Agir em parceria com comunidades locais e outros setores é uma das soluções.
De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas), a Amazônia tem cerca de 6,9 milhões de quilômetros quadrados, 3,8 milhões deles no Brasil. Seu território compreende 775 municípios, onde viviam, em 2000, 20,3 milhões de pessoas. Controlar uma área tão grande como esta, evitando que seja degradada pela ação de negócios pouco sustentáveis, é uma tarefa complexa. Mas nem toda empresa atuando na região contribui para sua devastação. Pelo contrário, há corporações que apostam no desenvolvimento sustentável da Amazônia.
Em continuidade à reportagem da semana passada,
na qual especialistas e executivos opinaram sobre a agenda positiva do setor
privado pra a região mais cobiçada do Planeta, Idéia Socioambiental entrevistou
quatro grandes empresas que estão explorando a Amazônia com respeito à sua
biodiversidade e à qualidade de vida de sua população. E hoje constituem quatro
bons estudos de caso de desenvolvimento sustentável.
A saboaria da Natura
Entre 2000 e 2001, a Natura Cosméticos decidiu que toda a
matéria-prima de seus produtos seria comprada não de grandes fornecedores ou de
empresas, mas de pequenas comunidades extrativistas. "É uma forma de gerar
riqueza para toda a cadeia. Isso ajuda a fixar o pequeno agricultor na
propriedade e contribui para a melhoria da qualidade de vida. Não resolve o
problema, mas é um modelo mais razoável", afirma Rodolfo Gutilla, diretor de
Assuntos Corporativos.
Não foi diferente na nova fábrica em Benevides
(PA), que centraliza a produção da massa de sabonetes e extração de óleos
vegetais. A empresa estabeleceu relações com a população local de forma a
capacitar as pessoas para explorar ativos localizados na floresta. "A Amazônia é
um patrimônio do brasileiro, por isso deve ser conhecida e compartilhada de
forma responsável. No nosso caso, o papel é garantir que os produtos sejam
extraídos de maneira sustentável."
Antes da saboaria no Pará, a Natura
sempre atuara em São Paulo. No novo território, o ecossistema é muito mais
sensível e o impacto da instalação da fábrica, maior. Por isso, Gutilla observa
que as soluções efetivas em responsabilidade socioambiental em São Paulo não
necessariamente funcionam no Pará. Lamenta, porém, que a ação das empresas na
Amazônia ainda aconteça em pequena escala, sem a mobilização e o interesse que a
região merece. "Infelizmente, pouco foi feito. Marina Silva, ministra do Meio
Ambiente, é uma pessoa preparada e boa, mas as pressões da máquina
administrativa são muito grandes, e os resultados ainda tímidos", diz.
A nova Mina de Juruti da Alcoa
Extrair bauxita tornou-se,
para a mineradora Alcoa, um processo muito mais complexo do que poderia ser.
Quando se instalaram na década de 1960 no Brasil, terceira maior reserva mundial
do minério, a responsabilidade da empresa se esgotava na extração. "Você podia
retirar o minério e ir embora. Mas a Alcoa trouxe técnicos do exterior e de
diversos pontos do País para desenvolver uma tecnologia de revegetação das áreas
mineradas", conta Demércio Nogueira, diretor de Assuntos
Institucionais.
Apesar de hoje a empresa estar envolvida com diversas
ações de responsabilidade socioambiental na Amazônia, a menina dos olhos da
Alcoa é a nova Mina de Juruti, no município de Juruti (PA). A organização
planeja iniciar a extração entre julho e agosto deste ano, mas já prepara a mina
desde 2006. São 30 milhões de reais destinados ao plano de controle ambiental e
mais 50 milhões de investimento na comunidade. "Não podemos ser uma empresa de
sucesso em uma sociedade que não está bem. Temos que ajudar a desenvolver sem
criar relação de paternalismo e dependência. Pode levar 10 ou 200 anos, mas um
dia a empresa não vai estar mais lá e na região vai ficar o produto positivo da
nossa presença de hoje", avalia.
Além de reflorestar a área minerada, a
empresa ensina à população o manejo florestal e como utilizar de forma
sustentável os recursos naturais para aumentar a renda familiar. O orçamento
também cobre melhorias no sistema educacional, cultural, ambiental, de saúde,
segurança pública, assistência social e infra-estrutura. "É fundamental que as
empresas tenham tato numa Amazônia que se pretende sustentável. Não tem como
deixar de ajudar as comunidades a gerarem renda para não depender de doações e
filantropia", afirma Nogueira.
A Alcoa mantém também iniciativas de
preservação, como o Programa de Apoio à Conservação da Biodiversidade da Região
Tapajós-Madeira, em que atua, em parcerias, na disposição de recursos e
capacitação da população para que criem seus próprios projetos de gestão
ambiental. Na mesma linha de preservação e parceria, a empresa contribuiu para a
formação do Parque Nacional da Amazônia, em Itabuna (PA), com o objetivo de
desenvolver o ecoturismo e trazer desenvolvimento para a região.
O mais
novo empreendimento da Alcoa é financiar a exposição Amazônia Brasil, organizada
pelo Projeto Saúde e Alegria e pelo Grupo de Trabalho Amazônico, que deve levar,
de 17 de abril a 13 de julho, uma extensa programação cultural a Nova York,
visando divulgar informações sobre a região amazônica e reverter os lucros para
entidades locais. "É um trabalho de sensibilização da opinião pública para a
importância da Amazônia e seu papel na questão climática", defende Nogueira.
