De um lado, o “Cansei” da OAB. Do outro, o “Cansamos” da CUT. E os cidadãos brasileiros, que carregam o cansaço de décadas e séculos perdidos, onde ficam? Assistindo à briga de cachorro grande, sem se comprometerem, como sempre. Só que, desta vez, com razão.
As vaias ao presidente Lula na abertura do Pan e a tragédia de Congonhas foram superdimensionadas pela direita golpista que viceja na Internet e pela direita engravatada da grande imprensa.
Os panfletos virtuais circularam como nunca e atingiram o grau máximo de radicalização verbal, enquanto os posts nas comunidades de discussão política fervilhavam de indignação.
E na mídia escrita (principalmente) o viés do noticiário e editoriais começou a evocar a informação distorcida e os “chega!”, “basta!” e “fora!” que antecederam o golpe militar de 1964.
No entanto, seria um erro igualar o eternamente conspirador Grupo Guararapes com, p. ex., O Estado de S. Paulo – embora um editorial infeliz do jornalão tenha causado arrepios em quem ainda se lembra do papel por ele desempenhado na última virada de mesa institucional.
A direita radical que jamais engoliu a redemocratização do País e os neo-integralistas por ela formados apostam mesmo todas as fichas numa nova quartelada. As pregações golpistas daí advindas há muito ultrapassaram os limites da legalidade e deveriam ser coibidas, com a imputação penal de quem espalha por toda a Web exortações sediciosas do tipo “militares no poder já!”.
A grande imprensa, no entanto, mais reverbera a insatisfação da classe média e a amplifica. Ou seja, faz média com seu público-alvo e dá uma força para os principais partidos de oposição, o PSDB e o DEM. Pelo menos uma vez o Lula está certo: são apenas os primeiros movimentos da campanha eleitoral de 2010.
Espertamente, entretanto, os petistas estão procurando reaproximar-se dos segmentos da classe média que lutaram a seu lado contra a ditadura e foram se distanciando a partir de 2002, à medida que o partido abandonava suas bandeiras históricas. Utilizam o mal maior – a ameaça de recaída autoritária – como espantalho para tangê-los de volta ao redil.
Então, o posicionamento mais lúcido acaba sendo o do analista político Clóvis Rossi, para quem constitui desonestidade “tentar caracterizar o atual confronto oposição/governo como uma contenda da elite contra o povão”, já que se trata tão-somente da velha disputa elite x elite, cuja demonstração acabada “está dada pelo fato de que a política econômica da elite ora no poder é muito semelhante à da elite antes no poder, hoje na oposição”.
Quem não faz parte da elite nem é dela caudatário, tem todos os motivos para defender a democracia se e quando ela estiver realmente ameaçada, mas nenhum para servir de peão no tabuleiro político em que se confrontam os responsáveis pelo cansaço nacional.
* Celso Lungaretti é jornalista, escritor. Mais artigos em http://celsolungaretti-orebate.blogspot.com/
- Celso Lungaretti (*)
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