Mais ou menos como "defender o nosso ladrão", frase do ex-presidente norte-americano Dwight Eisenhower.
Não há sentido nisso e descaracteriza um partido como o PT e sua história, ao mesmo tempo que despreza sua militância, sua trajetória para justificar atos de corrupção de uma das principais figuras de sua cúpula.
O PT continua a ser um partido paulista, tal e qual o PSDB. Lula não pode ser analisado e nem entendido nos limites do seu partido, ultrapassa-os. Dilma não.
Nem é PT e nem deixa de ser. Foi apenas um equívoco do ex-presidente. Ou falta de opção. De qualquer forma uma irresponsabilidade que por uma série de fatores joga o Brasil na posição de ficar seguro num galho com um abismo imenso abaixo e dependendo da capacidade do galho agüentar ou não o peso.
E o assunto não se esgota aí, nos "feitos prodigiosos" de Antônio Palocci. Só foram possíveis por conta do modelo político econômico adotado desde o governo Lula, com diferenças, evidente, de situação de tempo e espaço.
Lula recebeu o que se convencionou chamar de "herança maldita" do desgoverno FHC (outro consultor de empresas estrangeiras, empresas e governos). Ou dava um jeito de segurar o touro pelo chifre, ou se lascava. Tinha duas maneiras de segurar o touro. Optou pela pior delas, mas com claras mudanças em relação ao governo FHC. Nada que mexesse na essência, na estrutura política e econômica do Brasil.
Inventou o "capitalismo a brasileira" como definiu Ivan Pinheiro. Saiu-se bem, conseguiu superar as armadilhas deixadas por FHC, houve substanciais melhorias no aspecto social, mas no todo, se olhado de cima, não vai ser possível dizer como Gagarin disse ao olhar a Terra de dentro de sua nave espacial - "a terra é azul" -.
Lula não realizou a reforma agrária, pelo contrário, abriu as pernas ao latifúndio e sua doença maior, o transgênico (a outra é a pistolagem). Equilibrou-se em alianças espúrias para sobreviver ao ataque tucano e o saldo final acabou sendo positivo em boa parte graças ao seu carisma.
Palocci representa o que há de pior no modelo político e econômico. As consultorias são apenas adereços no que ele representa. Gratidão pelos serviços prestados aos bancos e grandes empresas.
O Brasil paga 45% de sua receita orçamentária em juros de dívidas. Sustenta o setor financeiro. Palocci é homem do esquema.
Os aspectos positivos do governo Lula permitiriam a Dilma algo como um grande salto no sentido de promover mudanças estruturais necessárias para evitar crises e impasses que mais à frente joguem o Brasil de novo em mãos tucanas - extrema direita -, mas de cara substituiu dois ministros essenciais ao que o governo Lula construiu de válido. Celso Amorim nas Relações Exteriores e Samuel Pinheiro Guimarães na Secretaria Nacional de Assuntos Estratégicos.
Com Anthony Patriot e Moreira Franco (figuras execrável em qualquer sentido) aceitou o modelo do qual Palocci é o principal porta-voz, o homem chave no governo.
Avanços? Nem pensar.
As portas estão escancaradas se não houver uma reviravolta nos rumos do governo para o retorno triunfal dos tucanos nas próximas eleições.
Na cabeça de Palocci e seu grupo o Brasil tem aceitar o tal pragmatismo que controla o mundo - milhares de ogivas nucleares de um país falido, os Estados Unidos - e a lógica de banqueiros e grandes empresas internacionais, resignando-se ao papel de entreposto do capital internacional.
Para determinados setores do próprio partido governista, o PT, a política econômica deveria voltar-se para o mercado interno, o fortalecimento das empresas nacionais e o processo de integração latino-americana, como forma de resistir ao avanço das hordas de bárbaros do neoliberalismo.
O ministro chefe do Gabinete Civil é mais que imoral - já que os atos que praticou são legais -. Representa o que há de pior na política brasileira. A aceitação passiva do neoliberalismo, o estupro praticado pelo sistema financeiro e empresas internacionais transformado eufemisticamente em pragmatismo.
O que se percebe de imediato nessa questão toda é que além do apetite tucano para complicar as coisas (tucanos são todos consultores como Palocci, o problema é disputa de consultor de quem) é que ao desenrolar o novelo político e econômico a presidente Dilma se viu presa num labirinto de rolos e mais rolos.
E agora as beiras do mingau já foram devoradas pela oposição - não a interna, mas a externa - vai ser difícil comer o resto.
O que o PT não percebeu até hoje é que os brasileiros - em sua maioria -, os que elegeram Lula e Dilma optaram por um modelo diverso. Ao invés de buscar força na organização popular o partido da presidente buscou aliar-se ao que há de mais conservador, retrógrado e corrupto na política brasileira.
Ou estou enganado e o presidente do Senado é outro que não José Sarney?
No frigir dos ovos fica óbvio que se as dificuldades tinham uma dimensão de dez, por exemplo, agora, essa mesma dimensão é de vinte.
Ou alguém acha que José Serra voltou da Transilvânia apostando em que?
Não justifica também colocar a culpa na mídia golpista, atribuir os erros de Palocci a essa mídia, a uma campanha de desmoralização do governo.
Primeiro porque a mídia é golpista e todos no governo sabem disso. Segundo, porque na ingenuidade de parecer líder de alguma coisa, a própria presidente foi ensinar a fazer omelete no programa rasteiro de Ana Maria Braga, apareceu ao lado de figuras de porte nessa mídia e tudo terminou em Brilhante Ulstra colunista da FOLHA DE SÃO PAULO.
Acreditar que essa mídia podre e venal fosse silenciar diante de erros e pilantragens do ministro Palocci é acreditar em duendes e fadas com varinhas mágicas transformando William Bonner em ser humano. A tecnologia ainda não chegou a esse ponto, fazer de robôs seres humanos.
Defender Palocci com esse argumento soa como defender "o nosso ladrão" e jogar para debaixo do tapete atos imorais que colocam o governo na defensiva. Em qualquer situação, errado ou certo, o governo vai ser alvo dessa mídia, essa uma realidade.
Como fizeram com Lula? Não há dúvidas sobre isso, mas Lula era Lula e Dilma é Dilma, mesmo com Lula mexendo as cordinhas por trás das cortinas.
A responsabilidade maior do governo agora é resgatar os compromissos históricos do partido da presidente, retomar políticas de integração latino-americana, mudar drasticamente a política econômica e buscar sustentação no povo, no movimento popular, pois o clube de amigos e inimigos cordiais de Brasília que congrega latifundiários, empresários e banqueiros, esse é farsa, é jogo onde valem os golpes baixos (as revelações sobre a consultoria de Palocci saíram da Secretaria das Finanças de São Paulo (país vizinho que fala a mesma língua e é governado nominalmente por Geraldo Alckimin e na prática por José Serra).
O dilema do governo Dilma não é fica ou sai Palocci, é o próprio governo e seus rumos.
Com Moreira Franco, por exemplo, produto das tais alianças, não chega nem a fazer cócegas nos verdadeiros donos do poder. Pelo contrário, é o lado de lá com assento no Planalto.
Render-se a essa evidência, o "nosso ladrão", é a falência total do governo e do PT.