Dirceu foi vítima de sua própria estratégia. Da obsessão de eleger Lula presidente a qualquer preço e esse preço começou a ficar impagável quando o candidato, em 2002, quis dar mostras de "responsabilidade" para os brasileiros, ao se comprometer com a carta de intenções do governo FHC junto ao Fundo Monetário Internacional.
O governo estava falido, liquidado, bastaria mostrar essa realidade que os brasileiros compreenderiam, a maioria tinha ciência do fracasso do ex-presidente, das mistificações tucanas.
Num País como o nosso são interessantes algumas contradições. A maioria dos brasileiros considera que bancos e governos internacionais saqueiam o País, mas votam em políticas que são ligados a bancos e governos internacionais. Lula quando assinou o documento quis apenas dizer que ia continuar aceitando a chantagem do Fundo Monetário Internacional, do Banco Mundial, de governos e organizações financeiras em várias partes do mundo (EUA e Europa).
Esse procedimento levou o título de "candidato responsável". Entendeu, equivocadamente, que o momento não era de concessões, mas de ruptura e essa percepção passiva dos brasileiros se transformaria em indignação com FHC. Estava latente.
O preço dessa irresponsabilidade de ter caído na armadilha das elites políticas e econômicas, no cinismo de FHC, se materializa na decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) condenando desde Dirceu e Genoíno a outras figuras de destaque no PT (Partido dos Trabalhadores). Sete dos onze ministros da suprema corte foram indicados por Lula (cinco) e Dilma (dois).
Lula imaginou que seria possível governar formando alianças com elites políticas e econômicas podres e depois de oito anos de um governo que, entre outras coisas, protagonizou um processo de desmanche do Brasil e o maior escândalo de corrupção de toda a nossa história, o golpe branco da reeleição.
Tancredo Neves costumava dizer que não se entra numa luta para perder, com consciência da derrota antecipada. Ou se garante o empate, no mínimo, ou a vitória. Lula entrou no escuro e amarrado numa carta de intenções que hoje se percebe com clareza (muitos perceberam à época) foi uma das mais perfeitas armadilhas do neoliberalismo.
Os dois mandatos que exerceu, o fez na corda bamba e enfrentando sucessivas tentativas de golpes dos mais variados matizes. Sobreviveu seja por seu carisma, seja pelas políticas assistencialistas que acabaram primeiro viabilizando sua reeleição e num segundo momento permitindo a eleição de Dilma Roussef.
De lá para cá a descida da ladeira é uma realidade e a decisão do STF de julgar o caso do mensalão em cima de provas tênues ou indícios, o que cria sempre o benefício da dúvida e essa favorece aos réus, soa como golpe, a guilhotina pronta a cortar cabeças e todos de olhos postos nas eleições de 2014.
Tudo menos Lula são os propósitos das elites que governam o Brasil faz séculos.
E Lula nem é um homem de esquerda, ou um revolucionário. Sequer conseguiu ser reformista. Moldou o seu governo dentro das estruturas seculares do coronelismo político e no modelo traçado por FHC, aquele que Brizola dizia que "veio de longe".
O secretário geral do PCB - Partido Comunista Brasileiro - Ivan Pinheiro definiu com precisão os períodos presidenciais do ex-presidente: "capitalismo a brasileira". Lembra a frase do jurista Sobral Pinto dita a um coronel da ditadura que falou sobre "democracia a brasileira". Como respondeu Sobral, "democracia não é como peru, não existe a brasileira. Ou é democracia ou não é".
Capitalismo não existe a brasileira, ou é capitalismo ou não é.
Lula manteve intocado o desenho neoliberal de FHC, pior, aprofundou-o em vários setores da economia brasileira e acreditou, por exemplo, como acredita Dilma, que Eike Batista está preocupado com o Brasil ou com os brasileiros. São meros detalhes no que o empresário chama de "kit de felicidade" ao referir-se ao pacote de meses atrás da presidente Dilma Roussef sobre "concessões" de bens públicos à iniciativa privada.
O ex-presidente, antes mesmo de sua posse, recebeu sugestões de vários líderes do PT, seu partido, dentre eles o seu principal mentor político, o extraordinário Chico Oliveira, sobre como escapar da armadilha neoliberal sem provocar reações que pudessem colocar em risco seu mandato.
Desprezou a todas. Seguiu a cabeça "lógica" de Dirceu, acreditando que Roberto Jeferson, um homem da ditadura militar, que nasceu politicamente na ditadura militar, pudesse vir a ser um "aliado confiável".
