Eis algumas impressionantes referências à Síria, na imprensa-empresa dos EUA. Para começar da RAND Corporation, o think-tank do Pentágono, sobre “Futuros Alternativos para a Síria”.
Dentre as “Descobertas Chaves”:
O colapso do regime [sírio], que não se considera como resultado provável, parece ser o pior resultado possível, para os interesses estratégicos dos EUA.
...
É a vitória do regime que agora aparece como resultado de mais alta probabilidade em prazo curto e médio, devido à confluência de fatores militares e políticos que favorecem as forças pró-Assad.
Um repórter da Associated Press visita a área de Latakia e conversa com o povo que se mantém inabalavelmente a favor do governo sírio. A manchete diz: “Os alawitas da Síria pagam pesado preço e enterram os filhos”.
A matéria registra um fato que é fato desde o início dos combates na Síria:
O exército sírio é composto por maioria de muçulmanos sunitas, lutando contra muçulmanos sunitas rebeldes.
É fato que jamais antes apareceu noticiado na imprensa-empresa “ocidental”, que não fez outra coisa além de propaganda pró-sectarismo e mais guerra.
Muro em Tartus, Síria, coberto com fotos dos soldados |
Mais uma observação que não se encaixa no quadro “comum”. Houve algumas manifestações de rua, mas não por que Assad esteja dando combate a insurgentes: os manifestantes exigem que Assad amplie a guerra contra os insurgentes:
Os manifestantes criticam Bashar por mostrar-se fraco demais; prefeririam ter no poder alguém mais linha-dura – disse um trabalhador, que pediu para não ser identificado, porque recebeu ordens para não falar com jornalistas.
Notável! Em quem os EUA confiam para lhe fornecer a melhor inteligência na guerra contra o Estado Islâmico? Só confiam na Síria, é claro. Mas, dado que ainda não se pode falar oficialmente de cooperação entre a Casa Branca e o monstro que governa Damasco... os contatos e informes são noticiados como se fossem ‘'descobertas'’ de espionagem: “Espionagem dos EUA contra a Síria já rendeu bônus”:
Espiões norte-americanos continuam a gravar todas as comunicações do governo do presidente Bashar al-Assad, de onde obtêm informação sobre militantes do Estado Islâmico.
Tenho absoluta certeza de que é mentira, porque nenhum espião norte-americano gravaria qualquer comunicação do governo sírio sobre o Estado Islâmico sem autorização da Síria. (E o Wall Street Journal só publica tal “notícia” porque é falsa. Fosse verdade, não poderia ser publicada sem expor os tais “espiões” [e a gente aki pergunta: e quem, diabos, precisa dessa booooosta de empresa-imprensa?! (NTs)]. Além da autorização para gravar que, com certeza, os EUA pediram à Síria. Mas com certeza os EUA também pediram a mesma autorização à Rússia – ou continuariam sem nada saber sobre o Estado Islâmico.
Lembrança de família do soldado sírio Mahmoud Haidar, |
O plano dos EUA era deixar que alguns de seus “inimigos” – sírios, iranianos, russos – entrassem em confronto direto com outros dos “inimigos” dos EUA – islamistas radicais e, por procuração, também entrassem em confronto com sauditas e qataris. Todos sairiam enfraquecidos, e o papel relativo dos EUA no Oriente Médio sairia reforçado. Mas, com o revide que o Estado Islâmico aplicou ao Iraque, ao Líbano e aplicará no futuro em outros pontos, o plano de deixar que uns inimigos matassem os outros vai-se tornando cada dia mais temerário e arriscado.
O que estamos vendo agora – e a matéria da AP acima, me parece, não é simples coincidência – é que começa uma lenta mudança na posição dos EUA. Os EUA começam a ver com melhores olhos o governo sírio. Até onde avançará essa mudança ainda é uma incógnita.
Minha interpretação, para a carta que o secretário Hagel da Defesa enviou à Casa Branca, é que ele está exigindo estratégia mais clara e mais produtiva, dos EUA, para a Síria. A carta não é, como a Agência Reuters argumenta, pedido para que se envie mais ajuda aos insurgentes. O que Hagel faz é pedir que se reduzam as animosidades contra o governo sírio e que se construa melhor cooperação entre EUA e Assad, para enfrentar o Estado Islâmico.
Essa é também a essência do estudo da RAND Corporation citado acima, que foi encomendado e pago pela casa de Hagel.
Se minha leitura está correta, o melhor que a Casa Branca tem a fazer é seguir o que Hagel planejou.
1/11/2014, Moon of Alabama
“Syria: New Hints Of A Changing U.S. Position”
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu[*]
“Moon of Alabama” é título popular de “Alabama Song” (também conhecida como “Whisky Bar” ou“Moon over Alabama”) dentre outras formas. Essa canção aparece na peça Hauspostille (1927) de Bertolt Brecht, com música de Kurt Weil; e foi novamente usada pelos dois autores, em 1930, na ópera A Ascensão e a Queda da Cidade de Mahoganny. Nessa utilização, aparece cantada pela personagem Jenny e suas colegas putas no primeiro ato. Apesar de a ópera ter sido escrita em alemão, essa canção sempre aparece cantada em inglês. Foi regravada por vários grandes artistas, dentre os quais David Bowie (1978) e The Doors (1967). A seguir podemos ver/ouvir versão em performance de David Johansen com legendas em português.
www.youtube.com/embed/NLMp50iK0G0
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