Financiamento responsável do Bradesco
Em 2008, o banco
Bradesco lançou um novo posicionamento a partir do mote "Banco do Planeta". A
campanha, do final do ano passado, tem dois objetivos: apresentar à sociedade o
seu conjunto de ações de responsabilidade socioambiental sob o mesmo
guarda-chuva – antes estavam pulverizadas – e investir na divulgação dessas
iniciativas. Mas por que, afinal, banco do planeta? Segundo Jean Phillipe Leroy,
diretor do departamento de Relação com o Mercado, o fato de as Nações Unidas
terem decretado 2008 o ano do planeta foi uma deixa para o banco levantar a
bandeira da sustentabilidade publicamente, conceito já presente na instituição
há muitos anos – conforme explica.
Tendo esse conceito em mente, a
Amazônia apresentou-se logo como o melhor lugar para se investir. O Bradesco
criou, junto ao governo do estado do Amazonas, a Fundação Amazonas Sustentável,
uma área preservada de 17 milhões de hectares, com o orçamento inicial (apenas
do banco) de 20 milhões de reais, além de mais 10 milhões por ano, durante cinco
anos, totalizando 70 milhões. A instituição pretende arrecadar o dinheiro com
produtos próprios, a exemplo de cartões de crédito, que podem levar o nome da
fundação.
O reflorestamento e a preservação da Vale
"Pensamos
na questão ambiental desde o primeiro momento, quando fazemos a pesquisa geral,
até o final da exploração, quando recuperamos as áreas", conta Walter Cover,
diretor de Gestão Ambiental e Territorial da Vale. Da área de 1,2 milhões de
hectares no Pará, onde a Vale atua, apenas 2% é utilizado para a mineração e,
ainda assim, reconstituído em seguida. O restante é composto de reservas
biológicas, florestas nacionais e terras indígenas que a empresa ajuda a
preservar. "Temos planos ousados de investimento naquela região. Só no período
de 2008 a 2009, queremos investir 20 bilhões de dólares."
Não são apenas
os territórios da Vale que devem ser reflorestados. Pelo programa Vale
Florestar, eles recuperam matas nativas em lugares devastados, ajudando o
ecossistema a se equilibrar. O plano é plantar o equivalente a 160 milhões de
toneladas de carbono nos próximos 20 anos.
Outras ações também fazem
parte do pacote de responsabilidade socioambiental da Vale, como um sistema de
monitoramento de incêndios. As iniciativas são estabelecidas em parceria, como a
recente decisão da empresa de juntar-se ao Estado e não fornecer matéria-prima a
quem não possa provar o cumprimento da legislação trabalhista e ambiental na
Amazônia. "Estamos longe de chegar a uma situação irreversível. Tanto o governo
quanto a Vale e outras empresas têm consciência de que essas ações estão na
linha certa para poder evitar que esse estágio seja atingindo", observa
Cover.
A certificação da madeira do FSC
Se o maior entrave
para o desenvolvimento da Amazônia é o desmatamento, uma das soluções – já
apontada pelo governo federal e utilizada por empresas – é a certificação de
manejo florestal responsável do FSC (Forest Stewarship Council). Um dos selos de
origem com mais referências no mundo, o FSC traz o recado, até o comprador, de
que a matéria-prima do produto veio de uma área gerida de acordo com os dez
princípios da entidade. Por isso, atua como uma ferramenta de mercado.
"O
impacto das madeireiras é muito alto na Amazônia, pois cada madeira tem um valor
diferente. Então, por exemplo, para chegar em um Ipê, elas destroem toda a
floresta ao redor da árvore. A única maneira de não ter impacto na floresta é
não cortar, fazer uma reserva integral. O conselho se baseia, porém, no manejo
florestal de baixo impacto", afirma Ana Young, secretária executiva do FSC
Brasil.
As maiores áreas certificadas no País estão na Amazônia: 1,5
milhão de hectares da Comunidade Kayapó na Terra Indígena do Baú, no Mato
Grosso; 545 mil da Orsa Florestal, no Pará; e 427 mil da Jari Celulose, no mesmo
estado (as duas últimas são empresas do Grupo Orsa).
O maior desafio hoje
para a atuação do conselho na Amazônia é a questão fundiária: para obter o selo
do FSC é necessário provar a permissão para o uso da terra, que a maioria não
tem. Ainda assim, Ana se mantém otimista, e diz esperar um crescimento da
certificação na região.
Confira os 10 princípios do FSC, os quais todas
as empresas devem cumprir para obter o selo:
1. Obediência às Leis e aos
Princípios do FSC
2. Responsabilidades e direitos de posse e uso da
terra
3. Respeito aos direitos dos Povos Indígenas
4. Obedecer às
relações comunitárias e direitos dos trabalhadores
5. Benefícios da
floresta (uso eficiente dos recursos para assegurar viabilidade econômica e
sustentabilidade das comunidades e meio ambiente)
6. Impacto ambiental
mínimo, sem alterar funções ecológicas e integridade florestal
7.
Realizar um plano de manejo
8. Monitoramento e avaliação das condições da
floresta, rendimento dos produtos e impactos do manejo nas comunidades e
natureza.
9. Manutenção de florestas de alto valor de
conservação
10. Plantações (reflorestamento)
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(Envolverde/Idéia
Socioambiental)