Tudo muito bonito, mas efetivamente inócuo
É um processo avassalador de modificações. Os governos brasileiros, federal e estaduais, têm alergia à ideia de órgãos autônomos, sejam agências reguladoras, sejam universidades, sejam conselhos educacionais. As universidades brasileiras não gozam de autonomia verdadeira. Acho que os políticos brasileiros pensam que autonomia seja equivalente à soberania. Neste sentido, é de certa forma irônica observar que foi certa autonomia do Banco Central que deu ao Brasil a estabilidade da qual hoje se beneficia o país.
Não se discute o ensino superior no Brasil, discute-se o acesso ao ensino superior, por isso, não existe uma política universitária, uma política educacional do ensino superior. Minha decepção nesse período é que não tenhamos discutido os objetivos do ensino superior no Brasil. Hoje, o Brasil é a 8ª, 9ª economia do mundo.
Se pegarmos a lista de melhores universidades mundiais, não encontramos nenhuma universidade brasileira entre as 100 primeiras. Vemos alguma lá na 180ª posição, que são as paulistas, a USP, a Unicamp, seguidas pela UFRJ, UFMG. O Brasil nunca definiu se deseja ter uma grande universidade de qualificação mundial. A Coreia do Sul está lutando bravamente para constituir universidades de qualificação mundial.
A China tem um plano de fazer 100 universidades de qualificação mundial até 2021. A Alemanha tem um programa de 2,5 bilhões de euros para a qualificação. O presidente francês deu autonomia para as principais universidades e exigiu que elas se qualifiquem. Portugal e Austrália também têm feito movimentos nessa direção. A Inglaterra tem pelo menos três universidades de classe mundial e os EUA tem um caminhão delas. E o Brasil, quer o que com seu ensino superior?
O Sistema S - Sesi, Senac e Sesc
Há outra discussão relevante, sobre a natureza jurídica e a legalidade das Instituições de Educação Superior (IES) do Sistema "S": Sesi, Senac e Sesc. Essa discussão ficou complicada porque comprovamos que eles funcionam como IES privadas, pois cobram mensalidades a preços de mercado e hoje já possuem extensa rede nacional. Mas eles vivem de subsídio público e não oferecem serviços apenas para os trabalhadores de cada respectivo setor que contribui com parcela de sua folha de salários. Admitem todo e qualquer estudante que seja aceito. Estas IES do Sistema "S" são públicas ou privadas? Ou seriam semi-públicas ou quase-privadas, categorias estas que não existem no ordenamento legal brasileiro? Se é público, não deveria cobrar mensalidades. Se é privado, não deveria se valer do dinheiro que é retirado da folha dos trabalhadores para montar as estruturas maravilhosas que têm. O MEC não se deu conta de que o estatuto deles não continha a possibilidade de abrirem faculdades e Centros Universitários, mas a possibilidade de oferta de educação profissional. Na educação profissional eles também cobravam e o MEC fez um acordo para o Sistema "S" dar gratuidade até 2011. Houve um ajuste. Mas esqueceram do ensino superior, que não faz parte do acordo. Somos a favor de que o Sistema "S" possa oferecer educação superior, mas a questão é quem vai pagar. Seria interessante que eles pudessem oferecer educação gratuita. Essa discussão está em aberto e é muito relevante.
O tema mais importante que está agendado no CNE (Conselho Nacional de Educação) é sobre o credenciamento e recredenciamento de universidades, inclusive as federais. Esse é um tema que está muitos anos atrasado. O governo não providenciou esse recredenciamento e as universidades federais nunca se importaram se são credenciadas ou não. As universidades federais são criadas por lei, pelo Congresso Nacional, mas a lei não as credencia. A LDBEN nº 9394/96 - diz que quaisquer universidades devem ser credenciadas. As novas universidades devem ser credenciadas e as antigas deverão ser recredenciadas. Elas apresentaram as exigências burocráticas para o MEC, mas isso não passa pelo escrutínio de uma reunião pública. Não menos importante será a discussão sobre o credenciamento e recredenciamento das universidades privadas, visto que nunca aconteceu no país este processo de recredenciamento universitário.
Alguns dirão: a expansão, que é uma política social; outros dirão: as cotas, que também é uma política social; outros, o Prouni (Programa Universidade para Todos), que também é uma política social. Mas, as universidades devem ensinar o quê? É para continuar formando quais profissionais na graduação? Nós queremos universidades de qualificação mundial no Brasil? Queremos universidades de ponta comparadas às de outros países? O que devemos ensinar aos estudantes universitários? Não se discute o ensino superior no Brasil, discute-se o acesso ao ensino superior, por isso, não existe uma política universitária, uma política educacional do ensino superior.
(*) é professor universitário, jornalista e escritor
- (*) Nelson Valente
- Colaboradores do Rebate