Monika Kalra Varma, diretora do Centro RFK, disse à IPS que “ao longo dos anos, o Haiti foi moldado por promessas quebradas. Os doadores violam suas obrigações em matéria de direitos humanos quando prometem e não cumprem com a entrega de fundos ao país para atender as necessidades da população, especialmente quando se trata de água, educação e saúde”, afirmou. Alguns especialistas em desenvolvimento, que trabalharam no Haiti durante anos e conversaram com a IPS, pediram para não serem identificados por terem familiares e amigos participando dos esforços de socorro.
“Centenas de milhões de dólares em ajuda para o desenvolvimento foram parar nas elites do Haiti (governantes, empresários e militares) à custa das pessoas comuns”, denunciou uma fonte. “Essas elites abusaram da ajuda internacional e nada fizeram para criar um sistema de educação, de saúde pública ou infraestrutura significativa”, acrescentou. A política racial também teve um papel importante na história desse país caribenho. As elites haitianas “tendem a ter a pele mais clara do que a vasta maioria dos haitianos”, disse a fonte.
Em certo momento da história, o Haiti se dividiu em seções separadas para cidadãos de pele escura e pele clara. Em 1806, o norte do país estava controlado por negros e o sul por mulatos. Isso foi apenas cinco anos depois que o ex-escravo, Toussaint Louverture, se transformou em líder guerrilheiro e derrubou o governo francês, abolindo a escravidão e se proclamando governador geral de um governo autônomo. Por várias décadas, o Haiti foi obrigado a pagar enormes compensações aos antigos donos de escravos.
Robert Maguire, professor do Trinity College de Washington e especialista em assuntos haitianos, disse à IPS que a história da ajuda ao Haiti é uma complexa combinação de corrupção das elites governamental e empresarial com os interesses do setor privado internacional, que via o Haiti como “um país com ditadura estável e baixos salários”, muito útil para fabricar produtos têxteis a baixo custo.
Maguire, assessor do Instituto da Paz dos Estados Unidos, propõe formar um corpo de serviço cívico integrado pelos jovens haitianos sãos que estão acampados em Porto Príncipe e arredores. “Poderiam começar pelo centro da capital, mas também plantar árvores, trabalhar a terra e prestar serviços no interior”, sugeriu.
O jornalista Eric Michael Johnson escreveu no jornal eletrônico The Huffington Post (www.huffingtonpost.com) que o “Haiti tem uma histórica e insana dependência do comércio e do financiamento externo, desde tempos coloniais do cultivo de cana-de-açúcar até os tempos atuais de ajuda dos países industrializados”. Agora, “os mesmos políticos e as elites financeiras que ajudaram a criar este caos propõem um programa ainda maior com a mesma orientação”, disse Johnson. O jornalista recordou que “desde 2004, as exportações do Haiti para os Estados Unidos aumentaram 32% e no mesmo período o salário mínimo caiu 36%.
Kalra Varma disse que “com muita frequência, a ajuda demora a chegar, é descoordenada e planejada sem consultar as pessoas mais afetadas. Agora temos a oportunidade de romper com esse passado e fazer com que a ajuda seja oferecida de maneira a garantir o direito fundamental dos haitianos aos alimentos, à água e à saúde”, ressaltou.
Loune Viaud, diretor de planejamento e operações estratégicas da organização Zanmi Lasante, advertiu que “a única maneira de evitar uma escalada desta crise é a ajuda internacional adotar uma visão de longo prazo e se esforçar por construir um Haiti mais forte, com um governo que possa garantir os direitos humanos básicos de todos os haitianos e uma nação com poder para exigir esses direitos”.
Os grupos citaram esforços de socorro do passado que foram descoordenados, imprevisíveis e sem participação comunitária, causando maior sofrimento ainda. Por isso, pediram à comunidade internacional que aproveite esta oportunidade para promover os direitos humanos e a sustentabilidade neste assolado país do Caribe. IPS/Envolverde