PAREI DE BRINCAR

Ser criança é muito bom. Guardo ótimas lembranças dos passeios e das brincadeiras da minha época. O mais interessante é que uma brincadeira sem muita graça pode durar noites e mais noites. Outras brincadeiras mais interessantes são interrompidas e terminam sem a menor cerimônia, os meninos  dizem: “parei de brincar!” e acabou. Não adianta dialogar. Parou e parou mesmo! Infelizmente deixei de ser criança já faz tempo. Entretanto, quando ouço algumas justificativas de profissionais da bola, sou tentado a repetir o que falei muitas vezes nos tempos de criança – “parei de brincar”.
O ex-volante e atual técnico da Seleção, Dunga, convocou os jogadores para a disputa de mais dois jogos das Eliminatórias. Fiquei ligado. Ouvi a lista e parti para entender os motivos de algumas convocações e justificativas de outras ausências. Entendo que cada um tem seus gostos e preferências, no entanto, não é possível que o técnico da Seleção Brasileira ache que Ramires e Hernanes são meias (ou será que Kaká é volante?). Dunga foi volante e foi um bom volante. Não era um clássico. Tinha um bom passe horizontalizado e se popularizou pelo esforço, luta e liderança. Ele conhece a posição. Quando Dunga levantou a taça, como capitão, em 1994, ele era um volante acompanhado de outros jogadores com características defensivas. Vamos lembrar? Mauro Silva, Dunga, Mazinho e Zinho no meio. Bebeto e Romário eram os atacantes e pelos lados jogavam Jorginho e Leonardo (ou Branco). Mauro Silva era o protetor da defesa. Dunga chegou a dar assistência para o Romário contra Camarões. Mazinho e Zinho tinham posicionamento defensivo sem a bola e apareciam para o jogo com a posse de bola. Será que o Dunga esqueceu? Se fosse ele o treinador, fatalmente, não teríamos levantado o troféu. Já que, para ele, volante que sai como elemento surpresa não é volante - é meia, é reserva do Kaká. Alguns caíram na justificativa do padrão de jogo, ou, fidelidade a esquema. Ledo engano! O esquema é a justificativa dos que não têm ousadia ou “maldade”, jogo de cintura para “flutuar” em campo. Parreira tinha e utilizou até o próprio Dunga como peça para enganar os que veem o futebol com os olhos “engessados”. O atual treinador do Fluminense sempre foi chamado de pragmático e ganhou uma Copa exatamente por privilegiar o que o time tinha de melhor – o ataque. Dunga sabia, vivenciou a experiência e não assimilou a idéia. Ele vê o futebol como totó (pebolim).

Ramires e Hernanes são volantes e ambos têm qualidades técnicas para desempenharem outras funções em campo. Não fazem bem a função de protetores da defesa. Não são como era Mauro Silva, e também não são meias. A função e posição dos dois pode ser chamada de segundo volante, ou volante que atua pelo lado. Um pode ser o marcador pela esquerda e o outro pela direita. Eles dão e dariam na Seleção um descanso e até uma alternativa aos laterais, que teriam alguém com eles. Ramires e Hernanes são da mesma posição do Elano. Se Dunga prefere Elano é questão de gosto, entretanto, justificar a ausência deles comparando a função com a exercida por Kaká?! É demais!

Outro que não tem sido lembrado é Lucas, do Liverpool. O ex-cabeludo tem a imagem ligada ao Grêmio de Mano Menezes. Lá, ele jogava como um segundo volante e chegava muito ao ataque como surpresa. Sempre foi um destaque e marcava muitos gols. A imagem deve ser modificada! O Lucas que atua no Liverpool se tornou um jogador diferente. Rafa Benitez, técnico dos Reds, acrescentou algo a Lucas, deu mais versatilidade a ele. Já acompanhei Lucas como primeiro volante e também como segundo volante e afirmo que o futebol dele está diferente. Infelizmente ele erra mais passes do que errava antes, contudo, arrisca mais e pega mais. Várias vezes o meio campo inglês foi formado com Lucas, Xabi Alonso e Gerrard. É verdade que o time abusa de saber jogar com obediência tática e todos ficam atrás da linha da bola. Também é verdade que, com a bola, todos sabem jogar. Ah! Talvez esteja aí o problema do treinador e ex-volante da Seleção. Quem sabe jogar, sabe ousar e ousadia pode custar o cargo de técnico. Por isso lembrei das brincadeiras de criança. Quando eu sabia que poderia correr o risco de perder, mais que depressa... “parei de brincar”, “tô de altas”.
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