Novo sarcófago para Chernobyl deverá esperar até 2015

A falta de fundos para construir um confinamento definitivo do reator nuclear de Chernobyl piora a sequela de doenças e mortes.
José Luis Baños/IPS
1257 TERRAMÉRICA   Novo sarcófago só em 2015
Ana Pacenko, uma entre tantos ucranianos afetados
por Chernobyl que recebem tratamento médico em Cuba.
Berlim, Alemanha, 25 de abril de 2011 (Terramérica).- A ruína do reator nuclear ucraniano de Chernobyl, que explodiu há 25 anos provocando uma das piores catástrofes ambientais da história, ainda contém quase 95% do combustível original, altamente radioativo. Por isso, e como o sarcófago que cobre estas ruínas não é hermético, a radiação atual do local, cem quilômetros ao Norte de Kiev, é cem vezes superior à natural, segundo medições recentes feitas por especialistas em meio ambiente. “A radioatividade que medimos em Chernobyl vem da usina nuclear. O sarcófago do Reator 4 tem múltiplos buracos e deve ser substituído o mais rápido possível”, disse ao Terramérica o especialista nuclear Heinz Smital, da organização Greenpeace. Heinz, que há pouco tempo visitou a região, disse que o segundo sarcófago está em construção desde o final de 2010. “Porém, devido à alta radioatividade, que tem efeitos mortais em pouco tempo, é impossível trabalhar nas proximidades do reator, o que obriga a construir o novo sarcófago longe do local e seu transporte por trem até Chernobyl”, explicou.
Amanhã, 26 de abril, a explosão completa um quarto de século. Diversas medições indicam que, no recinto do reator, a radiação que se absorve durante seis segundos ultrapassa o máximo permitido para trabalhadores em centrais nucleares. O novo sarcófago de aço e concreto pesará cerca de 29 mil toneladas e custará US$ 2,3 bilhões, segundo uma nova estimativa divulgada durante uma conferência de doadores realizada em Kiev no dia 19. A Ucrânia esperava conseguir nesse encontro US$ 1,1 bilhão para financiar as obras. Mas os doadores se comprometeram a entregar pouco menos de US$ 800 milhões.
A conferência, convocada pelo Grupo dos Oito países mais poderosos (Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Grã-Bretanha, Itália, Japão e Rússia) e da qual também participou a União Europeia, discutiu as necessidades financeiras para o novo sarcófago, que deveria ter ficado pronto em 2007, e que, segundo o novo planejamento, poderá ser instalado em 2015. Esse atraso por falta de dinheiro piorou o saldo mortal do acidente nuclear.
Segundo o estudo “Consequências para a Saúde de Chernobyl – 25 Anos Depois”, divulgado este mês pela seção alemã da Associação Internacional de Médicos para a Prevenção da Guerra Nuclear (AIMPGN), o desastre matou cerca de 112 mil dos chamados “liquidadores”, soldados e funcionários públicos que trabalharam na construção do primeiro sarcófago nos meses seguintes as explosão. Além disso, segundo a Associação, até 90% das 830 mil pessoas que trabalharam na contenção do desastre sofrem diferentes formas de câncer. Outras cinco mil morreram na Europa, vítimas da nuvem radioativa lançada pelo reator e que cobriu todo o continente, da Suécia à Finlândia, no Norte, até Itália e Espanha, no Sul.
Outros estudos documentam casos de câncer e mutações genéticas em crianças nascidas após a catástrofe. A Organização Mundial da Saúde estima que, na Bielorússia, mais de 50 mil crianças sofrem ou sofrerão de câncer de tireóide. O Comitê Científico das Nações Unidas sobre os Efeitos das Radiações Atômicas estima que, em todo o mundo, entre 30 mil e 207,5 mil crianças nasceram com defeitos genéticos devido ao acidente em Chernobyl. Apesar de não haver números definitivos, Chernobyl pode ter causado a morte de aproximadamente 900 mil pessoas na Europa.
Inclusive a Agência Internacional de Energia Atômica, favorável ao uso civil da radioatividade, chega a conclusões alarmantes: enquanto nos países escandinavos a mortalidade infantil cresceu 15,8% devido a Chernobyl, na Alemanha foi registrado aumento de casos de síndrome de Down e de neuroblastoma infantil, um tipo de tumor no tecido nervoso de alta mortalidade.
O oncologista Edmund Lengfelder, diretor do Instituto de Proteção Radiológica da cidade alemã de Munique, disse ao Terramérica que, mesmo hoje, é possível detectar altas concentrações de Césio 137 em cogumelos colhidos e em animais caçados nas florestas alemãs. A carne de um javali nesses lugares pode superar a dose máxima aceita pelo Ministério da Saúde alemão, de 600 becquerels por quilo.
O acidente ocorreu no dia 26 de abril de 1986 devido a uma simulação de corte na eletricidade realizada pelo pessoal da central. O teste provocou um súbito aumento da potência e o aquecimento do Reator 4, e, em seguida, uma explosão do hidrogênio acumulado em seu interior que lançou o teto a cerca de 15 metros de altura.
A explosão liberou oito das 190,2 toneladas de combustível nuclear contido no reator, e as espalhou por toda a Europa. A nuvem radioativa continha dióxido de urânio, Césio 136, carbureto de boro e outros materiais. Sua toxidade foi considerada 500 vezes superior à provocada pela bomba atômica que os Estados Unidos lançaram sobre a cidade japonesa de Hiroshima em 1945. As outras 182 toneladas de combustível ainda presentes no primeiro sarcófago de Chernobyl constituem um magma infernal a ser mantido isolado.
“Este é o objetivo do novo sarcófago”, disse ao Terramérica o engenheiro Hosni Bouzid, diretor do projeto de construção, realizado por um consórcio entre as empresas francesas Vinci e Bouygues. “Durante os preparativos, em 2010, encontramos no local todo tipo de material, todos contaminados, incluindo guindastes, restos de helicópteros e dos andaimes utilizados há 25 anos para a construção do primeiro sarcófago”, acrescentou. A obra é um desafio técnico, ambiental e sanitário, pois implica aproximar-se e eventualmente abrir a Caixa de Pandora que Chernobyl continua sendo.
* O autor é correspondente da IPS.
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