De novo, Arruda?

No ano que vem, 51 municípios brasileiros testarão a mais recente inovação do nosso sistema eleitoral, tido e respeitado com um dos mais eficientes do mundo, pelo menos do ponto de vista tecnológico: a identificação biométrica. Consiste, basicamente, em, no momento da votação, com equipamento eletrônico próprio, recolher-se a impressão digital do eleitor e compará-la instataneamente com aquela que ele deverá ter deixado no cartório eleitoral na ocasião do recadastramento obrigatório prévio. Em Minas Gerais, os quatro municípios que terão a identificação biométrica em 2010 - Curvelo, Pará de Minas, Ponte Nova e São João Del Rey - já estão recadastrando os seus eleitores desde o dia 16 de novembro. Mais oito anos e a novidade biométrica deverá estar em todas as cidades do Brasil.
 
Contudo, o foco do noticiário político atual, como não poderia deixar de ser, repousa sobre a figura do governador do DF José Roberto Arruda (DEM) e o suposto pagamento de mensalão a aliados. Ainda é cedo para se comprovar a culpabilidade de Arruda, mas há consistentes indícios de que a(s) cena(s) de ilícito(s) esteja(m) largamente marcada(s) pela impressão digital do governador.
 
Não se sabe se daqui a oito anos, quando todo o Brasil estiver se mobilizando para o recadastramento biométrico em nível nacional, José Roberto Arruda estará na cena política. Mas... onde estava José Roberto Arruda exatos oito anos atrás? Resposta: assim como agora, enrolado em graves e consistentes denúncias.
 
Boa parte da sociedade há de se lembrar: o dia 24 de maio de 2001, uma terça-feira, marcou a renúncia do então senador José Roberto Arruda, que pouco antes já havia perdido o seu lugar no PSDB e no posto de líder do governo FHC no Senado. Arruda meteu-se no escândalo da violação do painel do Senado na votação que, um ano antes, cassou o mandato do ex-senador Luiz Estevão, (então PMDB-DF), a propósito, o único a ter sido punido com a cassação pelo seus pares em toda a história daquela Casa Legislativa.
 
Naquele fato, a então diretora de informática do Senado Regina Borges violou o painel da Casa, segundo ela, constrangida por ordens de Arruda, desafeto de Estevão.
 
Assim como agora, naquela ocasião Arruda optou por, inicialmente, refutar de maneira incisiva qualquer envolvimento com o episódio. Subiu à tribuna do Senado em 17 de abril de 2001 e proclamou: "Devo dizer que há duas semanas venho sendo acossado por informações, muitas vezes sem agente específico, de que a violação do painel eletrônico, para que se obtivesse dele o voto de cada um dos Senadores naquele dia 28, efetivamente tinha sido feita, e mais, que eu havia sido incluído entre os Senadores que estavam a solicitar esse gesto do Prodasen (...). Sr. Presidente, conheço a Dra. Regina há muitos anos. Tenho dela as melhores referências. Sempre coloquei isso publicamente. Nunca tive da Dra. Regina nenhuma demonstração de má-fé ou de gesto antiético na sua conduta, nos seus quase trinta anos de Senado e nos seis ou sete que convivemos aqui. Nesse episódio, não fui procurado por ela, não a procurei, não solicitei, não me foi entregue, e a desafio ou qualquer cidadão a oferecer qualquer vírgula de prova de que eu possa ter intermediado esse gesto".
 
E quanto tempo durou aquela "verdade" de Arruda? Ao que se vê, menos de 40 dias. Pois vejamos o teor do discurso do então mais novo ex-senador da República, em sua carta de renúncia, na tal terça-feira, 24 de maio de 2001: "Presidente do Senado Federal, Srs. Membros da Mesa, Sras. e Srs. Senadores, não roubei, não matei, não desviei dinheiro público, mas cometi um grande erro, talvez o maior da minha vida. No primeiro momento, não percebi sua extensão. Tentei negá-lo, Sr. Presidente, e esse foi outro grave erro. Estou pagando caro por isso, um preço muito alto, mas talvez o preço maior ainda não tenha sido totalmente saldado".
 
