5 de maio (Terramérica) -
Caso se concretizem os piores prognósticos sobre o impacto da mudança climática
em Cuba, uma parte importante da Ciénaga de Zapata, o maior e melhor conservado
pântano do Caribe insular, poderia desaparecer até a segunda metade deste
século. Trata-se de um hábitat de aves só lá encontradas, como a fermina
(Ferminia cerverai), o pardal de Zapata (Torreornis inexpectata) ou a gallinuela
de Santo Tomás (Cyanolimnas cerverai), entre outras. Estima-se que este pântano
abriga 65% da fauna cubana de aves, além de aproximadamente mil espécies de
plantas.
Nesta região predominam as planícies baixas, pantanosas e
semipantanosas, com vegetação de savana, além de florestas, extensos rios e
lagos naturais, bem como 70 quilômetros de cavidades subterrâneas onde se
formaram lagoas semicirculares de água doce chamadas "cenotes". Os moradores da
área do pântano que vivem a menos de 40 metros da costa não parecem dispostos a
renunciar ao prazer de dormir embalados pelas ondas. "As pessoas resistem a
partir, gostam de viver perto do mar", reconhece Luis Lazo, delegado do Poder
Popular em Caletón, um bairro onde a água quase roça os quintais das
casas.
Segundo Lazo, o perigo é latente, porque neste século vários
ciclones tropicais açoitaram este vasto município da província de Matanzas, de
4.250 quilômetros quadrados e menos de dez mil habitantes. O pior foi o furacão
Michele, que passou no dia 4 de novembro de 2001, com ventos de 210 quilômetros
por hora. "Esperava-se que a água penetrasse até nove quilômetros pelo impacto
do Michelle. Não foi assim, mas muitas casas ficaram destruídas e apenas a
evacuação das famílias impediu perdas humanas", lembra Lazo ao
Terramérica.
Alguns especialistas acreditam que a maior intensidade dos
furacões é uma conseqüência da mudança climática. "O oceano está mais quente do
que antes, portanto, é mais propício à formação e intensificação de ciclones
tropicais", afirma Tomás Gutiérrez, diretor-geral do Instituto de Meteorologia
de Cuba. Pablo Bouza, diretor do Parque Nacional Ciénaga de Zapata, alerta que a
conjugação de furacões e seca é propícia a incêndios, como o de 2007, que durou
45 dias e causou danos graves em cerca de cinco mil hectares, 70% deles cobertos
por florestas.
"Os furacões deixam muita vegetação acumulada no solo que,
ao secar por falta de chuva, se converte em combustível para as chamas. O
incêndio avança rapidamente quando o pântano está seco", diz Bouza. São
estudadas estratégias para minimizar o impacto do fogo nas novas circunstâncias.
Ameaçados por um perigo mais ou menos próximo, ambientalistas e técnicos
realizam uma ofensiva para sensibilizar e informar cidadãos e autoridades da
região sobre a mudança climática e suas conseqüências.
"No ano passado
fizemos três encontros com participação comunitária e representantes de
diferentes setores econômicos e sociais. Assim pudemos criar um projeto com os
principais problemas e as possíveis ações a serem desenvolvidas", disse Leyaní
Caballero, especialista em gestão ambiental. Embora a estratégia de adaptação à
mudança climática ainda esteja em elaboração e não tenha se tornado pública,
parte de seu plano de ação já começou a ser aplicado. "As pessoas desconhecem o
quanto são vulneráveis a esse problema e tampouco sabem o que se pode fazer. Por
isso, este ano levamos a questão para discussão nos bairros",
acrescentou.
A projeção do filme "Mudança climática, o desafio continua"
ou palestras de um especialista antecedem as discussões em cada bairro-debate".
A idéia, diz Caballero, é que as pessoas tenham percepção do risco e entendam
que é preciso manejar o pântano de maneira racional e sustentável. "Para isso é
necessário capacitar as pessoas", insiste. Segundo previsões cientificas, o
nível do mar no arquipélago cubano poderia subir de oito a 44 centímetros até
2050 e de 20 a 95 centímetros até 2100. Tais elevações provocariam a redução de
um quinto da área terrestre da Ciénaga de Zapata, situada entre 1,5 e quatro
metros da linha da costa.
A elevação do nível do mar em apenas 30
centímetros também prejudicaria as fontes de abastecimento de água doce, pois a
intrusão salina contaminaria as reservas hídricas dessa área, ao mesmo tempo em
que se perderia ou prejudicaria gravemente a fauna e a flora das partes afetadas
pela invasão marinha. Também a temperatura teria aumentos apreciáveis e poderia
haver intensificação da aridez e da seca, com efeitos notáveis sobre este
ecossistema, declarado Reserva da Biosfera em 2000 e Sítio Ramsar em 2001. Esta
última categoria deve seu nome à cidade iraniana onde, em 1971, foi assinada a
Convenção sobre Pântanos, um tratado intergovernamental para a conservação e o
uso racional dos pântanos.
* A autora é correspondente da
IPS.