A cruz contra a espada

Oslo, dezembro/2009 – “A paz do coração e da mente e a paz da sociedade estão intrinsecamente ligadas. A paz e a justiça são inseparáveis, como também o são a verdade e a conciliação. A paz é necessária para que os famintos sejam alimentados, para que os pobres sejam ajudados, para que os doentes sejam curados, para que os oprimidos sejam libertados e para que os marginalizados tenham voz. A paz é a proteção contra a violência e se experimenta ao fazer com que as guerras e os conflitos armados se transformem a favor do desenvolvimento e da construção de uma nação.”

Essas palavras constam do preâmbulo da Declaração de Lille sobre a Cultura da Paz. emitida pelo Conselho Europeu de Líderes Religiosos e Religiões para a Paz, em maio desse ano. Este órgão reúne destacados líderes religiosos de toda a Europa, tanto cristãos quanto muçulmanos, judeus, hindus, budistas, siks e zoroástricos, que reconhecem a profunda relação entre a cultura, a paz e a religião, bem como entre o bem-estar físico, mental e espiritual, e a coesão e as harmoniosas relações no âmbito da sociedade.

Durante quase 40 anos tive o privilégio de participar de esforços em favor de processos de paz e reconciliação ao redor do planeta: da Guatemala e Namíbia a Kosovo, Sri Lanka e Timor Leste. As culturas, os idiomas e as tradições destes países variam tremendamente. Cada um tem suas belezas particulares e seus desafios específicos. Porém, em cada uma das nações que sofrem conflitos, ficou comprovada a importância da religião, seja para bem como para mal.

Raramente podemos falar de guerras de religião, mas frequentemente vemos que a religião é usada para dar legitimidade aos que promovem a intolerância e a violência. Por outro lado, também vemos com frequência como comunidades religiosas jogam-se valorosamente pela paz e a não violência, bem como religiosos que estendem suas mãos para os que estão do lado oposto dizendo que sua religião impõe construir pontes e derrubar muros.

Na Bósnia-Herzegovina, os líderes das quatro maiores comunidades religiosas se reúnem regularmente e buscam caminhos para aprofundar sua cooperação. No Sri Lanka, monges budistas juntam as mãos com sacerdotes hindus, bispos cristãos e líderes muçulmanos para encarar a situação dos refugiados internos devido à guerra no norte do país.

Com demasiada frequência, as memórias individuais e coletivas são causa de conflitos. Muito pode ser alcançado, não exatamente esquecendo fatos do passado, mas recordando-os de modo diferente. Uma questão crucial em muitos enfrentamentos é como reconciliar nossas memórias. As religiões proporcionam as palavras para isso: perdão, reconciliação, conversão.

Historicamente, muitas partes da Europa são dominadas pela agricultura. Frequentemente, as fazendas são propriedades de uma família durante muitas gerações. Diz-se comumente que o sucesso de um agricultor ocorre quando passa a propriedade para a geração seguinte com alguma melhoria. Toda terra deve ser cultivada e melhorada. Os métodos agrícolas devem ser adaptados às mudanças na sociedade e às novas tecnologias. Entretanto, apesar das mudanças e das melhorias, a fazenda continua sendo a mesma, embora as novas gerações tenham um ponto de partida melhor do que o de seus pais.

As tradições religiosas atuam do mesmo modo. Devem ser cultivadas. É preciso nutrir tudo que produz bons frutos e eliminar o que prejudica uma boa colheita. E, se alguém tenta aproveitar-se das tradições religiosas para promover seus próprios objetivos, para incitar o ódio, a intolerância ou a violência, devemos confrontá-lo energicamente e proteger o que nos foi confiado.

As religiões e as culturas estão sempre em movimento. São dinâmicas, embora às vezes mudem lentamente. A cultura da paz, portanto, não é algo estável e harmonioso que pode ser alcançado em um momento futuro, mas um processo constante de moldagem e reforma das identidades culturais.

Os conflitos, às vezes, são necessários e a reconciliação sempre tem um custo. O papel das religiões na promoção da cultura da paz não é o de remover os conflitos, mas o de ajudar a transformá-los para que possamos avançar em nossa busca pela paz, a verdade e a justiça. Também nos ajudam a cicatrizar as feridas em nossas memórias e a enfrentar o futuro com uma esperança arraigada em algo que vai além de nossa própria experiência.

A cultura da paz pode ser promovida por um diálogo paciente, caracterizado pela sinceridade sobre nossa própria fé e uma respeitosa abertura para as tradições sacras “do outro”. Para mim, as palavras e os caminhos de Jesus nunca podem ser ofuscados, devendo ficar transparentes em meus encontros com aqueles cujas mais preciosas fontes de sabedoria provêm da uma crença diferente.

Para que a cultura da paz se arraigue, é necessária uma ação comum entre diferentes grupos em uma linguagem acessível e marcada por valores compartilhados e um espírito de serviço e de solidariedade. Os atos de piedade e justiça dizem mais do que as palavras sobre nossa espiritualidade. Esta é a essência das palavras de Jesus. Benditos sejam os pacificadores. Envolverde/IPS

(*) Gunnar Stalsett é bispo luterano e moderador do Conselho Europeu de Líderes Religiosos.

(IPS/Envolverde)
publicidade
publicidade
Crochelandia

Blogs dos Colunistas

-
Ana
Kaye
Rio de Janeiro
-
Andrei
Bastos
Rio de Janeiro - RJ
-
Carolina
Faria
São Paulo - SP
-
Celso
Lungaretti
São Paulo - SP
-
Cristiane
Visentin

Nova Iorque - USA
-
Daniele
Rodrigues

Macaé - RJ
-
Denise
Dalmacchio
Vila Velha - ES
-
Doroty
Dimolitsas
Sena Madureira - AC
-
Eduardo
Ritter

Porto Alegre - RS
.
Elisio
Peixoto

São Caetano do Sul - SP
.
Francisco
Castro

Barueri - SP
.
Jaqueline
Serávia

Rio das Ostras - RJ
.
Jorge
Hori
São Paulo - SP
.
Jorge
Hessen
Brasília - DF
.
José
Milbs
Macaé - RJ
.
Lourdes
Limeira

João Pessoa - PB
.
Luiz Zatar
Tabajara

Niterói - RJ
.
Marcelo
Sguassabia

Campinas - SP
.
Marta
Peres

Minas Gerais
.
Miriam
Zelikowski

São Paulo - SP
.
Monica
Braga

Macaé - RJ
roney
Roney
Moraes

Cachoeiro - ES
roney
Sandra
Almeida

Cacoal - RO
roney
Soninha
Porto

Cruz Alta - RS