OBRAS - Uma das principais formações geográficas de Campos está prestes a desaparecer para dar lugar a uma nova área residencial
Márcio Siqueira
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Uma das principais formações geológicas de Campos, o córrego do Cula,
que testemunha a história da formação do Delta do Paraíba do Sul, está
prestes a ser banido do mapa hidrográfico do município para dar espaço
a uma nova área residencial de Campos. As obras de manilhamento e do
desvio do curso natural do último trecho ainda preservado do córrego
foram embargadas por 30 dias pelo Instituto Estadual do Patrimônio
Cultural (Inepac), na quinta-feira passada, dia. No entanto, o projeto
continua a ser executado pela secretaria municipal de Obras, que afirma
ter recebido apenas uma notificação do órgão sobre os trabalhos
concentrados, segundo o secretario da pasta, José Luiz Púglia, em um
canal de irrigação. Entretanto, o ambientalista e articulista da Folha
da Manhã, Arthur Soffiati, que levou o caso ao Ministério Público
Estadual, afirma ter documentos que comprovam a existência do córrego
no local onde estão sendo feitas as obras, que poderão aterrar por
definitivo a curso d'água formado pelas águas do rio Paraíba do Sul há
cerca de cinco mil anos.
O projeto de infra-estrutura e pavimentação da secretaria de Obras está
concentrado no trecho do córrego compreendido entre sua cabeceira, na
foz do rio Muriaé, afluente do rio Paraíba, até a margem esquerda da BR
101, sentido Vitória-Campos, próximo ao Parque Rodoviário. De acordo
com o ambientalista, as obras estão destruindo o curso natural do
córrego, tombado como patrimônio ambiental em dezembro de 2002 pelo
Inepac. Soffiati afirma também ter apresentado à Prefeitura, em
fevereiro deste ano, um parecer apontando a localização exata do
córrego, elaborado através de informações pesquisadas em livros, dados
topográficos e mapas confeccionados no ano de 1767 e 1785, documento
que, segundo ele, foi ignorado pela secretaria de Obras.
— Reuni documentos e mostrei à Prefeitura o local exato do córrego.
Além disso, fiz uma denúncia ao Inepac sobre a degradação do córrego
causada pelas obras, o que moveu a emissão do embargo. Mesmo com tudo
isso, a secretaria de Obras continua a executar o projeto — explicou.
No entanto, mesmo diante das alegações apresentadas pelo ambientalista
e pelo embargo emitido pelo Inepac, o secretario municipal de obras
afirma estar trabalhando em um canal aberto há 30 anos, durante a
gestão do ex-prefeito Zezé Barbosa. "Estamos trabalhando dentro da lei
e temos certeza de que não estamos mexendo com o córrego do Cula.
Recebi uma notificação do Inepac que já está sendo analisada pela
Procuradoria do Município. Não recebi orientação para interromper o
projeto, sendo assim, as obras continuam", informou.
Ambientalista quer garantir preservação
A defesa sustentada por Arthur Soffiati sobre a localização exata do
córrego do Cula é fundamentada através de dados, pesquisas em
cartografia histórica, livros e documentos que contam a história da
formação do Delta do Paraíba que, há 5 mil anos, tinha como um de seus
desaguadouros um ponto entre o mar o Cabo de São Thomé e a Lagoa Feia,
onde existe hoje a praia campista.
Os 50 km de extensão do córrego, que se estende, de acordo com os
estudos do ambientalista, de um ponto frontal à foz do rio Muriaé até a
localidade de Mussurepe, na Baixada Campista, foram mapeados por
Soffiati, que elaborou o documento auxiliado por outros quatros
pesquisadores do município, solicitando o tombamento do córrego junto
ao Inepac em 2002.
— Já reuni vários documentos e informações para tentar defender o
córrego. Mas, quando vi que a Secretaria de Obras continuou a executar
o projeto, mesmo com o embargo emitido pelo Inepac, fiquei mais
irritado. Então tive a certeza de elaborar um novo parecer e enviar a
denuncia ao MPE — afirmou Soffiati.
Já o argumento da secretaria municipal de Obras para manter o projeto
no Parque Rodoviário se baseia em estudos realizados pela própria
Prefeitura, que define uma outra localização do córrego, que o próprio
secretário da pasta não soube apontar. "Temos convicção de que não
estamos trabalhando no Cula, que fica em outro lugar. Acho que se ele
(Soffiati) tem algo a apresentar contra as obras, é melhor procurar a
Justiça — reiterou Púglia.
Polêmica na avaliação de conselho estadual
A polêmica que envolve a proteção do córrego do Cula poderá ser
finalizada nos próximos 15 dias, quando será definido se as obras
continuam ou não no Parque Rodoviário. Documentos apresentados pelo o
ambientalista Arthur Soffiati e pela Prefeitura começaram a ser
analisados, na última segunda-feira, pelo Conselho Estadual de
Tombamento (CET), que apontará se a formação geológica em questão é
realmente o córrego, conforme defende o ambientalista, ou se é um
antigo canal de irrigação, de acordo com o secretário municipal de
Obras.
Segundo o diretor-geral do Inepac, Marcus Monteiro, que remeteu por fax
à redação da Folha da Manhã a cópia do embargo juntamente com a de
recebimento por parte da secretaria de Obras, datado do dia 18 de
outubro de 2007, ainda existe a dúvida sobre a localização exata do
córrego.
— Por isso embargamos a obra por 30 dias, justamente o prazo que
precisamos até dar essa definição do CET. O nosso embargo é
extrajudicial. Se a Prefeitura insiste em seguir com a obra, vai caber
à Justiça tomar as medidas punitivas contra ela. Mas a gente espera o
bom senso por parte da secretaria de Obras em não seguir com as
intervenções até que saia uma decisão definitiva do CET — disse
Monteiro.