Cuba, da Espanha

Barcelona, Espanha, agosto/2010 – Existe um consenso generalizado de que algo acontece em Cuba. A mudança não é tanta como alguns esperariam. É menor do que muitos exigem, mas é maior do que parecia ser a norma nos últimos meses, e sobretudo desde o anúncio da doença de Fidel Castro e o efetivo abandono de seu poder jurídico, em fevereiro de 2008, embora não o de influência e pressão. Agora se acumulam demasiados detalhes novos para que o conjunto do panorama cubano passe despercebido.

Em primeiro lugar, deve ser destacado o certamente estelar papel da Igreja, antes relegada a um segundo plano, injuriada pelos exilados por seu silêncio diante do regime. Em segundo lugar, deve ser constatado o caráter espetacular (por seu volume e rapidez) da libertação (desterro, anistia, exílio ou como se quiser chamar) de um número importante de presos condenados por crimes que em outros países são qualificados justamente como “políticos”. Em terceiro lugar, agora se une ao cenário o que pode parecer como um novo capítulo das reaparições cíclicas de Fidel Castro, como contraparte ao ambivalente protagonismo de seu irmão. Desta vez, no entanto, quis mandar uma mensagem não apenas pela frequência de intervenções em poucos dias, coincidindo (casualmente?) com a saída dos presos, e culminando por vestir novamente uma parte do uniforme militar na comemoração do ataque ao quartel Moncada.

Neste panorama também se inserem temas recorrentes e pautas com perfil de estereótipo. Em primeiro lugar, deve ser destacada a própria natureza da libertação de prisioneiros de consciência, acontecimento que não é nada novo. Ocorreu em razão do chamado “diálogo” entre o setor moderado no exílio, nos anos 70, prosseguiu como resultado de acordos com o presidente norte-americano Jimmy Carter no final da mesma década, e culminou como consequência das visitas do papa em 1998 e do próprio Carter em 2002. Em todos estes capítulos, o regime, cedo ou tarde, equilibrava a estratégia de repressão com a prisão e condenação de outros contingentes de opositores. O mais recente é precisamente o que está sendo objeto de libertação condicionada à transferência de território.

Uma segunda dimensão a se levar em conta é o papel do governo espanhol de “acompanhar” a mediação da Igreja, uma novidade no que se refere às relações do regime cubano com o interior e o exterior simultaneamente. Por outro lado, é constatada a insistência com que o ministro Miguel Angel Moratinos exigiu publicamente, e com grande risco político, o levantamento da Posição Comum (PC) da União Europeia (UE), orientada a promover a transição para a democracia e o respeito pelos direitos humanos.

Não conseguindo, passará de ser um dos ganhadores claros da trama a um perdedor nato.

Mais do que explicações de cunho realista (que existem), na relação hispano-cubana convém recordar que os governos cubano e espanhol (em qualquer época e com qualquer tipo de regime) seguiram o passo ditado pela Espanha “real” e a Cuba “real”. A Cuba “oficial” e a Espanha “oficial” não tiveram outra alternativa a não ser seguir o caminho da emigração espanhola para Cuba depois do desastre de 1898. “Mais se perdeu em Cuba” dá voltas sobre as consciências e os acontecimentos. O acordo tácito de ambas as partes foi o de manter a relação a todo custo. E, disse Franco: “com Cuba, qualquer coisa, exceto romper”. Isto não é fácil de entender em Praga ou Varsóvia.

No mesmo terreno da repetição carente de novidade se situa a implacável tática do governo cubano de exigir o levantamento da PC, sobretudo quando a exigência se baseia em sua equiparação ao embargo dos Estados Unidos. Enquanto a política de Washington persegue o objetivo exclusivo de acabar com o sistema castrista, a PC não é simplesmente mais do que a expressão de uns bons desejos. Nem é uma verdadeira “posição” e nem é “comum”.

Em primeiro lugar, esta decisão da UE foi produzida em novembro de 1996, inserida no complexo cenário composto pela derrubada dos aviões da Irmãos em Resgate no dia 23 de fevereiro, a consequente aprovação da lei Helms-Burton (codificação do embargo) em março e a mudança de governo na Espanha no mesmo mês, com a explicável ânsia de protagonismo de José María Aznar para marcar distância de seu antecessor, Felipe González.

Entretanto, a PC não propôs nada mais além de prometer colaboração “completa” da UE em matéria de ajuda ao desenvolvimento, sem tocar (não podia fazê-lo juridicamente) nas múltiplas dimensões da política externa em matérias econômica, estratégica ou de investimentos. Se a PC teve em algum momento um “espírito”, este foi violado sistematicamente por todos seus Estados membros, liderados pela Espanha, tanto por governos conservadores como socialistas.

Daí que as reclamações do governo cubano de que a PC afeta seus interesses não tem base alguma. A PC serve somente como desculpa para o regime cubano ocultar suas carências, como no caso do resultado político mais óbvio do embargo norte-americano, apontado como culpado exclusivo pelo desastre econômico de Cuba, e, portanto, servindo de folha de parreira para o político.

Assim, além de esperar para ver se Fidel volta a usar os uniformes esportivos, se impõe um duplo “movimento de ficha” (famosa invenção de Aznar) que deixe fora de jogo o governo cubano. Por um lado se impõe a nada difícil eliminação da PC. Por outro, é recomendável, mas ao mesmo tempo sujeita a inércia, mas não impossível, a gradual e inteligente reforma da política dos Estados Unidos como sinal inequívoco do fim do embargo e de sua duvidosa eficácia. Envolverde/IPS

* Joaquín Roy é catedrático Jean Monnet e diretor do Centro da União Europeia na Universidade de Miami (Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.).

(IPS/Envolverde)
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