Madri, 19/11/2007 – Os 600 especialistas convocados pela Organização das Nações Unidas na cidade espanhola de Valencia aprovaram por consenso o informe sobre a mudança climática, no qual se destaca que o aquecimento global é provocado pelas ações humanas e se manterá durante séculos. Todos os participantes, incluindo representantes de organizações não-governamentais, coincidiram em qualificar de positivo o informe surgido da reunião plenária do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre a Mudança Climática (IPCC).
O secretário-geral da Organização das Nações Unidas,
Ban Ki-moon, disse no encerramento do encontro, no sábado, que agora cabe aos
governos transformar as propostas dos especialistas "em ações concretas, porque
reduzir e inverter estas ameaças é o desafio que define nossa época". Em termos
semelhantes se pronunciou Hans Verolme, do grupo ecologista internacional World
Wildlife fund/(adena), para quem o Informe aprovado é positivo e agora "se trata
de os políticos o colocarem em prática".
O primeiro parágrafo do Informe
é contundente: "O aquecimento do clima é inequívoco e já é evidente pelo aumento
da temperatura média global do ar e dos oceanos, pela ampla fusão do gelo e da
neve e pelo aumento global do nível do mar". Sobre este ponto, Verolme disse que
"quanto mais decisiva é a afirmação dos cientistas menos desculpas têm os
políticos para atrasar ou evitar a adoção de ações concretas". Um dos aspectos
destacados desta reunião é que a unipotência, os Estados Unidos, que ainda não
assinaram o Protocolo de Kyoto, aceitou o texto que diz que a mudança climática
é provocada pela ação humana e que suas conseqüências podem ser
irreversíveis.
O informe aprovado nesta reunião de Valencia, no
Mediterrâneo, será a base do encontro do próximo mês em Bali de ministros de
Meio Ambiente dos países-membros da ONU, convocados para estabelecer um programa
de ação contra o aquecimento climático, continuação do Protocolo de Kyoto. Este
texto não só estabelece que a mudança climática é "antropogênica", ou seja, de
origem humana, como também afirma que "suas conseqüências podem ser repentinas e
irreversíveis" e que foi verificada "nos últimos 50 anos em todos os
continentes, menos na Antártida".
Outro ponto inicialmente rejeitado mas
por fim aceito pela delegação norte-americana é que o impacto da mudança
climática afeta agora e no futuro todos os países e não apenas as nações em
desenvolvimento. Isto, se por fim Washington assinar o Protocolo de Kyoto,
obrigará esse país a tomar medidas para reduzir as emissões de gases
contaminantes desde seu território. Os especialistas fizeram constar do informe
que os últimos 11 anos "estão entre os 12 mais quentes registrados na superfície
terrestre (desde 1850)" e que esse aumento é superior no hemisfério norte,
especialmente no Ártico, "aquecido a uma velocidade que é o dobro da registrada
no restante do planeta".
Os cientistas acrescentam que a temperatura
mundial provavelmente aumentará entre 1,1 e 6,4 graus até 2010, em relação ao
período 1980-9990, mas sendo muito provável que esse aumento ficará entre 1,8 e
4,0 graus. Isso implicaria um nível mais elevado da superfície oceânica, com
mais chuvas bem como ciclones tropicais, tufões e furacões mais fortes. Para
evitar ou diminuir esses efeitos, os especialistas recomendam a adoção de
medidas em todos os países para reduzir, até 2050, em 50% as emissões de gases
causadores do efeito estufa, especialmente o dióxido de carbono
(CO²).
Isso porque – destaca o informe – "as emissões de gases causadores
do efeito estufa aumentaram 70% entre 1970 e 2004", e por isso "a concentração
atmosférica de CO² em 2005 excedeu em muito a registrada nos últimos 650 mil
anos". Tudo isso levou, leva e levará, ao aumento do nível domar. Isto,
ressaltaram, é inevitável e "a expansão térmica continuará por muitos séculos
depois de estabilizada a concentração de gases que levam ao efeito estufa, para
qualquer nível de estabilização, causando uma elevação muito maior do que a
projetada para o século XXI (entre 18 e 59 centímetros)".
Entretanto,
alertam que um eventual degelo da Groenlândia "poderia ser de vários metros e
maior do que a expansão térmica se o clima se mantiver durante vários séculos
entre 1,9 e 4,6 graus acima dos níveis pré-industriais". Teresa Ribera e Arturo
Gonzalo Aizpiri, que lideraram a delegação espanhola na reunião, destacaram que
o documento aprovado terá um papel-chave nas negociações intergovernamentais
para a renovação do Protocolo de Kyoto, que vencerá em 2012 e cujas deliberações
começarão no mês que vem em Bali e terminarão em 2009.
O secretário
confederativo de Meio Ambiente da espanhola central sindical Comissões
Operarias, Joaquín Nieto, aderiu em Valencia às reclamações para combater a
mudança climática. Essa luta, disse, não representará uma perda de empregos mas
a criação de mais fontes de trabalho, apelando para energias renováveis, como a
eólica e a solar. Nieto citou o chamado Informe Stern, encomendado pelo governo
britânico em 2006 a Nicholas Stern e que mostra que enquanto a mudança climática
pode reduzir em 20% o produto interno bruto do planeta, o combate a ela não
superaria um investimento de 1%, por isso os "benefícios seriam indiscutíveis",
concluiu.
Em sua intervenção, Ban Ki-moon também disse que em sua visita
à Antártida, Amazônia e ao Chile, nas últimas semanas, comprovou o degelo e o
desmatamento com cenas que qualificou de "tão aterradoras como as de um filme de
ficção científica, e mais, por serem reais". A respeito do informe Ban destacou
que envia uma mensagem de grande importância para todos: "que há meios reais e
acessíveis para enfrentar a mudança climática e que com uma ação concertada, e
sustentada desde já, ainda se poderá evitar algumas das previsões mais
catastróficas apontadas pelas previsões científicas. Os países industrializados
têm de seguir em frente na luta contra a mudança climática. Mas, ao mesmo tempo,
não podemos deixar de lado a realidade que de que não pode haver soluções
possíveis se os países em desenvolvimento não participarem desse esforço",
finalizou o secretário-geral da ONU.
O Protocolo de Kyoto obriga apenas o
Norte a reduzir suas emissões de gases causadores do efeito estufa em 5,2% até
2012, em relação ao nível de 1990. isso acontecerá previsivelmente, mas, mesmo
assim as emissões em todo o mundo, especialmente pelo desenvolvimento de países
como China, Índia e Brasil, continuarão crescendo. Para a redução de emissões
pedida pelos cientistas do IPCC será necessário o compromisso destes gigantes.
(IPS/Envolverde)
(Envolverde/ IPS)