Revelar segredos de facções poderosas não é uma coisa divertida, mas é a última via para um debate verdadeiro, equilibrado e democracia.
Pelo menos desde Setembro de 2001, os governos ocidentais e agências de inteligência estão trabalhando duro para expandir o escopo de seu próprio poder, enquanto corroem a privacidade, liberdades civis e controle público da política. O que era visto como fantasias conspiratórias paranoicas, orwellianas se mostraram após Snowden, não ser nem a história completa.
O que é realmente notável é que há anos avisávamos que essas coisas estavam acontecendo: vigilância completa de populações inteiras, militarização da internet, o fim da privacidade. Tudo é feito em nome da "segurança nacional", o que se tornou mais ou menos uma ladainha para evitar o debate e garantir que os governos não sejam responsabilizados – que não possam ser responsabilizados – porque tudo é feito no escuro. Leis secretas, interpretações secretas de leis secretas por tribunais secretos e nenhum controle do poder legislativo.
Em geral a mídia deu pouca atenção a isso, mesmo que mais e mais pessoas corajosas e de princípios revelassem segredos. A perseguição sem precedentes daqueles que contam verdades, iniciada pela administração Bush e acelerada severamente pela administração Obama, foi ignorada, enquanto números recordes de pessoas bem intencionadas são acusadas de graves delitos simplesmente por dizerem aos seus concidadãos o que está acontecendo.
É uma das amargas ironias de nosso tempo que enquanto John Kiriakou (ex-CIA) está na prisão por revelar a tortura dos EUA, os torturadores e seus responsáveis estão livres.
Do mesmo modo, a fonte do WikiLeaks Chelsea (previamente Bradley) Manning foi acusada de – entre outros sérios crimes – ajudar o inimigo (leia-se: o público). Manning foi sentenciada a 35 anos de prisão, enquanto as pessoas que planejaram a guerra ilegal e desastrosa do Iraque em 2003 ainda são tratadas como dignitários.
Diversos ex-analistas da NSA vieram a público na década passada, revelando fraude em massa, vastas ilegalidades e abuso de poder na agência citada, incluindo Thomas Drake, William Binney e Kirk Wiebe. A resposta foi 100% perseguição e 0% responsabilização, tanto pela NSA quanto pelo resto do governo. Revelar segredos de facções poderosas não é algo divertido, mas apesar do pobre histórico da mídia ocidental, a divulgação ainda é a última via para um debate verdadeiro e equilibrado defesa da democracia – essa frágil construção que, segundo Winston Churchill, é “o pior tipo de governo, com exceção de todos os outros”.
Desde o verão de 2013, o público tem testemunhado uma mudança no debate sobre esses assuntos. A razão é uma pessoa corajosa: Edward Snowden. Ele não só revelou a série de abusos do governo mas forneceu uma avalanche de documentos comprobatórios para alguns poucos jornalistas confiáveis. Os ecos de suas ações ainda estão sendo ouvidos pelo mundo – e ainda há muitas revelações por vir.
Para cada Daniel Ellsberg, Drake, Binney, Katharine Gun, Manning ou Snowden, há milhares de funcionários públicos que continuam com seu trabalho diário de espionar todo mundo e fornecer informações fabricadas ou mesmo inventadas ao público e ao legislativo, destruindo tudo o que nós como sociedade defendemos.
Alguns deles podem se sentir favoráveis ao que estão fazendo, mas muitos deles são capazes de ouvir sua voz interior sobre a voz de seus líderes e políticos desonestos – e das pessoas cuja comunicação íntima eles estão monitorando.
Escondidos em escritórios de vários departamentos governamentais, agências de inteligência, forças da polícia e forças armadas há dúzias e dúzias de pessoas que estão muito irritadas com aquilo em que nossas sociedades estão se transformando: no mínimo, tiranias completas.
Uma delas é você.
Você está pensando:
- Minar a democracia e corroer liberdades civis não está explicitamente em seu contrato de trabalho.
- Você cresceu em uma sociedade democrática e quer continuar assim
- Você foi ensinado a respeitar o direito das pessoas comuns de viver em privacidade
- Você não quer um sistema de vigilância estratégica institucionalizada que faria a temida Stasi ficar verde de inveja – ou quer?
Então, por que se preocupar? O que uma pessoa pode fazer? Bem, Edward Snowden mostrou justamente o que uma pessoa pode fazer. Ele se sobressai como revelador tanto pela severidade dos crimes como pela má conduta que ele está divulgando ao público – e a enorme quantidade de documentos que ele nos apresentou até agora – ainda há mais. Mas Snowden não deveria ser o único, e suas revelações não deveriam ser as únicas.
Você pode ser parte da solução; forneça a jornalistas confiáveis – tanto da velha mídia (como este jornal) ou da nova mídia (como WikiLeaks) documento que provem que atividades ilegais, imorais ou dispendiosas estão acontecendo no seu trabalho.
HÁ poder na quantidade. Você não será o primeiro – ou o último – a seguir sua consciência e divulgar o que está sendo feito em nossos nomes. A verdade está a caminho – ela não pode ser parada. Políticos desonestos serão responsabilizados. Está em suas mãos estar no lado certo da história e acelerar o processo.
A coragem é contagiosa.
Assinado por:
Peter Kofod, ex-Escudo Humano no Iraque (Dinamarca)
Thomas Drake, ex-analista sênior da NSA (EUA)
Daniel Ellsberg, ex-analista militar (EUA)
Katharine Gun, , ex-GCHQ (Reino Unido)
Jesselyn Radack, ex-Departamento da Justiça (EUA)
Ray McGovern, ex-analista sênior da CIA (EUA)
Coleen Rowley, ex-agente do FBI (EUA)
11/12/2013, Thomas Drake, Daniel Ellsberg, Katharine Gun, Peter Kofod, Ray McGovern, Jesselyn Radack, Coleen Rowley – The Guardian
“Former whistleblowers: open letter to intelligence employees after Snowden”
Traduzido por João Aroldo
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