O espírito que faltou no 1º turno
Dilma Rousseff foi a grande vencedora do 1º turno da eleição presidencial 2010, com mais de 47 milhões de votos.
Isto é o que a imprensa teria de noticiar, caso não houvesse a perspectiva de liquidação da fatura já neste domingo.
Por conta do clima de já ganhou!, a vitória acabou tendo sabor de derrota. E vai ser assim que os adversários a apresentarão.
No entanto, a vantagem de Dilma sobre José Serra superou 14 milhões de votos. Em termos eleitorais, um colosso. Nada indica que será revertida.
São dois candidatos sem carisma, mas Dilma se beneficia da lenda e popularidade de Lula.
Já Serra, coitado, nasceu sem os dons da simpatia e da fala agradável. Parece sempre um mestre-escola ensinando uma matéria tediosa.
Por mais que disfarce, percebe-se que considera os ouvintes um bando de retardados, aos quais crê ser necessário explicar tudo tintim por tintim. Comunicação pior, impossível.
Mostrou toda sua impotência no final da campanha: incapaz de evitar a vitória imediata de Dilma, limitou-se a rezar para que Marina Silva fizesse o que ele jamais conseguiria fazer.
A candidata do PV, aliás, estava certíssima ao afirmar que ela era a única capaz de enfrentar Dilma de igual para igual no 2º turno.
Mas, em política como no futebol, convém nunca subestimar-se um azarão. Ainda mais quando a imprensa faz o papel de juiz ladrão, fabricando factóide em cima de factóide para prejudicar a candidata oficial.
Então, Lula, Dilma e o PT deveriam dar uma boa olhada nos resultados do domingo. Principalmente nas abstenções, nulos e brancos: foram nada menos que 34 milhões de votos jogados no ralo!
Ou seja, maior do que o universo de eleitores de Serra foi o conjunto dos que não deram importância ao pleito.
Então, além de irem à caça dos votos dados a Marina (o que certamente farão), os petistas deveriam oferecer alguma motivação a esse imenso contingente entregue à negatividade.
Por exemplo, o compromisso de seguir estas diretrizes:
"É preciso que o Estado se torne a expressão da sociedade, o que só será possível quando se criarem condições de livre intervenção dos trabalhadores nas decisões dos seus rumos.
"Por isso, o PT pretende chegar ao governo e à direção do Estado para realizar uma política democrática, do ponto de vista dos trabalhadores, tanto no plano econômico quanto no plano social.
"O PT buscará conquistar a liberdade para que o povo possa construir uma sociedade igualitária, onde não haja explorados nem exploradores".
Isto, claro, se ainda conseguirem localizar o manifesto de fundação do PT, que deve estar acumulando pó em algum canto do arquivo morto.
* Jornalista e escritor. http://naufrago-da-utopia.blogspot.com