Derramamento de óleo da empresa Rosneft, na região de Pyt-Yakh, Sibéria. Foto: Denis Sinyakov
A maior empresa petrolífera estatal do mundo, a russa Rosneft – mesma que tem planos para explorar o Ártico – chegou na região oeste da Sibéria há menos de 50 anos e já se considera dona inquestionável do território. Os habitantes nativos da taiga (a floresta boreal russa) compõem três tribos que vivem na região há séculos: os Khanty, os Mansi e os Nenets. Entretanto, esses povos agora estão sendo forçados a abandonar suas terras, que sofrem com mais de 2,7 mil vazamentos de óleo por ano.
Moradores da região de Ustje-Vatjogan, próximo ao rio Agan, tentam sobreviver com os restos da floresta, agora cercada por zonas industriais, cortada por óleodutos e inundada por diversos vazamentos que formam verdadeiros pântanos de óleo. Fica impossível, portanto, viver segundo a cultura dos povos da região, que vivem conectados com a natureza e o que ela lhes provém: pesca, caça, frutas e peles.
A indústria petrolífera começou a explorar a região nos anos sessenta sob o slogan “Oil at any price” – “Óleo a qualquer preço”, em tradução livre. Bastaram apenas cinquenta anos para que a natureza da região fosse quase totalmente devastada, o que alterou a vida local rápida e irreversivelmente. Quase não se vê mais a verdadeira taiga, mesmo num raio de centenas de quilômetros. No lugar, máquinas de perfuração e dutos compõem a paisagem.
Nunca houve sinais de esforço por parte dessas empresas para limpar a região, e agora o óleo contaminou o leito do rio, tornando a água imprópria para consumo. A vida natural praticamente acabou, e as queimadas se alastram de forma rápida por causa do óleo. Os povos da região recuam cada vez mais para dentro da floresta tentado fugir desse cenário, embora sem sucesso.
“A nossa vida é muito frágil, um cigarro aceso pode significar o nosso fim”, explica Vasily Tylchin, criadora de renas. Suas renas necessitam do líquen da região, facilmente inflamável e com recuperação muito lenta. “Os pastos queimados há mais de 25 anos ainda não se recuperaram”.
“Agora mantemos apenas 30 renas: a comida é escassa e todo ano muitos animais morrem bebendo água contaminada. Já não conseguimos sustentar nossas famílias com o tradicional artesanato. Muitos jovens partiram para a cidade e alguns até começaram a trabalhar para a indústria de óleo – não existe opção aqui”.
A indústria russa de petróleo derrama cerca de 30 milhões de barris todo ano, contabilizando mais de 20 mil acidentes, sendo metade da Rosneft. Isso faz da empresa a líder global de vazamento, deixando para trás gigantes como a Shell, BP, ConocoPhillips e Chevron. Para se ter uma ideia, 97% das rupturas dos dutos são causadas pela corrosão, dado que a maioria desses canos foram instalados há mais de 30 anos.
Zhenya Belyakova, da Campanha Salve o Ártico, e sua equipe do Greenpeace Rússia visitaram a área para averiguar a situação e tirar fotos da região. Ela conta: “Nós andamos durante vários dias por infinitos derramamentos de óleo. Vimos dutos no chão e em canais, enferrujando e contaminando o ambiente.
Vimos buracos deixados após obras de reparação, cheio de lodo de petróleo. Milhares de hectares de florestas estão morrendo lentamente de contaminação e incêndios tóxicos, bacias hidrográficas brilham por causa da mancha de óleo. Os moradores dizem que viram aves e alces mortos no meio de um pântano, cobertos de óleo.”
“Mesmo se um supervisor denunciar algum vazamento de óleo, isso não significa que a região será limpa. A empresa simplesmente enterra o óleo e o cobre com areia. Depois de muitos anos praticando isso, a maioria da vegetação natural morreu. E muitas gerações vão passar antes que a natureza se recupere.” Um vídeo feito pela equipe, que ilustra melhor a situação, pode ser visto aqui, com legendas em inglês.
Esse desastre ambiental é rotina para a gigante do óleo que agora visa explorar a região ártica. Ao invés de substituir seus dutos enferrujados e propícios para vazamento, a Rosneft planeja investir bilhões de dólares na exploração do Ártico, que conta com o forte incentivo governamental russo. Prova disso foi a área de mais de 1 milhão de km² na região do Ártico cedida à empresa pelo governo da Rússia.
Viver nos moldes tradicionais, como reza a cultura dos moradores da região do oeste da Sibéria, está cada vez mais difícil. Entretando, muitos ainda escolhem por ficar na floresta: “Eu nasci aqui. Toda a minha família, da criança até a avó de 103 anos, trabalha com a criação de renas.” Diz Vasily. “Minha filha não quer sair, Nós sonhamos que um dia vamos ser deixados em paz, para viver nosso tradicional estilo de vida e manter a nossa terra e cultura”.
O Greenpeace lançou uma campanha pela proteção do Ártico com uma petição que pede a criação de um santuário internacional no polo norte. Assine e divulgue você também em www.salveoartico.org.br.
* Publicado originalmente no site Greenpeace.