(JOGOS MORTAIS VI)
Suponha o leitor desta crítica um soldado que, na Guerra da Coreia (1950-1953), minou a faixa de separação entre as duas Coreias no paralelo 38 pensando matematicamente em inimigos que fatalmente pisariam nas minas 50 anos depois. Ele não conhece os inimigos, pois ainda não nasceram, mas já tem ódio deles; nem sabe se estarão na faixa, mas calcula exatamente seus futuros passos em direção às minas. Sabemos muito bem que minas de guerra não detonadas podem explodir e matar pessoas e destruir veículos casualmente, porém não planejadamente.
Em 2004, James Wan se juntou a Leigh Whannel para redigir o roteiro e dirigir um filme barato, ágil e assustador passando ao largo dos clichês hollywoodianos. Jogos Mortais (Saw) mostrava a história de um homem condenado à morte por câncer que se arvora em justiceiro com as próprias mãos contra aqueles que não amam a própria e a alheia vida. Seu nome é John ou Jigsaw (Tobin Bell, nos seis filmes da franquia). Ele é um moralista que prepara armadilhas para capturar suas vítimas e colocá-las em jogos extremos, nos quais são obrigadas a perder um membro ou uma víscera do corpo ou mesmo a própria vida. Erroneamente, o filme mereceu o rótulo de terror, pois não se passa no sobrenatural. Seu condutor é um psicopata que muito bem poderia existir.
O sucesso do filme foi tão grande que a indústria cinematográfica decidiu transformá-lo numa série, como Sexta-Feira 13, Halloween e A Hora do Pesadelo. Só que, nestas três franquias, caracterizam-se bem os personagens inicialmente para que eles vivam aventuras diferentes e independentes. Em Jigsaw, cada filme, para ser compreendido, depende do anterior.
Assim, entre 2004, quando lançado Jogos Mortais, não havia a intenção de prosseguir a saga de Jigsaw. Mas o sucesso de bilheteria do filme levou o mercado a desdobrar Jigsaw não como um personagem a atuar em filmes com começo, meio e fim. A sequência de sua saga de vinganças violentas foi perdendo a motivação ao longo dos filmes que se seguiram ao primeiro.
Enquanto John estava vivo, ainda se podia encontrar um fio condutor para suas ações. Mas, depois de sua morte, o sacrifício de vítimas que só John sabia de suas entradas em cena perdeu o sentido para o público. Por que elas morrem? Por que elas escapam da morte? Por que algumas delas são mutiladas por armadilhas sangrentas preparadas por quem já morreu? Os capítulos 2, 3 e 4 de Saw tiveram roteiros de Darren Lynn Bousman e Leigh Whannell.
Em Jogos Mortais V, David Hackl, um novo diretor, tentou conferir inteligibilidade à sequência, mas já era tarde, Muito tarde. Só os sacrifícios bizarros permaneciam, numa espécie de estética barata da violência. O fio condutor se perdeu no meio do caminho.
Agora, para finalizar a saga, o diretor Kevin Greutert é chamado para dar algum sentido à sequência. Em Jogos mortais VI (Saw VI, Austrália/Canadá/EUA/Inglaterra, 2009), com roteiro de Marcus Dunstan e Patrick Melton, Greutert tenta enterrar Saw para sempre (será?). O resumo do filme por um site especializado diz: “O agente Stratham está morto. O novo responsável por espalhar o legado de Jigsaw é o detetive Hoffman (Costas Mandylor). Quando o FBI chega perto de capturá-lo, Hoffman inicia um novo jogo. É quando o grande plano de Jigsaw é enfim revelado.” Quem vem acompanhando a saga entendeu? Nem eu.