Arroz-Ásia: Uma crise anunciada

Bancoc, 29/04/2008 – Os alarmantes informes da imprensa internacional sobre a escassez mundial de alimentos não surpreendem os especialistas da ONG Rede de Ação contra os Pesticidas, que trabalha com comunidades agrícolas da Ásia. A organização, conhecida pela sigla em inglês PAN, advertiu durante anos sobre uma iminente escassez de arroz. No entanto, o alerta foi ignorado pelos governos desta região, que abriga nove dos 10 maiores produtores mundiais desse grão: Bangladesh Birmânia, China, Filipinas, Índia, Indonésia, Japão, Tailândia e Vietnã. O único membro não asiático desta liga é o Brasil.


"Durante os últimos cinco anos dissemos que enfrentávamos uma crise na produção de arroz, que a soberania e a segurança alimentar eram deblitadas", disse à IPS Clare Westwood, coordenadora da campanha Salvemos Nosso Arroz, lançada pelo PAN em 2004. "Era apenas uma questão de tempo as advertências se transformarem em realidade", acrescentou Westwood. A organização centrava sua preocupação no impulso à produção em escala industrial, que incluía a promoção da monocultura. As variedades de arroz que permitem obter elevado rendimento e que necessitam de um grande uso de agroquímicos se mostravam como a resposta para a demanda em aumento.

Esta estratégia marginalizou os pequenos agricultores que através dos séculos utilizaram os conhecimentos locais em suas pequenas comunidades rurais para desenvolver novas variedades de semente de arroz que se adaptavam ao ambiente. "As variedades de alto rendimento não são tão resistentes com as utilizadas na produção tradicional orgânica. O arroz híbrido só tem um bom desempenho sob determinadas condições. Requer o uso intenso de fertilizantes e pesticidas, bem como maior quantidade de água. Essas são suas debilidades congênitas", disse Westwood.

Um estudo da Comissão Econômica e Social das Nações Unidas para a Ásia e o Pacífico (Escap) destaca que 70% dos pobres da região residem em áreas rurais, e que seu meio fundamental de subsistência é a agricultura. "O setor agrícola foi descuidado por quase quatro décadas. O problema da escassez e dos aumentos de preços apareceria mais cedo ou mais tarde. Antes os governos proporcionavam muito mais serviços à agricultura", disse Shamika Sirimanne, da Escap.

Essa ajuda incluía fundos para que os produtores aumentassem o rendimento, o fomento à pesquisa e ao desenvolvimento e a otimização da comercialização das colheitas. Os Estados também se ocuparam de melhorar as estradas e encarar projetos de infra-estrutura para elevar a qualidade de vida nas áreas rurais. A tendência se reverteu a partir dos anos 80, disse Sirimanne. "Todos começaram a pensar no crescimento que poderia ser alcançado através do desenvolvimento da indústria e dos serviços e a agricultura foi sendo desatendida", acrescentou.

A agricultura representou 28,7% do produto interno bruto da China no período 198101985, enquanto a indústria contribuiu com 26%, segundo o Banco Mundial. No qüinqüênio 2001-2006, a contribuição do campo caiu para 8,7% e as manufaturas representaram 49,1% do PIB. No mesmo período, na Índia, a participação do setor primário passou de 18,4% para 6,2% do PIB, enquanto na Indonésia caiu de 18,4% para 11,8%, sempre à custa da indústria e dos serviços. Mas, isto não reduziu o número de pobres nas áreas rurais.

"Ainda hoje, 60% da força de trabalho corresponde ao setor agrícola e um grande número desses trabalhadores vive na pobreza. É um dever dos governos começar a reinvestir para aumentar a produtividade", afirmou Sirimanne. O informe final da Avaliação Internacional do Conhecimento, da Ciência e da Tecnologia no Desenvolvimento Agrícola (IAASTD) destacou que se deve ressuscitar as abandonadas pequenas comunidades agrícolas para impulsionar a produção de grãos, incluído o arroz.

Lim Li Ching, a principal autora do capítulo asiático desse estudo global, disse à IPS que agora também está em xeque a chamada "revolução verde', processo de reintrodução de novas tecnologias em muitos países em desenvolvimento entre os anos 40 e 60, que permitiram obter um grande aumento na produção agrícola. "O custo social e ambiental da revolução verde na região não pode ser ignorado", acrescentou Ching.na Ásia, esse processo foi impulsionado pelos Instituto Internacional de Pesquisa do Arroz (IRRI), com sede nas Filipinas. Introduziu as variedades de alto rendimento para atender a crescente demanda e, no processo, alterou profundamente a estrutura do cultivo de arroz na Ásia. Entre 1968 e 1981, a produção aumentou 42%. Mas agora o IRRI admite que a monocultura teve seu custo. "Estamos conscientes do dano ambiental. Nesse momento não havia movimentos ecológicos. Apenas se pensava em alimentar as pessoas", disse à IPS o porta-voz do instituto, Duncan Macintosh. IPS/Envolverde


(Envolverde/IPS)

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