As novas ordens definem com “infiltrado” qualquer palestino ou não-palestino que viva na Cisjordânia, mas não tenha documento de identidade israelense ou permissão especial emitida pelo exército israelense de ocupação.
Assim, mesmo os palestinos nascidos e criados na Cisjordânia e que ali viveram toda a vida, mas não tenham documento de identidade israelense, serão considerados “infiltrados” e pode ser deportados a qualquer momento, sem aviso. Sob as novas regras, os “infiltrados” podem ser imediatamente expulsos ou condenados a sete anos de prisão.
Matéria sobre as novas regras na imprensa israelense, essa semana, calculava que Israel poderá deportar dezenas de milhares de palestinos. Mas nada dizia sobre para onde seriam enviados esses deportados.
No passado, Israel deportou muitos palestinos para a Jordânia e o Líbano. Mas as condições hoje mudaram, e Israel não conseguirá repetir a mesma ação, porque há o tratado de paz Israel-Jordânia e a delicada situação na fronteira Israel-Líbano que o impedem – sobretudo depois da guerra de 2006 entre Israel e o Hizbollah libanês.
As novas ordens, que entraram em vigor na 3ª.-feira, visam inicialmente os milhares de palestinos da Faixa de Gaza que residiram na Cisjordânia. Visa também os palestinos retornados, muitos dos quais casaram com mulheres palestinas locais, e que retornaram ao território ocupado depois do processo de Oslo e o estabelecimento da Autoridade Palestina (AP).
Além desse, as novas ordens visam também os ativistas da paz que chegam à Cisjordânia para monitorar as violações, por Israel, da lei internacional e encorajam a resistência não-violenta contra a ocupação israelense.
Até aqui, as autoridades israelenses ainda não comentaram as novas regras e não confirmam nem negam a existência delas. Esse silêncio – como vários observadores já disseram, talvez vise a testar a relação dos palestinos, dos árabes e da comunidade internacional, antes que as novas leis draconianas comecem a ser aplicadas.
Como era de prever, as novas regras foram duramente condenadas por autoridades árabes e palestinas, e por grupos de defesa dos direitos humanos.
O Hamás, partido da resistência islâmica palestina, disse que as novas regras “são continuação do processo sistemático de limpeza étnica de nosso povo, iniciado em 1948".
“Enquanto os judeus fazem solenidades para denunciar o holocausto de judeus na Alemanha, o governo de Israel pratica holocausto silencioso contra o povo palestino” – disse um porta-voz do Hamás na Cisjordânia, que não quis ser identificado, aparentemente por temer ser preso, seja pelos israelenses seja pela polícia da Autoridade Palestina.
O Hamás e o Fatah declararam que resistirão “proativamente” às novas regras, e disse que deportar palestinos da sua terra natal ancestral é, de fato, definição de “limpeza étnica”.
Para Salam Fayyad, o primeiro-ministro do governo da Autoridade Palestina apoiado pelos EUA, as novas regras contradizem a legislação internacional e as decisões do Conselho de Segurança da ONU, que condenam as deportações forçadas. “É claro que, com essas medidas, Israel tenta aprofundar o peso da ocupação na Cisjordânia e facilitar o processo de roubo de propriedades de palestinos.”
Saeb Ereikat, da Autoridade Palestina, avaliou o movimento israelense como “assalto aos palestinos comuns e afronta aos princípios fundamentais dos direitos humanos. Os palestinos estão sendo condenados como criminosos, sem qualquer julgamento, em sua própria terra.”
Mahmoud Abbas, o cada vez mais reticente presidente da Autoridade Palestina, ainda não se manifestou, optando, claramente, por encaminhar a discussão pelos canais diplomáticos, para discussão na comunidade internacional.
O governo Obama e a União Europeia tampouco se manifestaram, até agora, ante essa nova provocação dos israelenses na Cisjordânia.
Porta-voz do governo jordaniano disse essa semana que Israel havia garantido à Jordânia que as novas regras não seriam implementadas. Mas, até agora, não houve confirmação dessa declaração, nem por Israel nem pela Autoridade Palestina.
Amr Moussa, secretário-geral da Liga Árabe também condenou as medidas dos israelenses. Para ele, “é difícil fazer a paz nessa região, por causa do comportamento dos israelenses. Rejeitamos essas medidas e conclamaremos a comunidade internacional, para que assuma sua parcela de responsabilidade.” Moussa disse também que a Liga Árabe vai reunir-se para discutir a situação.
Mês passado, a Liga Árabe reuniu-se em Sirte, na Líbia, em reunião para discutir a causa palestina e as repetidas provocações dos israelenses, incluindo a judeicização de Jerusalém Leste e a continuada expansão das colônias exclusivas para judeus nos territórios ocupados. Mas o resultado daquele encontro foi considerado medíocre e inefetivo, dado que vários aliados dos EUA na Região pressionaram os participantes para que apoiassem resoluções fracas, que, na prática, permitirão, no máximo, que prossiga o “processo de paz” que os EUA estão patrocinando.
A nova medida repressiva dos israelenses, que, para muitos ativistas de direitos humanos implica uma declaração de guerra contra a demografia palestina, também foi denunciada por dez grupos israelenses de direitos civis e humanos, que têm exigido que o ministro da Defesa Ehud Barak suspenda as novas regras.
Os grupos têm argumentado que as novas ordens militares são tão vagas e sem precisão, que virtualmente todos os habitantes da Cisjordânia passam a viver sob ameaça de deportação. Para os militantes, as regras militares não definem medidas jurídicas para contestar as ordens de deportação.
A nova onda de limpeza étnica contra os palestinos na Cisjordânia coincide com as solenidades do aniversário do holocausto em Israel, ritual anual que visa a despertar a simpatia mundial e, sobretudo, afastar os olhos da comunidade internacional, de outros crimes contra os palestinos, como, dentre outros, o brutal massacre dos palestinos da Faixa de Gaza.
Críticos das novas medidas dos israelenses comparam a atitude do governo de Israel contra os palestinos, inclusive a nova política de deportação, com a política do “lebensraum” (em alemão, “espaço para viver”) dos nazistas alemães – doutrina dominante na Alemanha, no início do século 20, segundo a qual a Alemanha precisaria de mais terra para poder crescer, sobretudo em direção ao leste.
A política da Lebensraum foi uma das principais motivações da agressão territorial dos nazistas alemães contra países vizinhos, depois de 1937. Israel cada vez mais frequentemente refere-se à Cisjordânia, que o exército israelense ocupou em 1967, como Eretz Yisrael (terra de Israel). Às vezes, o mesmo termo é aplicado também à Jordânia, que alguns líderes judeus chamam de “a terra leste de Israel”.
O artigo original, em inglês pode ser lido em:
http://weekly.ahram.org.eg/2010/994/fr1.htm