Todos os ovos na mesma cesta

É tudo ou nada. É pegar ou largar. Como seres humanos, tendemos ao radicalismo na hora de satisfazer os desejos pessoais e atingir graus máximos de prazer. Somos assim não porque escolhemos conscientemente, de modo planejado. Está longe, ainda, tal raciocínio, embora as experiências se repitam e, ainda que dolorosas, de pouco adiantam para nos demover dos desatinos que cometemos em nome da felicidade. Atiramos-nos às águas mais profundas quando estas nos dão o menor sinal de garantia a respeito da satisfação. Então, investimos muitíssimo de nós nas relações amorosas, qual uma aposta, para em seguida nos deleitarmos com a decisão e sofrer igualmente com a possibilidade da perda. Esperança e temor formam uma combinação explosiva. É oito ou oitenta.
Não é sem razão que Freud, o pai da psicanálise, relatou: "Nunca nos achamos tão indefesos contra o sofrimento como quando amamos, nunca tão desamparadamente infelizes como quando perdemos o nosso objeto amado ou o seu amor". Tal fato relaciona-se a "viver baseando-se no valor do amor como meio de obter felicidade". Logo, esse tipo de crença faz com que nos prostremos diante do altar de deliciosas promessas. Mais: no atual regime emocional, revela a pesquisadora estadunidense, Laura Kipnis, "apaixonar-se também nos compromete com o fundir. O que significa que não se fundir, quando necessário, é terrível para o ego e geralmente é traumático". Porquanto é fácil identificar o peso que damos a tal investimento. Basicamente, colocamos todos os ovos na mesma cesta. E, é claro, quando ela cai, o prejuízo é enorme. O tempo fecha.

O amor, pois, se direcionado com tamanha exclusividade aos relacionamentos, não rouba apenas a cena de outras possibilidades como também causa tropeços de proporções tão amplamente conhecidas por aqueles que já tomaram desta bebida tão doce e prazerosa em seus primeiros goles quanto amarga e nauseante pela ressaca que se segue. Deixarei então de amar intensamente? Pergunta-se. A resposta é não, evidentemente. É impossível. A saída, argumento, está em dividir os ovos da cesta. Ame com profundidade, mas ame diversificadamente, é a sugestão.

Investir em outros setores (ou ampliar a dose de investimento) é fundamental. Cumpre, porém, lembrar que outros campos também podem ser afetados pela perda, tal como o profissional, haja vista o temor existente nas atuais e significativas possibilidades de demissão - outra fonte de estresse constante. Mas é preferível ampliar a restringir. Desenvolver laços com a nossa qualidade de vida, por exemplo, através da reviravolta no cardápio alimentar, das caminhadas diárias, da leitura, da autorrevisão, da aproximação com novas amizades, do bordado, da conversa despretensiosa. Do convívio e educação dos filhos. Só não vale se esconder atrás da falta de tempo. Afinal, quando se quer algo de verdade, bem sabemos que o relógio perde o seu efeito controlador. Ademais, a escolha é nossa, além de ser intransferível. Só nós podemos decidir quantos ovos queremos colocar dentro da mesma cesta.


*Armando Correa de Siqueira Neto é psicólogo (CRP 06/69637), diretor da Self Consultoria em Gestão de Pessoas, professor e mestre em Liderança pela Unisa Business School. Co-autor dos livros Gigantes da Motivação, Gigantes da Liderança e Educação 2006. E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.
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