Por cima e por baixo

(Extermínio 2)

Não é de hoje que a ficção científica imputa aos micróbios a responsabilidade por pandemias e por extermínios planetários. Vejam Herbert George Wells com A Guerra dos Mundos, romance publicado em 1898 que narra a invasão da Terra por marcianos. Depois de muito estrago, os invasores acabam morrendo por falta de imunidade a doenças simples. O livro rendeu já três versões para o cinema, sendo a última lançada em 2005 por Steven Spielberg. Tratava-se de uma advertência aos perigos da ciência e uma condenação contundente ao colonialismo, mas o que restou foi o confronto de planetas. Vejam também O Mundo Perdido, livro de Arthur Conan Doyle publicado em 1912, propondo que os dinossauros teriam sido extintos por uma epidemia. Também ele se tornou fonte de filmes, inclusive de Jurassic Park.

Depois de George Romero, os zumbis começaram a ser naturalizados e perderam seu romantismo sobrenatural. A Noite dos Mortos Vivos, seu filme de estréia, em 1968, mostra o zumbismo como uma doença causada por algum microrganismo. Nesta linha, trabalham Paul Anderson, com seus dois Resident Evil, baseados num jogo eletrônico, e Zack Snyder, com a refilmagem de Madrugada dos Mortos. A novidade de Snyder em relação a Romero é que os zumbis deste são lerdos, enquanto que os do primeiro são extremamente lépidos.

Depois de O Dia Seguinte, mostrando o fim do mundo por uma guerra nuclear entre Estados Unidos e União Soviética, de 1983, veio uma série de filmes retratando o declínio da humanidade e da vida por vários problemas ambientais. O filme O Dia Depois de Amanhã, dirigido por Roland Emmerich em 2004, aborda os efeitos do aquecimento global sobre a América do Norte, tema ardorosamente tratado no documentário Uma Verdade Inconveniente.

Em 2002, contudo, o talentoso cineasta inglês Danny Boyle dirige Extermínio (28 Days Later, no original). A ação de um grupo protetor de animais libera um macaco infestado por um vírus que transforma as pessoas em zumbis carnívoros, no modelo de Romero. O tema é retomado, agora por Juan Carlos Fresnadillo, cineasta espanhol que já tem a seu crédito o discutido filme Intacto (2001). Ele continua a história de Boyle em Extermínio 2 (28 Weeks Later, Inglaterra, 2007). O roteiro é do próprio Fresnadillo com Jesús Olmo e Rowan Joffe, tendo por base outro roteiro de Enrique López Lavigne.

Controlada a pandemia que assolou a Inglaterra, os Estados Unidos invadem o país numa verdadeira operação de guerra. Tudo está devastado, mas começa a reconstrução, termo bem ao gênero do militarismo norte-americano. Algumas áreas se tornam verdadeiros campos de concentração para manter a segurança. Há um plano a ser colocado em execução caso a doença reapareça. Os sobreviventes e os ingleses que retornam passam por uma rigorosa bateria de exames e são mantidos sob controle. O casal Alice (Catherine McCormack) e Don (Robert Carlyle) sobrevive e tem de volta os dois filhos que estavam nos Estados Unidos.

Tammy (Imogen Poots), uma adolescente de lindos olhos, e seu irmão Andy (Mackintosh Muggleton em sua estréia), ainda criança, tomarão as rédeas do filme com bastante competência. A câmara ágil de Fresnadillo e Enrique Chediak dá a Extermínio 2 um toque de pânico e terror, embora não se possa classificar o filme no gênero terror. Trata-se de pura ficção científica. Completam o quadro de pavor e frenesi a música de John Murphy e os efeitos especiais de Prime Focus/Rainmaker Animation & Visual Effects/Rising Sun Pic-tures/The Senate Visual Ef-fects/VTR/Lip Sync Post/Digital Cinema at VTR.

Tão nervosa é a concepção de Fresnadillo que mal podem ser vistos os ataques dos zumbis, ao estilo de Zack Snyder. Não apenas a doença se manifesta rapidamente como também os zumbis se deslocam com velocidade. A epidemia voltou, apesar de todos os cuidados e do plano emergencial. Desta vez, ela escapa da Inglaterra e chega à França, sugerindo que pode se alastrar pelo mundo inteiro. Por cima, Emmerich e Al Gore acenam para a humanidade com o perigo do aquecimento global. Por baixo, Boyle e Fresnadillo alertam para o risco das pandemias. Mas Extermínio 2 envia outro recado explícito para os Estados Unidos, verbalizado pelo sargento Doyle (Jeremy Renner). Depois de perder completamente o controle da situação, ele exclama para os poucos sobreviventes: "Apesar de toda a segurança e de todos os planos, deu tudo errado". Sim, vem dando tudo errado para os Estados Unidos desde a Guerra da Coréia e do Vietnã. Está dando tudo errado no Afeganistão e no Iraque. Está dando tudo errado no combate ao aquecimento global. Enfim, está dando tudo errado para Bush.

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