José Luis Baños/IPS
Ana Pacenko, uma entre tantos ucranianos afetados
por Chernobyl que recebem tratamento médico em Cuba.
Berlim, Alemanha, 25 de abril de 2011 (Terramérica).- A ruína do reator nuclear ucraniano de Chernobyl, que explodiu há 25 anos provocando uma das piores catástrofes ambientais da história, ainda contém quase 95% do combustível original, altamente radioativo. Por isso, e como o sarcófago que cobre estas ruínas não é hermético, a radiação atual do local, cem quilômetros ao Norte de Kiev, é cem vezes superior à natural, segundo medições recentes feitas por especialistas em meio ambiente. “A radioatividade que medimos em Chernobyl vem da usina nuclear. O sarcófago do Reator 4 tem múltiplos buracos e deve ser substituído o mais rápido possível”, disse ao Terramérica o especialista nuclear Heinz Smital, da organização Greenpeace. Heinz, que há pouco tempo visitou a região, disse que o segundo sarcófago está em construção desde o final de 2010. “Porém, devido à alta radioatividade, que tem efeitos mortais em pouco tempo, é impossível trabalhar nas proximidades do reator, o que obriga a construir o novo sarcófago longe do local e seu transporte por trem até Chernobyl”, explicou.Ana Pacenko, uma entre tantos ucranianos afetados
por Chernobyl que recebem tratamento médico em Cuba.
Amanhã, 26 de abril, a explosão completa um quarto de século. Diversas medições indicam que, no recinto do reator, a radiação que se absorve durante seis segundos ultrapassa o máximo permitido para trabalhadores em centrais nucleares. O novo sarcófago de aço e concreto pesará cerca de 29 mil toneladas e custará US$ 2,3 bilhões, segundo uma nova estimativa divulgada durante uma conferência de doadores realizada em Kiev no dia 19. A Ucrânia esperava conseguir nesse encontro US$ 1,1 bilhão para financiar as obras. Mas os doadores se comprometeram a entregar pouco menos de US$ 800 milhões.
A conferência, convocada pelo Grupo dos Oito países mais poderosos (Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Grã-Bretanha, Itália, Japão e Rússia) e da qual também participou a União Europeia, discutiu as necessidades financeiras para o novo sarcófago, que deveria ter ficado pronto em 2007, e que, segundo o novo planejamento, poderá ser instalado em 2015. Esse atraso por falta de dinheiro piorou o saldo mortal do acidente nuclear.
Segundo o estudo “Consequências para a Saúde de Chernobyl – 25 Anos Depois”, divulgado este mês pela seção alemã da Associação Internacional de Médicos para a Prevenção da Guerra Nuclear (AIMPGN), o desastre matou cerca de 112 mil dos chamados “liquidadores”, soldados e funcionários públicos que trabalharam na construção do primeiro sarcófago nos meses seguintes as explosão. Além disso, segundo a Associação, até 90% das 830 mil pessoas que trabalharam na contenção do desastre sofrem diferentes formas de câncer. Outras cinco mil morreram na Europa, vítimas da nuvem radioativa lançada pelo reator e que cobriu todo o continente, da Suécia à Finlândia, no Norte, até Itália e Espanha, no Sul.
Outros estudos documentam casos de câncer e mutações genéticas em crianças nascidas após a catástrofe. A Organização Mundial da Saúde estima que, na Bielorússia, mais de 50 mil crianças sofrem ou sofrerão de câncer de tireóide. O Comitê Científico das Nações Unidas sobre os Efeitos das Radiações Atômicas estima que, em todo o mundo, entre 30 mil e 207,5 mil crianças nasceram com defeitos genéticos devido ao acidente em Chernobyl. Apesar de não haver números definitivos, Chernobyl pode ter causado a morte de aproximadamente 900 mil pessoas na Europa.
Inclusive a Agência Internacional de Energia Atômica, favorável ao uso civil da radioatividade, chega a conclusões alarmantes: enquanto nos países escandinavos a mortalidade infantil cresceu 15,8% devido a Chernobyl, na Alemanha foi registrado aumento de casos de síndrome de Down e de neuroblastoma infantil, um tipo de tumor no tecido nervoso de alta mortalidade.
O oncologista Edmund Lengfelder, diretor do Instituto de Proteção Radiológica da cidade alemã de Munique, disse ao Terramérica que, mesmo hoje, é possível detectar altas concentrações de Césio 137 em cogumelos colhidos e em animais caçados nas florestas alemãs. A carne de um javali nesses lugares pode superar a dose máxima aceita pelo Ministério da Saúde alemão, de 600 becquerels por quilo.
O acidente ocorreu no dia 26 de abril de 1986 devido a uma simulação de corte na eletricidade realizada pelo pessoal da central. O teste provocou um súbito aumento da potência e o aquecimento do Reator 4, e, em seguida, uma explosão do hidrogênio acumulado em seu interior que lançou o teto a cerca de 15 metros de altura.
A explosão liberou oito das 190,2 toneladas de combustível nuclear contido no reator, e as espalhou por toda a Europa. A nuvem radioativa continha dióxido de urânio, Césio 136, carbureto de boro e outros materiais. Sua toxidade foi considerada 500 vezes superior à provocada pela bomba atômica que os Estados Unidos lançaram sobre a cidade japonesa de Hiroshima em 1945. As outras 182 toneladas de combustível ainda presentes no primeiro sarcófago de Chernobyl constituem um magma infernal a ser mantido isolado.
“Este é o objetivo do novo sarcófago”, disse ao Terramérica o engenheiro Hosni Bouzid, diretor do projeto de construção, realizado por um consórcio entre as empresas francesas Vinci e Bouygues. “Durante os preparativos, em 2010, encontramos no local todo tipo de material, todos contaminados, incluindo guindastes, restos de helicópteros e dos andaimes utilizados há 25 anos para a construção do primeiro sarcófago”, acrescentou. A obra é um desafio técnico, ambiental e sanitário, pois implica aproximar-se e eventualmente abrir a Caixa de Pandora que Chernobyl continua sendo.
* O autor é correspondente da IPS.