Arruda prosseguiu: "Em meio a esse pesadelo em que se transformou a minha vida, uma das coisas que mais dói é a certeza da frustração dos mais de 300 mil habitantes de Brasília que depositaram seu voto e sua confiança em mim, além da convicção de que centenas de milhares de outras pessoas acreditavam num projeto político para Brasília, que, por causa desse erro, terá de ser reconstruído".
 
Mas reconstruído de que forma, Arruda?  Primeiro, já em 2002, sendo sumariamente absolvido pelo seu eleitorado, como o deputado federal mais votado do DF e o mais votado proporcionalmente no país. Mais quatro anos e nova consagração nas urnas, eleito governador no primeiro turno com mais de 50% dos votos.
 
E qual foi o teor do discurso de despedida de Arruda na Câmara dos Deputados, em 20 de dezembro de 2006? Vejamos:
 
"Vivo, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, o momento, talvez, mais importante de minha vida pública, e o vivo intensamente, porque aprendi, na hora da derrota, que tudo passa. Permitam-me, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, para concluir esta despedida, lembrar uma parábola.
 
Um rei, certa vez, pediu a um sábio da Corte que lhe escrevesse uma mensagem importante. O sábio entregou-lhe uma mensagem gravada num anel e pediu que ele só a lesse num momento muito difícil de sua vida. Ele guardou o anel dentro de uma caixinha. Anos mais tarde, foi vítima de um processo no reino. Caiu, perdeu o reinado, perdeu as riquezas, perdeu o respeito dos súditos. Foi exilado. E no pior momento de sua vida lembrou do anel. Abriu a caixinha e leu o que estava escrito: Tudo passa, isso também passará.
 
Anos mais tarde, como o mundo gira, ele retomou o reino. Houve uma grande festa para comemorar a volta do rei. Seus súditos alegres. Era um momento de exaltação. Num canto do salão do palácio, ele viu o mesmo sábio, mais idoso, procurou-o e lhe pediu uma nova mensagem, já que a primeira lhe tinha sido tão cara. O sábio, mais uma vez, entregou-lhe uma caixinha. Ele perguntou: Só leio num momento difícil? O sábio respondeu: Não, Majestade. Esta é para o senhor ler hoje à noite.
 
Ele chegou aos seus aposentos, mais tarde, muito cansado, exultante com a volta, e abriu a caixinha, onde estava escrito em outro anel: Tudo passa, isso também passará.
 
É com esse espírito de transitoriedade que deixo esta Casa e assumo as honrosas funções de Governador do Distrito Federal. Estarei, de coração, à disposição de cada um dos amigos que aqui fiz".
 
Comprovadas as denúncias da PF, Arruda provará também que está, de fato, à disposição dos amigos. Mais ainda, dos aliados.  Arruda terá mostrado que quem pode comprar previamente a vontade política de seus pares não necessita de violar sigilos de votação.
 
Brasília vê os desdobramentos naturais da crise. O DEM mostra (ou tenta mostrar) algum espanto ou surpresa com o caso. Providencia, como o fez o PSDB em 2001, defenestrar Arruda, estancando o quanto antes o sangramento de tê-lo em seus quadros.
 
Mas as grandes dúvidas que ficam, juntamente com aquelas relativas à investigação, é saber: 1º) Se tudo passa, o que mais de Arruda ainda vai passar, seja pelas instâncias legais, seja pela renúncia forçada? 2º) Dessa vez, vão-se dedos, vão-se os anéis ou nenhum dos dois? 3º) Dadas uma segunda e terceira chance para o eleitorado do Planalto Central, terá também ele aprendido com a(s) sua(s) derrota(s) particular(es)? 4º) Irá esse eleitor apenas deixar a sua digital na urna, ou procurarará ele também saber de quem são as digitais daqueles que usam a política de acordo com seus interesses particulares?  5º) Teremos, uma dia, o mais moderno sistema político-eleitoral do mundo?

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