Genebra, março/2008 – A economia mundial teve nos últimos cinco anos uma extraordinária expansão e as indústrias criativas estão na vanguarda deste crescimento. Estas indústrias – que incluem a produção e distribuição de bens e serviços que usam capital intelectual como principal componente – estão no cruzamento das artes, da cultura, dos negócios e da tecnologia.
As indústrias criativas implicam a interação de setores
tradicionais que fazem uso intensivo da tecnologia e estão voltadas para os
serviços: desde a arte folclórica, dos festivais, livros, pinturas e das artes
da interpretação ate à indústria cinematográfica, da radiodifusão, animação
digital e videojogos, bem como a campos mais voltados para os serviços, como os
serviços arquitetônicos e de publicidade. Todas estas atividades utilizam
amplamente habilidades criativas e podem gerar lucro através do comércio e dos
direitos de propriedade intelectual. (DPI).
Nas nações mais adiantadas a
economia criativa é um componente principal do crescimento econômico, do emprego
e do comércio. Um estudo recente mostra que na Europa cresce 12% mais rápido do
que a economia em geral. Uma pesquisa da Conferência das Nações Unidas sobre
Comércio e Desenvolvimento (Unctad) mostra que as indústrias criativas estão
entre os setores emergentes mais dinâmicos no comércio mundial. Durante o
período 2000-2005, o comércio de bens e serviços criativos aumento à média anual
sem precedentes de 8,7%. As exportações mundiais de produtos criativos chegaram
a US$ 445,2 bilhões em 2005, enquanto em 1996 era de US$ 234,8
bilhões.
Os países desenvolvidos dominam neste mercado. Mas, muitas
nações em desenvolvimento estão se beneficiando pelo auge das indústrias
criativas, já que suas exportações aumentaram enormemente, passando de US$ 55,9
bilhões em 1995 para US$ 136,2 bilhões em 2005. Este aumento é atribuído
principalmente à China, que se converteu no primeiro exportador mundial de bens
criativos em 2005. Alguns desses bens gozam de crescente popularidade nos
mercados mundiais e entre eles estão filmes e softwares da Índia, a produção
televisiva mexicana e os produtos de animação digital da Coréia do Sul.
O
desenho – e o artesanato – são os bens criativos dos países em desenvolvimento
mais competitivos nos mercados mundiais. No total, entre 1996 e 2005 as
exportações mundiais de audiovisuais triplicaram e as de artes visuais
duplicaram. A parte do leão nos lucros obtidos com produção criativa fica parra
os direitos de propriedade intelectual, as licenças e a mercadotecnia e
distribuição. Infelizmente, para os países em desenvolvimento a maioria deste
dinheiro vai para grandes empresas estrangeiras. Por exemplo, os artistas e
produtores jamaicanos de reggae receberam apenas 25% da renda mundial obtida por
suas gravações.
Esta particular quantia deve ter mudado desde então
devido aos acontecimentos revolucionários nos novos meios de comunicação e pelo
uso da Internet. O problema subjacente, entretanto, provavelmente não seja
alterado substancialmente. Portanto, são necessárias soluções inovadoras para
corrigir essas distorções sistêmicas dos mercados. Por exemplo, reforçar as
políticas da competição, abordar o problema das lacunas no atual regime dos DPI
e desenvolver entidades arrecadadoras eficientes.
A maioria dos países em
desenvolvimento ainda não é capaz de aproveitar suas capacidades criativas para
estimular o desenvolvimento. Na África, por exemplo, embora haja abundância de
talentos, seu potencial continua subutilizado. A parte do continente no comércio
global continua sendo muito marginal, menos de 1%, apesar dos acentuados
aumentos recentes. O caso é o mesmo para outras regiões em desenvolvimento, como
reflexo tanto de debilidades nas políticas domésticas quanto nas tendências
sistêmicas globais.
Em nível doméstico, os países em desenvolvimento, em
geral, terão de melhorar a qualidade em toda a cadeia produtiva de valores,
estabelecer mecanismos institucionais e financeiros para apoiar artistas e
criadores independentes e atrair investimentos para facilitar a formação de
empresas conjuntas e as co-produções. A associação entre os setores público e
privado necessitará ser promovida; é necessário melhorar as políticas da
competição e também redobrar a consciência no campo dos DPI. Devem, ainda, ser
criadas oportunidades para o acesso a tecnologias avançadas e para incrementar o
uso de novos modelos comerciais e informações, bem como de ferramentas para
dominar as tecnologias da comunicação para alcançar novos mercados, incluindo o
comércio Sul-Sul.
Também há restrições em nível internacional,
relacionadas com o acesso aos mercados e às práticas comerciais não competitivas
que surgem na estrutura oligopólica do mercado, especialmente, nas indústrias
audiovisual e digital. A concentração de canais de mercadotecnia e de redes de
distribuição em uns poucos importantes mercados; o acesso limitado ao crédito
regional e multilateral e a exclusão tecnológica se combinam para por em perigo
a competitividade das indústrias criativas das nações em
desenvolvimento.
Mas, não há dúvidas sobre o potencial que têm estas
indústrias nos países em desenvolvimento e seria uma lástima não utilizá-lo. O
fato de esta indústria ser conhecida tanto pela criatividade quanto pelo capital
as torna particularmente adequadas para países que são ricos em herança cultural
e talento criativo, mesmo se sofrerem falta de mão-de-obra especializada,
infra-estrutura básica e investimentos estrangeiros diretos. É hora de ajudar as
nações em desenvolvimento para que aproveitem ao máximo estas novas
oportunidades. (IPS/Envolverde)
* Supachai Panitchpakdi,
secretário-geral da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e
Desenvolvimento (Unctad).
(Envolverde/IPS)