Pequim, 18/03/2008 – As Olimpíadas de agosto na capital da China, uma das cidades mais secas do mundo, supõem um enorme desafio para os organizadores, que se esforçam para garantir um fornecimento de água adequado. Os planos para trazer água até Pequim desde províncias vizinhas podem fracassar porque as autoridades locais resistem às pressões para compartilhar o recurso e evitar uma crise na sede dos Jogos Olímpicos. A sede desta cidade é um assunto acalorado na atual sessão anual do Congresso Nacional do Povo (parlamento), que começou no último dia 5 e vai até o próximo dia 18.
"Não se trata de não
querermos dar água a Pequim, é que não há água suficiente para compartilhar',
disse à margem do plenário Zhang Fuming, delegado da província de Xhanxi. Esta,
junto com Hebei, são as duas províncias à quais as autoridades pequinesas
recorreram para compartilhar o peso de organiza os Jogos Olímpicos. Prevê-se que
o consumo de água chegará a 2,7 milhões de metros cúbicos por dia. Mas as duas
províncias, que ficam curso acima do rio Yongdinghe, o principal sistema hídrico
de Pequim, têm problemas para atender sua própria demanda.
Hebei, por
exemplo sofre freqüentes secas desde 1999, mas mesmo assim os líderes locais
fixaram como objetivo o cultivo de um arroz hibrido que requer muita água.
Shanxi, conhecida como a mina de carvão da China, esgotou seus recursos hídricos
com o excessivo desenvolvimento da mineração e com a extração de águas
subterrâneas, em grande parte contaminada, que não pode ser utilizada nem para a
indústria nem para a irrigação. "Levará anos recuperar a água e sua qualidade na
província", disse Zhang, que trabalha como pesquisador para o governo
local.
Todo o norte da China está na mesma situação porque as chuvas são
escassas e a terra é árida. Inclusive a capital está assolada pelo avanço do
deserto de Gobi. A quantidade de água por habitante para os 1,3 bilhão de
chineses é inferior a um terço da media mundial, mas em Pequim, e nas 130
cidades do país, é inferior a media nacional. De fato, a escassez do recurso na
cidade é tão séria que muitos moradores chegaram a sugerir em um debate público
mudar a capital para outro lugar por causa da falta de água potável.
Os
recursos cada vez mais limitados da capital não impediram os organizadores dos
Jogos Olímpicos de projetar e construir novos parques e vastos campos de golfe.
A seca Pequim tem agora mais de 30 campos de golfe e cada um consome cerca de
três mil metros cúbicos de água por dia. Para atender a demanda da cidade os
urbanistas chineses investiram em enormes projetos de infra-estrutura para levar
água desde os principais rios do país, o Yangtze e o Amarelo. O plano mais
ambicioso, desvio de água de sul a norte, prevê fornecer um bilhão de toneladas
de água por ano a Pequim, bombeadas desde o rio Yangtze por um canal de 1.277
quilômetros.
O custo total do projeto é estimado em mais de US$ 60
bilhões, mais que o dobro do custo da represa Três Gargantas, oficialmente de
US$ 28 bilhões. O projeto prevê a construção de três canais no leste, no centro
e oeste do país, por onde fluirá a água, de sul a norte, ao longo de centenas de
quilômetros, para irrigar as áridas planícies setentrionais e levar o recurso
até Pequim. As primeiras etapas do plano estarão concluídas para o início das
Olimpíadas, mas o restante poderá demorar anos para ser
concluído.
Engenheiros chineses começaram em janeiro o desvio de água
desde o rio Amarelo para aumentar o recurso na capital com vistas ao grande
acontecimento esportivo de agosto. Mais de 150 milhões de metros cúbicos
percorrerão 400 quilômetros até o lago Baiyangdian, ao sul da capital, nos
próximos três meses. Por outro lado, os urbanistas iniciaram um programa
exigindo que as províncias vizinhas de Pequim compartilham a água para garantir
um progresso sem conflitos até os Jogos Olímpicos. O plano prevê um pagamento
não especificado pela água, mas os delegados ao parlamento afirmam que isso será
difícil se ser implementado.
"Sem ordens administrativas, as transações
de água serão virtualmente impossíveis', disse Cao Dazheng, especialista e
delegado da cidade de Tianjin, em um grupo de discussão. "Não há uma divisão
clara dos direitos sobre a água entre as localidades. E mais, há vários
interesses industriais conferidos a esses recursos devido à produção local de
carvão", explicou. As autoridades de Hebei se comprometeram a fornecer água para
os Jogos Olímpicos, mas reclamaram compensações por parte de Pequim por priva a
província do precioso recurso que poderia ser destinado ao desenvolvimento de
indústrias lucrativas no âmbito local, segundo a imprensa.
Mas, além dos
Jogos Olímpicos, o fornecimento futuro de água a Pequim continua incerto. A
crise hídrica que assola o norte da China, porque as cidades sedentas esvaziaram
os aqüíferos, foi agravada pela contaminação que se estendeu a mais da metade
dos cursos de água do país. Um em cada quatro chineses, cerca de 300 milhões de
pessoas, não tem acesso à água potável, de acordo com estatísticas oficiais.
(IPS/Envolverde)
(Envolverde/IPS)