Direitos Humanos: Povos indígenas podem vencer nas Nações Unidas

Nações Unidas, 11/09/2007 – Apesar da continua oposição dos Estados Unidos e de outras potências, a Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas parece determinada a adotar a Declaração Universal de Direitos dos Povos Indígenas no final deste mês. Alguns líderes aborígines disseram à IPS estarem otimistas quanto a uma maioria na Assembléia, de 192 membros, votar a favor da resolução que exige o reconhecimento dos direitos dos 270 milhões de indígenas do mundo. Estava previsto que a declaração proposta fosse aprovada pela Assembléia Geral da ONU no ano passado, mas, devido a fortes objeções de alguns países, foi reiteradamente deixada de lado à espera de mais negociações. 


Além dos Estados Unidos, entre os que se negaram a aprovar a declaração estavam Austrália, Canadá, Colômbia, Guiana, Nova Zelândia, Rússia, Suriname e um grupo de nações africanas lideradas pela Namíbia. Embora muitas destas nações continuem se opondo, há fortes sinais de agora quase todos os países africanos apóiam plenamente a declaração. O grupo africano mudou sua posição depois que uma maioria do Fórum Permanente sobre Questões Indígenas nas Nações Unidas, formado por 16 membros, concordou em aceitar sua demanda de revisar certas partes do texto referentes ao conceito de "autodeterminação".

A declaração exige o reconhecimento do direito dos povos indígenas à autodeterminação e ao controle de suas terras, um principio plenamente reconhecido pelo Conselho de Direitos Humanos com sede em Genebra, mas considerado polemico por alguns que temem um enfraquecimento da soberania dos Estados. Em troca de seu apoio, os países africanos pediram que a declaração mencione que não incentiva nenhuma ação que possa enfraquecer a "integridade territorial" ou a "unidade política' dos Estados soberanos. Seu ponto de vista foi incorporado à versão emendada. "Está sujeito à interpretação, mas podemos trabalhar com isto", disse à IPS Les Malezer, presidente do Caucus Indígena Global.

Como muitos outros líderes aborígines, Malezer, ativista de longa experiência nestes assuntos, inicialmente não aprovou as emendas ao projeto. Os líderes indígenas queriam que a declaração fosse adotada por consenso, mas como alguns países continuam sem disposição de reconhecer seus direitos, o mais provável é que a Assembléia Geral opte por uma votação formal. "Se uns poucos Estados não aceitarem a declaração, então isso dirá mais sobre eles do que o documento", disse Malezer, em uma velada referência à posição adotada por Austrália, Canadá, Estados Unidos e Nova Zelândia.

Muitos líderes indígenas denunciam que, com já fizeram no passado, Estados Unidos e Canadá ainda tentavam aplicar táticas de pressão sobre países economicamente fracos e vulneráveis para garantir sues votos contra a declaração. "Eles estiveram dando ordens aos países em desenvolvimento. Mas, agora as nações do Terceiro Mundo adotaram um passo muito progressista em termos de compromisso com os direitos dos povos indígenas", disse Joseph Olé Simel, coordenador do Caucus Regional Indígena africano.

"Queremos fazer uma apelação humilde aos países que ainda têm dificuldades em aceitar que os povos indígenas de todo o mundo desejam que essa declaração seja adotada por consenso", acrescentou Simel em um comunicado, pedindo urgência aos Estados Unidos e seus aliados para "adotarem a mesma direção que tomou a África". Os que se opõem vêem o projeto de declaração como "defeituoso", principalmente pela sua forte ênfase no direito à autodeterminação e ao pleno controle sobre terras e recursos. Acreditam que dessa forma irão obstaculizar os esforços de desenvolvimento econômico e debilitara as normas das democracias estabelecidas.

Esta tensão também se reflete em outras áreas das discussões diplomáticas, entre elas o tratado da ONU sobre diversidade biológica e a Organização Mundial do Comércio, em termos das necessidades de uma ordem econômica neoliberal e do argumento de que os povos autóctones têm o direito de possuir e usar seus recursos sem nenhuma interferência. O tratado sobre biodiversidade, por exemplo, não só reconhece o significado do conhecimento tradicional, como também exige compartilhar de modo "justo e eqüitativo" os benefícios derivados das terras indígenas por parte de empresas comerciais.

Os Estados Unidos se negaram a assinar esse tratado, enquanto alguns de seus aliados contrários à declaração expressaram reservas quanto à implementar o principio de distribuição "justa e eqüitativa" dos recursos. Por outro lado, as ameaças a terras e recursos indígenas continuam sob a forma de mineração, corte de árvores, contaminação tóxica, privatização e projetos de desenvolvimento em grande escala, bem como através do uso de sementes geneticamente modificadas.

Recentes estudos científicos alertaram sobre as devastadoras conseqüências disto para as comunidades indígenas, enquanto a mudança climática ameaça causar mais inundações, furacões, terremotos e derretimento de geleiras em todo o mundo. A Assembléia Geral examina a declaração no momento em que mais de cem líderes de todo o mundo se preparam para assistir em Nova Yorque uma reunião de alto nível sobre mudança climática. Para muitos indígenas, este é um momento histórico. "Fazemos este trabalho há mais de 22 anos", disse Vicky Tauli-Corpus, presidente do Fórum Permanente, com a esperança de que desta vez a Assembléia diga "sim" à declaração. (IPS/Envolverde)

Legenda: Índios Kuikuro, no Xingu, registrando a própria cultura
Foto: Adalberto Marcondes

(Envolverde/ IPS)

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