O conceito de sustentabilidade transformou-se num elemento chave no movimento global, crucial para encontrar soluções viáveis para resolver os maiores problemas do mundo. O que significa isto? Lester Brown, fundador do Worldwatch Institute, elaborou uma definição clara: "Uma sociedade sustentável é aquela que satisfaz as suas necessidades sem diminuir as possibilidades das gerações futuras de satisfazer as delas".
Como seria, verdadeiramente,
uma sociedade sustentável? Ainda não há modelos detalhados, mas na última década
surgiram critérios básicos que nos permitem desenhar a forma emergente das
sociedades sustentáveis.
A sustentabilidade global requer uma drástica
diminuição do crescimento mundial. As sociedades sustentáveis terão populações
estáveis, como as que têm hoje em dia 13 países europeus e o Japão. A população
mundial deverá se estabilizar no máximo em oito bilhões de pessoas. As economias
sustentáveis não serão movidas por combustíveis fósseis, mas sim por energia
solar e suas muitas formas diretas e indiretas: luz solar para aquecimento e
eletricidade fotovoltaica, energia eólica, hídrica e assim por diante. A energia
nuclear deixará de ser usada devido a sua longa lista de desvantagens e riscos
econômicos, sociais e ambientais. Os painéis solares aquecerão a maior parte da
água doméstica ao redor do mundo, e a maior parte da calefação será feita pela
entrada direta dos raios solares.
Com as células fotovoltaicas, os lares,
em todas as partes do mundo, serão tanto produtores quanto consumidores de
eletricidade. A produção de energia será muito mais descentralizada e, por isso
mesmo, menos vulnerável aos cortes ou apagões.
Um sistema energético
sustentável será também muito mais eficiente. A economia de combustível dos
automóveis será duas vezes maior. Por sua vez, a eficiência dos sistemas de
iluminação será três vezes melhor, e as necessidades de aquecimento diminuirão
em 75 por cento. Tudo isto hoje em dia é possível graças às tecnologias já
existentes.
O transporte numa sociedade sustentável será muito menos
esbanjador e poluente do que hoje. As pessoas morarão muito mais perto dos seus
lugares de trabalho e se movimentarão nas vizinhanças por sistemas altamente
desenvolvidos de ônibus e transportes sobre trilhos. Haverá menos automóveis
particulares. As bicicletas serão um veículo importante no sistema de transporte
sustentável. Hoje em dia, já há no mundo duas vezes mais bicicletas do que
automóveis. Nas indústrias sustentáveis, a reciclagem será a principal fonte de
matéria prima. O design de produtos se concentrará na durabilidade e no uso
reiterado, em vez da vida curta e descartável dos produtos. O desejável será uma
mentalidade baseada na ética da reciclagem. As empresas de reciclagem ocuparão o
lugar das atuais companhias de limpeza urbana e disposição final do lixo,
reduzindo a quantidade de resíduos em pelo menos em dois terços.
Uma
sociedade sustentável necessitará de uma base biológica restaurada e
estabilizada. O uso da terra seguirá os princípios básicos da estabilidade
biológica: a retenção de nutrientes, o equilíbrio de carbono, a proteção do
solo, a conservação da água e a preservação da diversidade de espécies. É
provável que as áreas rurais tenham maior diversidade do que atualmente com o
manejo equilibrado da terra, em que haverá rotatividade de plantações e de
cultivo de espécies. As empresas que produzirem alimentos e energia serão mais
populares.
Não haverá desperdício de colheitas. Os bosques tropicais
serão conservados. Não haverá desmatamento para obtenção de madeira e outros
produtos. Pelo contrário, milhões de hectares de novas árvores serão plantados.
Os esforços para deter a desertificação transformarão as áreas degradadas em
terrenos produtivos. O uso exaustivo de pastagens será eliminado, assim como
haverá modificação na cadeia alimentar das sociedades afluentes, para incluir
menos carne e mais grãos e vegetais.
Novas indústrias sustentáveis
estarão mais descentralizadas, fomentando uma maior independência nas grandes
cidades. Os sistemas de valores que enfatizam a quantidade, a expansão, a
competição e a dominação darão lugar à qualidade, à conservação, à cooperação e
à solidariedade. À medida que a acumulação de riqueza material perder sua
importância, a distância entre ricos e pobres diminuirá, eliminando muitas
tensões sociais.
A característica decisiva de uma economia sustentável
será a rejeição da cega busca de crescimento. O produto interno bruto será
reconhecido como um indicador falido. No lugar do PIB, as mudanças econômicas e
sociais, tanto quanto as tecnológicas, serão medidas por sua contribuição à
sustentabilidade. Em um mundo sustentável, os orçamentos militares serão uma
pequena fração do que são hoje. Em vez de manter caras e poluidoras instituições
de defesa, os governos poderão investir em uma fortalecida Organização das
Nações Unidas para a manutenção da paz.
As nações descentralizarão o
poder e a tomada de decisões dentro de suas próprias fronteiras. Ao mesmo tempo,
estabelecerão um grau de cooperação e coordenação sem precedentes em nível
internacional para solucionar problemas globais. As diferenças ideológicas se
dissiparão frente à crescente consciência de que a Terra é o nosso lugar comum,
não importando os nossos diferentes antecedentes culturais. A compreensão de que
todos nós compartilhamos esta Terra será a fonte de um novo código
ético.
A imagem de uma futura Terra sustentável tem sido pintada com
grandes pincéis. O desafio das próximas décadas é aperfeiçoar os detalhes, por
meio do trabalho das corporações, dos governos, das organizações ambientais, dos
partidos políticos e dos cidadãos. Nós acreditamos que o ideal da
sustentabilidade é uma preciosa meta, estimulante para os seres humanos,
cansados de uma época esbanjadora e destrutiva.
* Fritjof Capra é
físico e teórico de sistemas. Ernest Callenbach é
ambientalista.
(Envolverde/Instituto Ethos)