LEIS RACIAIS no SUPREMO TRIBUNAL: uma terceira via

Na busca da melhor reflexão que interessa a todos, ´O Rebate´ tem franqueado espaço para o relevante debate a respeito da ameaça de implantação no Brasil de um sistema social com base em direitos raciais. Tal proposta de racialização faz parte de um movimento internacional para a recriação do velho conceito de raças, agora, inversamente, do estado para o povo, enquanto o antigo racismo partiu da crença popular para a esfera governamental. Neste mês que celebramos 122 anos da abolição da escravatura, em vez de lastimar o passado da perversa escravidão que não pode ser esquecida, deduzo aqui uma reflexão sobre o futuro que interessa aos brasileiros. Em março pp realizou-se no Supremo Tribunal Federal – STF, a histórica audiência pública convocada pelo Ministro Ricardo Lawendowski para subsidiar a Corte sobre o julgamento da constitucionalidade ou não de leis raciais e políticas de cotas raciais nas universidades. Dela participei no painel previamente definido pelo Ministro Relator – ´Raça Estatal´ e o Racismo - englobando os efeitos difusos de políticas estatais com base em leis raciais e cotas raciais. Aleguei pelo veto aos projetos de leis raciais em trâmite nas casas legislativas e veto ao critério racial das cotas universitárias, considerando os efeitos colaterais de políticas públicas raciais: é o estado afirmando a crença na divisão humana em ´raças´ prejudicial ao conceito da única espécie humana. É sabido que a crença em ´raças´ municia o racismo.

No caso das universidades públicas, um problema preliminar a ser enfrentado pelo STF é que se forem permitidas as ´cotas raciais´ mesmo que fundada na autonomia universitária, que é garantia constitucional, por fazerem parte do estado, por isonomia, será o precedente jurisprudencial autorizadora que outras normas legais adotem ´cotas raciais´ em todos os níveis da educação e em concursos públicos ou qualquer outra oportunidade profissional, conforme já há projetos de leis federal, estaduais e até municipais. Se autorizada em nível federal, milhares de leis serão aprovadas em todo o Brasil, e passaremos a viver, doravante, sob uma ordem jurídica racial. Contra essa realidade factual, não desejada pelos brasileiros, conforme pesquisa CIDAN/IBPS divulgada em 19/11/2008, 63% de brancos, pardos e pretos, em média, rejeitam leis de cotas raciais é que merece acolhida essa terceira via, ou opção intermediária: favorável à adoção de cotas sociais, com 50% das vagas reservadas pelo critério da renda familiar até dois salários mínimos, por exemplo, beneficiando aos melhores talentos, entre os mais pobres, o que, tal como faz o programa do Bolsa Família, beneficiará também aos afro-brasileiros que são cerca de 70% dos pobres, e ninguém acusa que o programa de renda mínima seja ´racial´. Nas universidades, com a reserva de 50% das vagas pelo corte de renda familiar, reduz os privilégios dos mais ricos que ocupam 80% das vagas gratuitas e não precisa dessa perversa política de manipulação da escassez entre os pobres com a exclusão de pobres brancos a favor de pobres pretos, numa artificial e perigosa divisão racial de jovens, os mais talentosos, oriundos do mesmo ambiente social. Com essas vagas sociais, os pobres que ocupam 20% das vagas passam a dispor de 50%, ou seja, um aumento real de 150% de vagas. As universidades e o ensino público têm papel pedagógico de formador da juventude e não o de deformadora, ensinando-lhes, desde muito jovem uma separação de direitos pelo estado, em bases raciais.

Assim julgando por essa terceira via, o Supremo Tribunal estimulará a adoção da melhor doutrina de Ações Afirmativas, empregada no mundo desenvolvido, que não se confunde com cotas raciais ou qualquer forma de segregação estatal, conforme deturpam os racialistas defensores de leis raciais. Ao STF, por conseguinte, caberá afirmar a doutrina de AA e ditar a regra revestida de explosivo potencial político: afinal o Brasil abraça ou repudia a classificação estatal do povo por raça? Interessa a afro-brasileiros a classificação?

