Artista, eu sou uma artista, repito isso o tempo todo, para que esta certeza não se perca na contínua profusão das informações que chegam à minha mente É um emaranhado de coisas que muitas vezes demoro assimilá-las, mas gosto do modo despreocupado e sem pressa com que desenvolvo e curto meu trabalho, cada imagem, cada sentimento colocados na tela, o cheiro forte da terebintina, enfim, tudo isso me transporta para dentro de mim.
E de repente percebo que o tempo passa depressa demais, não sei se quero acompanhá-lo.
As notícias são rápidas, quando consigo digeri-las, elas já perderam a importância, ou caíram no esquecimento. Penso, será que a arte caminha na mesma direção? São tantas coisas novas que nos apresentam, tantas ferramentas tanta modernidade, a digitalização, o giclée, a promessa de que uma obra pode ser eternizada através da tecnologia, e eu fico assustada com tudo isso, como alcançar a tempo todas estas novidades?
Pergunto-me: será que os meus pincéis, os panos sujos, a delícia do cheiro forte da tinta em minhas narinas, as mãos borradas de cores diversas, a desordem por todo lado, a delícia do ato de fazer nascer uma obra, será que tudo isso em breve fará parte do passado?
Vejo os jovens que chegam cheios de idéias maravilhosas, ilustrações perfeitas, e nenhum pincel... Nenhuma espátula, nenhuma mão suja de carvão.
Sinto melancolia nestes momentos, do mesmo modo que sentiu minha avó em 1970 tentando entender porque o jeans, um tecido duro e sem caimento era uma coqueluche da época entre os jovens.
É assim, as coisas vão chegando hoje a uma velocidade muito maior que chegaram às nossas avós, e também não conseguimos acompanhar.
Quando era criança, e rabiscava as paredes, minha mãe me deu tela e tintas porque percebeu que ali poderia haver algum talento escondido...
Vi meus filhos crescerem sem riscar as paredes, apenas grudados nos vídeo games, minigames e coisas do tipo... Acho que meus netos nem vão saber o que é papel, lápis de cera, massinha de modelar, todas aquelas “ferramentas” que na época me despertaram para o mundo da imaginação e criatividade.
Hoje as “ferramentas” são outras, a maneira de criar é diferente, e são muito boas, apenas não tem mais o romantismo do velho atelier, onde os artistas faziam nascer maravilhas, apenas com sua imaginação, óleo de linhaça e algumas bisnagas de tinta, não existia a preocupação de estar ligado a um no brake por medo de perder horas de trabalho e sono.
E assim caminhando entre os versos e pincéis, éramos todos poetas e plenos, porque o ato de criar fazia com que todos os nossos sentimentos aflorassem.
Eram músicos, compositores, poetas, boêmios e contestadores, hoje são peritos em ferramentas tecnológicas... E o romântico idealismo se foi, permanece vivo apenas em nossa memória, e nos vestígios que ainda hoje guardamos daquele velho avental sujo de tinta.
Cristiane Campos
Maio 2007