Percepção dos Estados Unidos sobre a relação Europa-América Latina

Madri, maio/2010 – Para Washington interessa ou preocupa muito pouco o que a Europa, coletivamente como União Europeia (UE) ou individualmente por países, possa fazer com suas relações com o resto da América. Na realidade, esta atitude é um reflexo e uma consequência da redução do interesse pela sub-região do sul, devido ao predomínio da urgência de ação em outras áreas, como Oriente Médio, China e, em modo geral, devido ao tema do terrorismo internacional.

Geograficamente, na medida em que algo se afasta da área de influência próxima de Washington (Caribe, América Central e, sobretudo, México) o interesse do governo norte-americano diminui ainda mais. Porém, existem ainda alguns temas pontuais que merecem, pelo menos, certa atenção, sem exagerar sua importância, que no final é mínima.

Quanto a Cuba, muitas foram as expectativas de observadores nos Estados Unidos e na Espanha com relação ao hipotético trabalho de mediação entre Madri e Havana, que repercutisse em fórmulas para conseguir uma evolução do regime cubano que fosse aceitável para Washington, como condição para modificação ou eliminação do histórico embargo. É certo que a Espanha, como protagonista idônea no contexto da UE nesse tema, foi identificada precocemente como um ator útil para a política de Washington no aparentemente intratável dilema sobre o que fazer com o regime cubano, diante do fracasso histórico da estratégia de isolar o regime castrista e provocar sua queda.

A política de “implicação construtiva” da UE, liderada pela Espanha, era vista como alternativa. Mas a resistência do presidente Raúl Castro em fazer concessões e a retomada da tática de seu irmão Fidel, de identificar a política europeia de condicionar as relações com a estratégia própria dos Estados Unidos, tornou essa colaboração impossível.

Mais útil pode ser a colaboração europeia nos projetos de reconstrução de zonas afetadas por desastres naturais, como furacões no Caribe e agora o terremoto que quase destruiu o Haiti, além do mais recente no Chile. As credenciais da UE e de seus Estados-membros são notórias: mais da metade da ajuda humanitária e de desenvolvimento tem origem europeia. Se desaparecesse, numerosas regiões da América Latina ficariam totalmente órfãs de apoio externo.

Não está claro o que podem fazer as potências europeias quanto à situação entre Washington e o presidente Hugo Chávez, que não parece ter melhorado após a sucessão de George W. Bush (o foco dos ataques venezuelanos) por Barack Obama. O certo é que os países com maiores interesses na Venezuela sofrem o impacto das decisões do líder venezuelano, na forma de expropriações.

Os programas de cooperação entre Venezuela e UE são modestíssimos. O mesmo se pode dizer com relação à Bolívia, e em menor grau quanto ao Equador. Daí a relação especial entre a UE e o Brasil (como exemplo do abandono sutil da política exclusiva em blocos) poder encorajar os planos de Washington (reflexo de sua história) para identificar sócios de peso em diferentes partes do mundo para estabelecer coalizões. Mas a agenda errática do presidente Lula não parece ter contentado os responsáveis pela política externa norte-americana.

América Central e México se apresentam como terrenos também possíveis de colaboração. O tráfico de drogas e a emigração descontrolada (os perigos de uma Cuba em transição ou com tensões internas) são temas nos quais o conselho e a colaboração europeia podem resultar eficazes. O narcotráfico é um câncer dualmente provocado pelo consumo na Europa e nos Estados Unidos. A maciça emigração é uma realidade atual que Estados Unidos e Europa compartilham. Embora, no momento, as ameaças do uso do território latino-americano pelo terrorismo internacional só apareçam como potenciais, no caso de ser gerado este problema, a Europa poderia se converter em um efetivo aliado de Washington.

No campo econômico, menos preocupação podem levantar os investimentos europeus na América Latina, já que se apresentam como mais benéficos que a abertura asiática, e da China em particular, para a América Latina. Se, há duas décadas, via-se os planos de integração regional na América Latina, seguindo o modelo da UE, como competidores dos esquemas de livre comércio patrocinados pelos Estados Unidos (Nafta, Alca), agora são considerados como possíveis colaboradores da estabilidade da região. Resta ver como vão coincidir, ou colidir, as atitudes europeias e as norte-americanas quanto à aparição de esquemas evidentemente opostos à presença dos Estados Unidos (Alba) ou exclusivamente latino-americanos (Unasul, ou, mais recentemente, a Organização dos Estados Latino-Americanos e do Caribe). IPS/Envolverde

* Joaquín Roy é catedrático Jean Monnet e diretor do Centro da União Europeia da Universidade de Miami (Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.).

(IPS/Envolverde)
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