Dr. Edésio

Dr. Edésio é negro. Delegado Titular de Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro. Pessoa extraordinária, papo maravilhoso. Aposentado, dava consultoria gratuita para estudantes de direito e ajudava muitos amigos, cujos filhos estavam enrolados com a polícia, por delitos "leves". Sua "banca" era dentro do Bar Macau, na Rua Rodolfo Dantas, Copacabana. Livrou muita gente da "cana dura", arquivando inquéritos e até mesmo não deixando inicia-los.

Ficávamos horas e horas conversando sobre cultura geral, bebendo Antártica gelada. Minto. Eu bebia cerveja. Ele gostava mesmo era dum bom "traçado" (vermute, cachaça e mel). Conversava-mos sobre MPB, literatura, golpe militar. Sua mesa cativa no bar era sempre lotada de amigos e admiradores. Diversas vezes ajudamos a colocar o compositor Braguinha, com sua cadeira de rodas, para dentro do Bar. Ele era empurrado por uma enfermeira linda & boazuda, tipo mulata do Sargentelli. A roda era maravilhosa e o bar lotava! Entretanto, Dr. Edésio não deixava pedirem música. O João de Barro estava no final... Autor da melhor música popular brasileira, junto com o Pixinguinha, que é - indiscutivelmente - a "Carinhoso". Morei mais de cinco anos neste quarteirão, que talvez seja o maior de Copacabana; pois engloba a Rodolfo Dantas, Barata Ribeiro, Cardeal Arcoverde/Inhangá e a Avenida Copacabana. Morei sim, na traseira do Copacabana Palace Hotel... O Delegado também morava bem, num antigo e frondoso edifício, na Rodolfo, quase esquina com Barata Ribeiro.
Ele contava causos pra gente. Dois ficaram profundamente cravados (não só gravados) em minha memória. Relato agora:

NEGÃO...

Ele sempre teve carro novo e grande. Em 1966, comprou um Fusca, hoje em dia conhecido como "meia meia modelinho". Extremamente conservado, seu xodó estava novo, no século 21. Teve oferta de US$ 14.000 e não vendeu.
Num belo sábado, teve que ir a sua delegacia, no subúrbio, resolver uma pendenga... Foi de Fusca, bermuda e chinelo de dedo. Em frente à delegacia, no estacionamento, havia uma corrente que transpassava barras de ferro e que sempre ficava no chão. Os carros passavam por cima, pois nunca houve necessidade de esticá-la e meter o cadeado. Resolvido o imbróglio, ele arranjou um latão de vinte litros, encheu de água e começou a lavar o seu "fusquinha". Neste ínterim, entra um Tempra preto no estacionamento. Salta um branco de quase dois metros de altura e diz o seguinte: "Negão, lava meu carro aí, que quando eu voltar te dou uma merreca legal". Dr. Edésio fez sinal de positivo e lavou o carro do cara... Mandou comprar um cadeado e esticou a corrente, trancando o estacionamento. O babaca voltou, entrou na delegacia e perguntou ao policial do balcão onde estava o negão, lavador de carros. E o policial...: "O Negão ta naquela sala, ali.".
O mané entrou no gabinete e avistou a mesa com a plaqueta branca, onde estava escrito "Delegado Titular", com o "negão" sentado atrás, naquela cadeira giratória. Edésio disparou...: "Negão é o seu passado, filho da puta!!! Você esta preso em flagrante". Rapidamente o coitado foi imobilizado e algemado. Trêmulo e chorando, suplicou...: "Faz isso não, moço...". O bom intelectual negro tirou onda...: "Vou fazer um acordo com você, veadinho... Lavei seu carro sim. O preço é quinhentos Reais. Se você pagar eu te solto". O infeliz pediu para usar o celular... Telefonou para Deus e o mundo e arranjou a quantia... E o delegado...: "Não sou corrupto não seu corno. Vou te soltar. Se vires com dinheiro em minha delegacia, vou te meter também em ‘tentativa de suborno'. Faça o seguinte... Pegue os quinhentos merréis, doe lá na APAE; traga-me o recibo que esquecerei o que houve e liberarei você e seu carro". O cara foi e não voltou. Mais tarde um velho adentrou a delegacia com o recibo de doação, pediu infinitas desculpas afirmando: "Não foi assim que eduquei meu filho". A corrente voltou para o lugar de sempre e ele levou o carro... Custou caro a lavagem do Tempra... Quinhentos Reais!!!


De cujos.

Entrou um rábula branco na delegacia. Entregou uma petição ao Dr. Edésio. Ele leu e disse que estava errada. Pediu, educadamente, que o advogado voltasse ao seu escritório e refizesse a mesma. E o branco para o delegado negro...: "Não tem nada errado ai não!". E o Edésio...: "Melhor tu refazer este troço, rapaz!". E o racista...: "Já disse! Não tem nada errado ai, não!!!". A errada petição finalmente foi acatada. O delegado fez um ofício a OAB-RJ, anexando a petição e afirmando que este indivíduo não tinha direito de portar carteira de advogado... O fake escreveu "de cujos meu cliente", quando deveria escrever cujo meu cliente. De cujos é o morto!!! O "cliente" dele estava encarcerado e assim ficou!!! Dr. Edésio disse que a carteira do mesmo foi cassada. E que nem voltando aos bancos escolares, conseguiria passar na temível prova da OAB; na qual, mais de 70% dos formados em direito, no meu Rio de Janeiro, são vergonhosamente reprovados.

Extremamente triste, soube que meu amigo Edésio foi para o céu, pouco antes de completar 73 de idade.

Luciano Moojen Chaves
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