Estados fumam impostos sobre tabaco

A publicidade de tabaco e a liberdade de fumar até em hospitais e escolas continuam vigentes na maioria dos países da região.

México, 2 de junho (Terramérica) - Os fundos governamentais para combater o tabagismo na América Latina, que mata por ano um milhão de pessoas, somem diante dos custos sanitários desta epidemia e recebem uma pequena parte da arrecadação fiscal da indústria do tabaco. A maioria dos países da região viola seus compromissos de proibir a publicidade e até de vetar o hábito em hospitais e escolas. Eliminar a publicidade e impor fortes cargas fiscais à indústria são as melhores formas de reduzir o consumo, recomenda a Organização Mundial da Saúde (OMS) em seu Informe sobre a Epidemia Mundial de Tabaco 2008. Com base em dados fornecidos por mais de 150 países, o documento indica que a arrecadação fiscal com a venda de tabaco e seus derivados no mundo superam em 500 vezes os gastos em programas de luta contra o vício, causador de doenças mortais. Estudos obtidos por correspondentes do Terramérica e estatísticas da OMS indicam que Brasil e Venezuela têm os orçamentos nacionais mais altos para o controle do tabaco, com cerca de US$ 4,6 milhões anuais cada um, enquanto o menor corresponde ao Paraguai, com apenas US$ 33.830. A Venezuela arrecada com impostos sobre cigarro US$ 634 milhões por ano e o Brasil cerca de US$ 1,1 bilhão. No caso do Paraguai, esse item é de US$ 12 milhões. No Chile, um dos líderes latino-americanos em controles e proibições do consumo, o orçamento para combater o tabagismo gira em torno de US$ 1 milhão, enquanto o fisco recebe US$ 1,170 bilhão em impostos do setor e as conseqüências sanitárias custam ao Estado US$ 1,140 bilhão ao ano.

Na equipe dos mais permissivos, a Argentina arrecada US$ 1,450 bilhão, cerca de US$ 550 milhões a mais do que o destinado ao seu programa de controle do tabagismo. Ao contrário de seus vizinhos, esse país ainda não tem uma lei nacional na matéria, enquanto os danos à saúde dos habitantes causam gastos de US$ 2,2 bilhões. Mario Virgolini, coordenador do Programa Nacional de Controle do Tabaco do Ministério da Saúde da Argentina, disse ao Terramérica que a diferença entre o que se arrecada e o que se gasta para enfrentar os efeitos prejudiciais do tabaco "marca claramente que é mais caro à sociedade atender a doença do que evitar o consumo. O maior custo, que não tem preço, é o das 40 mil mortes por ano causadas pelo tabaco" nesse país, afirmou.

O Uruguai foi reconhecido pela OMS como primeiro país das Américas e terceiro do mundo a instaurar, em 2006, uma proibição de fumar em locais fechados e áreas de trabalho, sem exceções. Para Luz Reynales, chefe do Departamento de Pesquisa sobre Tabaco do Instituto Nacional de Saúde Pública do México, os países deveriam ser "mais fortes" em matéria fiscal em relação à indústria do tabaco. "São necessárias taxas mais altas para obter recursos suficientes para atacar a epidemia", disse Reynales ao Terramérica. O México obtém dos impostos sobre tabaco US$ 2 bilhões ao ano, mas gasta US$ 3 bilhões em programas de prevenção e para atender os doentes. O imposto como porcentagem do preço de venda dos cigarros varia na região entre 70%, aplicados no Uruguai e na Venezuela, e 2% em São Vicente e Granadinas.

A OMS calcula que um aumento adicional de 10% nos preços pode fazer baixar o consumo em 4%. Se esse aumento chegasse a 70% evitaria um quarto dos 5,4 milhões de mortes anuais associadas ao vício de fumar no mundo. Grande parte dos países da América Latina ratificou o Convênio Marco da OMS para o Controle do Tabaco, em vigor desde fevereiro de 2005. Esse instrumento proíbe a publicidade e o patrocínio de marcas de cigarros em qualquer tipo de atividade, além de desestimular a interferência da indústria em políticas de saúde pública, proibir o contato das fábricas com os jovens e estabelecer espaços públicos livres de fumo.

Porém, o Informe 2008 da OMS dá conta de que no continente americano há um mercado que não cumpre as normas. Dos 35 países da região analisados pela organização, apenas nove proíbem a publicidade de tabaco no rádio e na televisão aberta e apenas três (Brasil, Bahamas e Chile) nos jornais e revistas nacionais. O estudo não considera o fato de o Uruguai ter adotado em março a proibição de publicidade nos meios de comunicação, menos na Internet. Nos portais locais da Internet a publicidade é proibida no Brasil e no Chile, enquanto a colocação de outdoors é proibida no Brasil, Canadá, Bahamas, Chile, Uruguai e Venezuela.

Com exceção de Brasil, Canadá, Bahamas, Chile, Guatemala, Uruguai e Venezuela, nos demais países é permitida a distribuição de publicidade pelo correio e outros meios. Apenas Chile e Uruguai impedem que apareçam imagens referentes a marcas de cigarro em programas de televisão e cinema. Somente no Brasil, Bahamas, Canadá, Chile e Uruguai se proíbe os fabricantes de patrocinarem acontecimentos públicos. A liberdade de fumar em hospitais e escolas vigora em 21 países, enquanto em 26 não há regulamentações contra esse hábito para o caso das edifícios públicos.

O Sistema Pan-Americano de Informação Online sobre Tabaco, da Organização Pan-Americana da Saúde, indica que a indústria mantém a prática de oferecer cigarros grátis aos estudantes. Em 2003, quase 11% dos jovens argentinos reconheceram ter recebido cigarros dessa forma. No Chile, a porcentagem foi de 8,6 e no Equador de 11% em 2001, diz o Sistema. No México, 10% dos jovens relataram a distribuição gratuita durante 2005, e no Brasil foram 7,8%, em 2006.


* Com as colaborações de Daniela Estrada (Chile), Humberto Márquez (Venezuela) e Marcela Valente (Argentina).
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