A defesa dos Direitos Humanos está acima das fronteiras políticas e ideológicas. Coloca-se para além das bandeiras e hinos nacionais. Desconhece as diferenças entre raças e culturas e está acima da religião, do sexo ou da cor da pele. A integridade física e psicológica de uma pessoa, a liberdade de opinião e expressão, o mínimo vital para a sobrevivência são coisas que devem ser preservada a qualquer custo. O respeito aos direitos primordiais da pessoa humana representa, simultaneamente, uma herança dos regimes democráticos e uma exigência ética dos princípios evangélicos e de várias outras opções religiosas.
A greve de fome, por outro lado, constitui não raro o último recurso contra a ordem estabelecida. Tem uma história longa de resistência e teimosia. Muitos exemplos poderiam ser enumerados, inclusive o do então metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva. O mais recente na memória do povo brasileiro, sem dúvida, é o de Dom Frei Luiz Flávio Cappio, bispo de Barra - BA, em sua luta contra a transposição das águas do Rio São Francisco. Constituem formas extremadas de opositores que não dispõem de outras armas para lutar.
Confundir estes atos solitários e heróicos com as ações violentas do crime organizado é algo inaceitável, para dizer o mínimo. A privação livre do alimento enquanto forma de oposição a formas ou decisões totalitárias de governo, desde um ponto de vista moral, não tem base de comparação com o comércio de drogas, os assaltos à mão armada, o latrocínio e outros crimes do gênero. A greve de fome ou a greve em suas variadas conotações carrega um anseio de transformação social, política, econômica ou cultural. De alguma forma, está alicerçada num sonho de justiça e paz. Já o crime, embora possa ter motivações de natureza sócio-política, como a pobreza e a miséria, entre outras, traz sempre a marca de uma violência que tende a estender-se em cadeia espiral.
Só para recordar, os combatentes do regime stalinista ou nazi-fascista, bem como os opositores das ditaduras militares latino-americanas, deixam na história pegadas vivas na luta pela defesa dos direitos humanos. Desnecessário aqui citar nomes, eles estão à flor da memória. O mesmo não se pode afirmar dos chefes do crime organizado em nível mundial. Sua passagem deixa como pegadas nefastas a destruição de vidas, de famílias e às vezes de populações inteiras. Uma coisa é opor-se a qualquer tipo de totalitarismo: religioso, político, econômico ou cultural. Bem outra é o tráfico de drogas, armas, seres humanos ou órgãos para transplante.
Em síntese, ditadura é sempre ditadura, resistência é sempre resistência. Podemos questionar o grau, as motivações, as formas e as estratégias de luta. Mas nunca criminalizar os movimentos de oposição que procuram a defesa, a conquista ou a garantia dos direitos humanos. Menos ainda ressuscitar o espectro da ideologia de segurança nacional, isto é, comparar as lutas sócio-políticas a atos de delinqüência comum.
* Assessor das Pastorais Sociais.
(Envolverde/Adital)