Doutora Natureza em perigo


Sua saúde e a dos seus estão entrelaçadas com uma família muito maior que chamamos natureza, afirma um novo livro sobre medicina e ecologia.


CIDADE DO CABO, África do Sul, 28 de abril (Terramérica).- "Quando danificamos a natureza, prejudicamos a nós mesmos", afirma ao Terramérica o médico Aaron Bernstein, da Universidade de Harvard e um dos autores de "Sustaining life: how human health depends on biodiversity" (Sustentar a vida: como a saúde humana depende da biodiversidade), em fase de lançamento. "Poucos se dão conta de que nossa saúde está diretamente ligada à saúde do mundo natural", acrescenta Bernstein. Ele e seu colega Eric Chivian escreveram e editaram contribuições de uma centena de destacados cientistas para criar a publicação, lançada no dia 23 de abril pela Oxford University Press e disponível a partir de maio.

Escrito para todo público, o livro recorre às últimas evidências cientificas para afirmar que o desaparecimento diário de espécies animais e vegetais constitui para a humanidade uma ameaça igual ou maior que a mudança climática. Os remédios, as pesquisas biomédicas, o surgimento e a propagação de doenças infecciosas e a produção de alimentos na terra e nos oceanos dependem da biodiversidade. O livro menciona sete grupos de espécies ameaçadas, entre elas tubarões, ursos, primatas e anfíbios, que possuem "um tremendo valor para a medicina e a ciência".

Entre eles estão caracóis cônicos, da família Conidae, espécies tropicais cujo veneno possui dezenas de milhares de poderosas substâncias chamadas peptídeos - breves cadeias de aminoácidos – usados em pesquisas médicas. "Utilizando peptídeos de caracóis cônicos aprendemos muito sobre como funcionam nossos cérebros", disse Bernstein. Além disso, o primeiro avanço em anos na luta contra a dor procede destes moluscos. Trinta e três por cento dos pacientes com câncer terminal e HIV (vírus da deficiência imunológica humana, causador da aids), com os quais não funcionam nem os opiáceos mais fortes, deixaram de sofrer graças a um peptídeo bloqueador da dor extraído do veneno desses caracóis.

Outros peptídeos são usados em testes clínicos muito promissores, para tratar a diabete, entre várias doenças, acrescenta o médico. Os caracóis cônicos vivem apenas em arrecifes de coral, mas entre um terço e a metade dos arrecifes do mundo corre risco de morte por doenças, contaminação e mudança climática. Os caranguejos-ferradura (Limulus polyphemus) proporcionaram a base para detectar se medicamentos injetáveis estão contaminados. Também são cruciais para compreender a visão humana, afirmou Bernstein. Mas seu hábitat limitado e sua necessidade de praias onde desovar, os tornam vulneráveis à contaminação e às alterações geradas pelos humanos.

Os anfíbios são fonte de novos tratamentos para a pressão arterial alta, e poderiam fornecer substâncias para combater a dor e impedir que as bactérias fiquem resistentes aos antibióticos, o que constitui uma séria preocupação em todo o mundo. Os anfíbios são os organismos mais ameaçados do planeta: quase um terço das seis mil espécies conhecidas estão em risco de extinção e mais de 120 desapareceram nas últimas décadas.

Os medicamentos constituem apenas uma pequena parte do papel que a biodiversidade desempenha no bem-estar humano. Sem os insetos, "a maioria dos ecossistemas terrestres do mundo entrarão em colapso e boa parte da humanidade perecerá com eles", escreve Edward O. Wilson, famoso especialista de Harvard no prefácio do livro. Wilson também observa que quatro milhões de espécies de bactérias podem ser encontradas em uma tonelada de solo fértil e que a maioria de nossas células "não são humanas, mas bacterianas: 700 espécies vivem apenas dentro de nossas bocas".

Os cientistas estimam que há entre três milhões e 30 milhões de espécies de plantas, animais, fungos, bactérias, etc., e apenas 1,4 milhão estão identificadas. Até 30% de todas as espécies do planeta podem desaparecer até 2050 devido a atividades humanas insustentáveis (desmatamento, destruição de hábitat e mudança climática), segundo a Avaliação de Ecossistemas do Milênio 2006, um esforço de pesquisa internacional de quatro anos de duração.

"Pode-se chegar à extinção de metade de todas as espécies até 2050", diz o ecologista Stuart Pimm, da Universidade de Duke, Estados Unidos, que participou da pesquisa. Embora os humanos possam adaptar-se ao aquecimento global, a natureza não pode, quando a mudança é rápida. E é improvável que consigamos substituir os serviços que a natureza nos proporciona. "A maioria das pessoas não está consciente deste perigo", disse Pimm ao Terramérica. As soluções para a mudança climática deveriam preservar e potencializar a biodiversidade, não prejudicá-la.

Como muitas regiões do mundo, entre elas a América Latina, grandes áreas da costa oriental da África do Sul perderam sua vegetação nativa ao cultivarem eucalipto estrangeiro. Embora essas árvores absorvam carbono da atmosfera, ajudando a combater a mudança climática, a perda do ecossistema original tem conseqüências muito mais graves. "É preciso plantar dezenas de milhões de árvores, mas têm de ser espécies nativas para potencializar a biodiversidade", disse Pimm. Desmatar para plantar vegetais destinados a biocombustiveis é outra forma muito ruim de solução da mudança climática; é preciso pagar aos países para que parem o desmatamento, disse. "Quando informadas sobre a crise, as pessoas se mostram ansiosas para agir, mas não sabem o que fazer", acrescentou.

O livro tem um capítulo sobre ações, incluindo uma lista de dez pontos principais. Os três primeiros são usar transporte público ou bicicleta ou ir trabalhar caminhando, uma vez por semana; comprar alimentos orgânicos locais ou cultivá-los; evitar comer camarões ou salmões de criadouros. Muitas recomendações buscam evitar as emissões de carbono, mas, mesmo cultivar espécies nativas nos jardins e reduzir o uso de água, são passos importantes para preservar a biodiversidade, diz Bernstein. Claro, "também precisamos de políticas governamentais para proteger os sistemas naturais; muitos fazem exatamente o contrário", acrescenta. "Finalmente, necessitamos de uma nova cultura que valorize, conserve e proteja a biodiversidade. Essa cultura já existe quando se trata de nossa saúde. Agora, cabe a nós compreendermos que essa saúde depende da saúde do mundo natural", concluiu. (Terramérica/Envolverde)

* O autor é correspondente da IPS.

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