O que todos queriam, os tais "aliados" era a manutenção do esquema de compra e venda do governo FHC. Manteve e o resultado está aí. FHC impune e a campanha de desmoralização do ex-presidente e seu partido em curso acelerado, seja pela mídia podre, seja pela incompetência do PT e Lula. Não percebeu ainda o tamanho da armadilha e se debate preso às garras dessa armadilha na suposição que vencendo, se vencer, as eleições para a prefeitura de São Paulo tudo está resolvido. Pode até ser. Mas dentro do modelo, sem mudar uma vírgula sequer do modelo e ampliando as políticas neoliberais de privatização e concentração de renda, um abismo entre a classe trabalhadora, a própria classe média (iludida por celulares que só faltam falar se é que já não falam).
O clube de amigos e inimigos cordiais. O faz de conta da política brasileira. De um mundo institucional falido.
A velha imagem de ligar a seta para a esquerda e virar o carro à direita. Caso do tratado de livre comércio assinado com Israel. Um cavalo de Tróia que o complexo político, econômico e terrorista ISRAEL/EUA TERRORISMO S/A fez entrar em nosso País e hoje começa a fechar o cerco do que foi iniciado no governo FHC em torno dos setores estratégicos da economia brasileira.
Somos um País imenso, com dimensões continentais, mas somos um País manco. Capazes de gerar tecnologias de ponta indispensáveis no mundo contemporâneo, capazes de nos transformarmos em potência de verdade e não de ilusão, mas estamos abrindo mão dessas potencialidades.
O sucateamento da indústria nacional, os absurdos de um código florestal ao sabor dos interesses de latifundiários, o controle que o sistema financeiro exerce sobre o Banco Central e o Ministério da Fazenda (a ponto do ministro Guido Mantecca afirmar que se o Brasil disponibilizar 10% do PIB para a educação quebra), todo o processo político e econômico que vem nos transformando de País líder da América Latina em parte do Plano Grande Colômbia.
Vamos a reboque de uma locomotiva onde os maquinistas já perceberam que Lula e Dilma não vão mudar o rumo. Nem diminuem a velocidade.
Nossas universidades (professores por extensão, óbvio) públicas transformadas em sucata, os hospitais universitários a ponto de serem privatizados na falácia de uma empresa estatal de direito privado (caminho para a privatização), os serviços públicos em franco desmanche (são servidores públicos que materializam os direitos básicos dos trabalhadores, da população) e dependentes nas tecnologias essenciais. Caso, para citar um exemplo, da EMBRAER (EMPRESA BRASILEIRA DE AERONÁUTICA). Ou dos arsenais da Marinha de Guerra.
Nem o governo Lula e nem o governo Dilma investem no Brasil. Aceitaram passivamente a realidade neoliberal e sobrevivem no populismo de programas assistencialistas que já começam a se perder e a encontrar becos sem saída. Em Pernambuco onde o PT tomou uma surra, ou no Amazonas, onde Arthur Virgílio renasce de escombros políticos/eleitorais numa ressurreição que nunca se podia imaginar.
E olha que os adversários são FHC. José Serra, Aécio Neves, contumazes corruptos, ou o governador Geraldo Alckmin, num estado onde a violência acorda, caminha e deita impune e brutal como sempre.
O fracasso é de Lula e do PT. Das alianças "mágicas" com as classes dominantes. Da falta de perspectiva revolucionária do ex-presidente e do partido.
Já sabiam que o STF julgaria da forma que julgou e nem iria ou irá se preocupar com a privataria tucana. Nem a Corte e nem o Procurador Geral.
É o clube de amigos e inimigos cordiais e Lula agora, entra pela porta dos fundos, onde até um provável retorno, ou uma reeleição de Dilma, não muda e não altera nada. A ordem dos fatores capitalistas se mantém intacta e o produto vai ser sempre o mesmo.
Que a decisão, ou decisões do STF, se constituiu num golpe ninguém tem dúvida. Mas Gilmar Mendes, por exemplo, poderia estar fora da Corte desde episódios sobejamente conhecidos de corrupção. Lula preferiu ir conversar com ele num encontro arranjado por Nelson Jobim, figura chave de FHC para o processo de privatizações.
Merece ir para o canto da sala e por lá ficar por horas a fio com o chapéu de burro. Não adianta chorar sobre o leite derramado.
Essa luta de mudanças vai ser construída pelas forças populares e nas ruas. O mundo institucional está falido. E Lula ou Dilma teimam em jogar o jogo dessa turma. Logo...
... Mais que nunca as forças populares precisam se mostrar diferentes do PT e do ex-presidente, de Dilma, pois no afã de manter o domínio real sobre o Brasil, jogam a todos no mesmo cesto. São diferentes, pelo menos algumas.