Elementos fundamentais para a compreensão das variações climáticas globais, oceanos ainda são muito pouco estudados, segundo Edmo Campos, do Instituto Oceanográfico da USP.
Agência FAPESP – Um dos
componentes mais importantes para tentar entender as mudanças climáticas ainda
ganha pouca atenção no debate científico internacional: os oceanos. O alerta foi
feito por Edmo Campos, professor do Instituto Oceanográfico da Universidade de
São Paulo (USP), que abriu nessa segunda-feira (5) a 3ª Conferência Regional
sobre Mudanças Globais: América do Sul.
De acordo com o pesquisador, as
variações climáticas em curso afetam diversos processos químicos, físicos e
biológicos dos oceanos, que, por sua vez, terão impactos ainda pouco estudados
sobre o clima. "Os oceanos recebem a maior parte da radiação solar que atinge a
Terra. O planeta ganha calor nos trópicos e perde nas altas latitudes. A
distribuição desse calor cabe fundamentalmente aos oceanos, especialmente nos
trópicos", disse à Agência FAPESP.
Campos explicou que, ao aquecer a
atmosfera, o oceano gera diferentes gradientes de temperatura, criando um
movimento que produz ventos, redistribuindo calor e interferindo em correntes
oceânicas, alterando a temperatura em todo o planeta.
"É um sistema
intrincado de correntes, que interage com as mudanças climáticas e afeta toda a
dinâmica global. Para fazer previsões sobre como isso vai acontecer é preciso
fazer muita observação. E observar o oceano não é algo simples ou barato",
disse.
A inércia térmica dos oceanos é muito grande, ou seja, demora
tanto para esquentar como para esfriar. Isso diminui a precisão dos modelos
climáticos, criando dificuldades para os cientistas. "Em qualquer modelo
climático é preciso conhecer as condições iniciais para poder fazer previsões. O
grande problema é conhecer o estado inicial dos processos oceânicos",
afirmou.
Segundo Campos, há cerca de 200 anos os mares procuram se
acomodar às mudanças causadas pelo homem. "A molécula de água é muito
polarizada, por isso a inércia térmica do mar é mil vezes maior que a da
atmosfera. Se o sistema é aquecido por muito tempo, é preciso um tempo igual
para resfriá-lo depois."
O professor afirmou que o aquecimento global
pode afetar o processo de absorção do carbono, alterando todo o balanço
climático. "O oceano está perdendo lentamente a capacidade de absorção de CO2, o
que pode, a longo prazo, aumentar o efeito estufa", disse.
Por outro
lado, à medida que absorve carbono, o oceano fica mais ácido. "Os estudos mais
recentes mostraram que desde a revolução industrial houve uma diminuição de 0,1%
no pH oceânico, que historicamente se mantém em torno de 8,16. Se o pH descer
abaixo de 7, o oceano perderá a capacidade de absorver o
carbono."
Resfriamento global
Segundo Edmo Campos, o clima
global é especialmente sensível a variações no oceano Pacífico, que tem uma
característica especial, descoberta há apenas dez anos e que pode trazer
surpresas para o clima global: a Oscilação Dacadal do Pacífico (PDO, na sigla em
inglês).
"Essa oscilação é caracterizada por fases frias e quentes
alternadas a cada 20 ou 30 anos. Estamos no fim de uma fase quente e
recentemente vários pesquisadores têm apontado para uma possível redução da
temperatura média do planeta em função da fase fria que se aproxima",
explicou.
O possível "resfriamento global" causado pelo Pacífico, no
entanto, preocupa o pesquisador. "O fato de ter uma fase fria acontecendo, com
redução da temperatura, não significa que a mudança climática será interrompida.
Ela pode ser maquiada", disse.
Segundo Campos, o clima não varia de forma
contínua e, mesmo com um resfriamento temporário, as mudanças climáticas não
podem ser desprezadas. "Talvez a fase fria seja mais quente do que a última. E a
próxima fase quente poderá ser mais quente do que a anterior."
A mudança
de salinidade também altera os padrões climáticos, ao criar correntes profundas
resultantes da diferenças de densidade da água: as correntes termohalinas. "São
movimentos de água produzidos quando a densidade se altera por variações de
temperatura ou salinidade em alguma região oceânica superficial",
explicou.
Uma das conseqüências da interferência no padrão de circulação
termohalina é um eventual aumento do nível do mar. "Há uma maior elevação na
superfície da água, onde há uma anomalia positiva de sal. A diferença entre
elevação da superficie em diferentes localidades produz gradientes de pressão
anômalos que vão gerar correntes anômalas. Tudo isso ainda precisa ser
estudado", disse Campos.
O professor conta que o Instituto Oceanográfico
da USP montou uma comissão para viabilizar a aquisição de um novo navio de
pesquisa. Segundo ele, o navio Professor Besnard está obsoleto. "A USP tem o
único navio brasileiro integralmente dedicado à pesquisa. Mas ele cumpriu seu
papel e hoje precisa de muitos recursos para se manter operacional. Necessitamos
de um novo navio. A USP tem toda a estrutura, experiência de manutenção e
recursos para a tripulação", afirmou.
Crédito de imagem: Aivazovsky