Esta situação acontece apoiada no aumento de notícias veiculadas pelos meios de comunicação de massa em todo o mundo, os quais relatam a comercialização de jogadores de todas as idades, inclusive menores de 18 anos, por valores contratuais a cada dia mais altos.
No Brasil o esporte, principalmente o futebol, é uma das alternativas de ascensão social, pois grande parcela da população não possui condições básicas de educação e de oportunidade de bons empregos que permitam aos pobres melhorarem suas condições financeiras pelo próprio esforço. Logo, vemos crianças e adolescentes motivadas e desejosas de se tornarem astros de futebol, e uma necessidade das famílias melhorarem as condições em que vivem.
O capitalismo acena, para esses jovens pobres, com a possibilidade de transformá-los em celebridades do mundo esportivo e receberem altos salários por suas exibições, visto que as suas performances podem gerar significantes retornos financeiros aos clubes e possibilitar a conquista de títulos, que transformam essas agremiações em atrativo setor de investimento publicitário por parte de empresas privadas e até mesmo grandes estatais. Entretanto, em todo o caminho que leva um jovem da divisão de base até a profissionalização, há um exaustivo trabalho pedagógico e de preparação para revelar um talento do futebol.
Durante a formação de atletas, a maioria dos jovens que tentam ingressar na carreira esportiva fica de fora, seja por falta de potencial para o esporte, erro no prognóstico dos selecionadores de talentos ou a necessidade dos treinadores se manterem empregados.
A falta de potencial para um esporte específico é algo comum, pois em todas as áreas de conhecimento existem pessoas mais habilidosas que se destacam, ou seja, os melhores sobrevivem.
Erros no prognóstico são comuns no meio esportivo, visto que as equipes são divididas por idade cronológica, ou ano de nascimento, e as crianças e adolescentes estão em constante crescimento e desenvolvimento, com ritmos e taxas diferentes para uma mesma idade. Esta diferenciação é estabelecida pela idade biológica, a qual irá interferir na composição corporal, nas qualidades físicas básicas e nas respostas ao treinamento dos jovens. Logo, quando um treinador/professor testa dois adolescentes e um deles está biologicamente adiantado, há uma tendência de o teste beneficiá-lo em relação ao atrasado ou normal. Entretanto, ao final da adolescência ambos os atletas estarão em igualdade de condições biológicas, e os que foram rejeitados no processo de formação poderão demonstrar melhores condições esportivas.
O mesmo erro no prognóstico pode ocorrer de forma intencional, pela maneira como os clubes e as empresas enxergam as divisões de base, pois a ideia das categorias inferiores é revelar atletas para os profissionais, ou seja, é um trabalho de longo prazo. Porém o que se vê é uma exaltação dos títulos conquistados por treinadores/professores dessas categorias. Com isto, os treinadores podem ser induzidos a selecionar aqueles jovens que estão adiantados, com uma maior estatura, ou mais fortes, por exemplo, que trarão melhores resultados no momento, como forma de manterem o emprego.
Os profissionais que trabalham com o esporte e a sociedade em geral deveriam olhar com mais cuidado para as crianças e adolescentes que estão inseridos no esporte, de forma a respeitar o momento no qual se encontram, pois o que vemos no Brasil é um enorme desperdício de talentos, considerados pela pesquisadora e professora Marsyl Mettrau um “Patrimônio Social”.
Renato Vidal Linhares é professor de Educação Física e está concluindo exames de doutorado em que defende tese sobre o tema abordado neste artigo, o qual foi fornecido a esta Agência Assaz Atroz, a título de colaboração.
1 - LABIMH – UFRJ – RJ
2 - Universo – Niterói – RJ
3 - LAM – UFJF – MG