É o acúmulo de calor, gerado pela temperatura de nosso próprio corpo e pelo abafamento das cidades, que marca dia e hora para chover
PREVISÃO À tarde o calor gera nuvens carregadas
Temporais são comuns no período da tarde. O dia pode estar lindo, céu limpo e azul, não importa. De repente, cai aquela tempestade, algumas vezes até acompanhada pelo batuque do granizo sobre árvores, tetos, carros e asfalto de diversas cidades brasileiras. É de dezembro a março, durante o verão, portanto, que despencam fortíssimas mas breves chuvas. Segundo o engenheiro Aílton Alves Filho, da Faculdade de Engenharia Industrial (FEI), e a pesquisadora Helena Ribeiro, da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), autores de um original estudo sobre tal fenômeno, é a concentração de calor e poluentes que favorece a formação dessas intensas "pancadas de água" – assim na terra como no céu. Nesse ponto está a grande revelação: há dia e hora marcados para as tempestades desabarem em metrópoles como, por exemplo, São Paulo e Recife. As chuvas se concentram geralmente no início da semana, entre segunda e terça-feira, e chove muito forte nos finais de tarde. Motivo: nesse mar de concreto e asfalto em que vivem milhões de pessoas, a temperatura aumenta progressivamente à medida que o dia avança e pessoas e automóveis invadem as ruas – por isso chove menos nos finais de semana. "A temperatura atinge um pico no início da tarde, levando as nuvens a ficarem carregadas", diz Alves Filho. "Depois de algumas horas, no meio da tarde, essas nuvens despejam toda a água sobre metrópoles. É um fenômeno intrigante, começamos a observá-lo na década de 80 e fomos até o início de 1990. Notamos que, das 17 tempestades desse período, 35% ocorreram na segunda-feira, 20% na terça e 20% na quarta-feira", diz Helena. O estudo aponta que naquele período não houve temporais nos finais de semana. Ao comparar dados de radares meteorológicos, índices pluviométricos e níveis de poluição, os cientistas concluíram que só é possível explicar o que se passa em grandes cidades se levarmos em consideração a influência de seus habitantes – a começar pela temperatura do próprio corpo humano.
Estudo comprova que 35% das tempestades desabam na segunda-feira à tarde
São Paulo é um bom exemplo que vale para outras cidades em que haja
grandes pontos de aglomeração. Um dos principais e mais populares
corredores comerciais paulistanos é a rua 25 de Março, com prestígio em
outros Estados brasileiros e países vizinhos devido ao baixo preço das
mercadorias. Pois bem, quem for à 25 de Março fazer compras à tarde, é
bom levar guarda- chuva. Cerca de 400 mil pessoas a pisam nesse
período, aumentando em 2 graus a temperatura da região – e temperatura
mais elevada faz chover. Como torós são democráticos, também ao redor
de grandes shoppings ocorre situação idêntica. Além disso, novamente
tendo São Paulo como exemplo, no último século o seu crescimento se
multiplicou 40 vezes e, num processo de ocupação urbana não planejada,
a cidade avançou sobre a vegetação natural. Essa substituição do verde
por asfalto e concreto criou áreas de estufa que ao longo do dia
armazenam o calor do Sol. "A cidade não cria as tempestades, mas as
favorece", diz o geógrafo Tarik Azevedo, da USP.