No próximo dia 23 serão exumados os restos mortais do ex-presidente chileno Salvador Allende, para que seja definitivamente esclarecido se ele cometeu suicídio ou foi assassinado pelos golpistas que o derrubaram do poder em 1973.
As perícias foram determinadas pelo juiz encarregado do processo, Mario Carroza, que prometeu: "Tudo será revelado ao público, como deve ser".
A versão oficial é de que Allende teria se matado com o fuzil recebido de presente de Fidel Castro.
Sempre considerei mais compatível com o personagem a forma como o cineasta chileno Helvio Soto mostrou seu momento final, no excelente filme Chove sobre Santiago (1976): atirando a esmo nos invasores do Palácio de La Moneda, apenas para morrer lutando ao invés de ser capturado com vida.
Agora saberemos o que realmente aconteceu.
COMPAÑERO PRESIDENTE
Salvador Allende será sempre lembrado como o compañero presidente.
Pois, conforme declarou no momento de sua vitória eleitoral, mais do que presidente, continuaria sendo um militante revolucionário, como todos os seus companheiros de jornada na luta por um Chile com liberdade e justiça social.
Naquele terrível 11 de setembro de 1973, Allende não aceitou curvar-se aos fascistas de Pinochet, preferindo a morte digna à fuga indigna que lhe ofereceram: a possibilidade de decolar para outro país juntamente com todos os correligionários por ele escolhidos que coubessem no avião.
Então, as palavras que endereçou ao povo pelo rádio, na iminência do martírio, inspirarão para sempre os combatentes por um mundo redimido do pesadelo capitalista:
"Colocado numa transição histórica, pagarei com minha vida a lealdade do povo. E lhes digo: tenho certeza de que a semente que entregaremos à consciência de milhares e milhares de chilenos não poderá ser extirpada definitivamente.
Trabalhadores de minha Pátria! Tenho fé no Chile e em seu destino. Outros homens se levantarão depois deste momento cinza e amargo em que a traição pretende se impor. Sigam vocês sabendo que, bem mais cedo do que tarde, vão abrir-se de novo as grandes alamedas por onde passará o homem livre, para construir uma sociedade melhor".
Ah, como eu gostaria que houvéssemos tido também um Allende em 1964!
O destino mais próximo foi o do comandante Carlos Lamarca: ele resistiu aos insistentes apelos dos companheiros que o tentaram convencer a salvar-se, buscando refúgio no exterior, quando a luta armada marchava visivelmente para um final trágico.
Optou por continuar tentando até o fim viabilizar a guerrilha, fiel ao seu compromisso de vencer ou morrer.
- Celso Lungaretti (*)
- Editorial