Nos últimos anos, o debate sobre políticas públicas em bases raciais ficou maniqueísta: ser, simplesmente, contrário ou favorável cotas através da ´raça estatal´ em políticas públicas, não é condizente para a realidade brasileira. Desconsidera-se que os brasileiros não acreditam em nenhum pertencimento racial e abandona-se a possibilidade da adoção de ações afirmativa sem cotas de segregação racial. A flagrante desigualdade social entre brancos e pretos/pardos; as discriminações raciais ainda recorrentes e a antiga cultura do racismo ainda permeiam a sociedade. Diante de tal realidade factual, não tem cabimento submeter o Estado ao repúdio da miscigenação, uma condição virtuosa, nas palavras do saudoso e festejado professor MILTON SANTOS, exige-se, pois, a atuação ativa do estado, porém, não pode fazei-lo legitimando a divisão dos humanos, em raças distintas, semente de conflitos raciais. Se o estado legislar sobre direitos raciais, a ´raça´ deixará de ser crença e passa a ser fato jurídico relevante na vida de pretos e de brancos. É preciso que estejamos conscientes que nesse tema, estaremos definindo, através da mais alta Corte, qual o ambiente social das gerações futuras. Entregaremos uma sociedade com identidade jurídica racial, ou não.

Outro fato relevante é doutrinário. Assim, ganha relevância para o julgamento no Supremo, lições de doutrinadores, tais como os atuais Ministros da Corte, JOAQUIM BARBOSA e CARMEM LÚCIA, entregues para o público em 2001, antes de assumirem a mais alta Magistratura. Então, dizia o Ministro :“...
Porém, falta ao Direito brasileiro um maior conhecimento das modalidades e das técnicas que podem ser utilizadas na implementação de ações afirmativas. Entre nós, fala-se quase exclusivamente do sistema de cotas, mas esse é um sistema que, a não ser que venha amarrado a um outro critério inquestionavelmente objetivo (o autor exemplifica com egressos de escola pública), deve ser objeto de uma utilização marcadamente marginal.... Noutras palavras, conforme as lições da professora CARMEM LÚCIA (n.a. atual Ministra do STF) ação afirmativa não se confunde nem se limita às cotas.... Ação afirmativa é um conceito que, usualmente, requer o que nós chamamos metas e cronogramas. Metas são um padrão desejado pelo qual se mede o progresso e não se confunde com cotas. Opositores da ação afirmativa nos Estados Unidos freqüentemente caracterizam metas como sendo cotas, sugerindo que elas são inflexíveis, absolutas, que as pessoas são obrigadas a atingi-las´.”.( O debate constitucional sobre as Ações Afirmativas, Joaquim B.Barbosa Gomes, 17/6/2005) http: //www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos.asp?codigo=33

Destarte, tal como decidiu em 1978 a Corte Suprema dos EUA que a nossa Suprema Corte admita e estimule políticas públicas e privadas de Ações Afirmativas, vetando, entretanto, o uso da segregação de direitos em bases raciais o que viola a dignidade humana de todos, e mais ainda, viola a dignidade humana dos afro-brasileiros que jamais postularam o pertencimento a uma ´raça negra´ que o racismo diz ser a ´raça´ inferior. A história não pode ser desconhecida: nossos avós lutaram e resistiram a opressão escravista, e, estavam organizados em milhares de Irmandades de Homens de Cor; Homens Pretos, Homens Pardos, Pretos Novos, jamais em Irmandades da ´Raça Negra´, uma vez que a definição de ´negro´ aos pretos, é uma classificação racial, degradante e infamante, imposta no nascimento do racismo, em 1755, pelo Marquez de Pombal com a norma ´Directório do Índio´, não sendo pois, classificação humana.

José Roberto F. Militão, advogado, em 05/03/2010 foi expositor ´contra´ leis raciais em audiência pública perante o STF; é membro da Comissão de Assuntos AntiDiscriminatórios – CONAD-OAB/SP; ex-Conselheiro e Secretário-Geral do Conselho da Comunidade Negra do governo do estado de São Paulo (1987-1998).

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