Como a Mesa Diretora da Câmara não concordou com a esperteza do Senado, que alterou o texto anterior ao promover a seu arbítrio modificações nas regras que não permitiam aumento nas despesas das câmaras municipais, o Senado Federal ficou incomodado e protocolou mandado de segurança, assinado pelo presidente do Senado, Garibaldi Alves, e pelo advogado-geral do Senado, Luiz Fernando Bandeira Melo Filho, que apresentaram o seguinte argumento: "Ao permitir-se que uma Emenda Constitucional já validamente aprovada não seja promulgada por simples alvedrio de uma das Mesas Diretoras do Congresso Nacional, aviltar-se-á diuturnamente o Poder Legislativo e as instituições democráticas do país. Criar-se-á um clima de instabilidade, pela indefinição jurídica quanto ao fato de poder ou não um reduzido grupo de dirigentes de uma Casa Legislativa, ao arrepio do ordenamento posto, barrar uma modificação constitucional legitimamente aprovada".
É ridículo o mandado de segurança do Senado. Onde foi desrespeitado algum direito ou houve abuso de poder? Ao contrário, senadores inescrupulosos - defensores de curral paroquial de votos, na contramão da moralidade dos gastos públicos e da opinião popular que não concorda com essa pouca-vergonha legislativa de agir -, modificaram ao sabor de seus inconfessáveis interesses artigo de contenção de despesas da proposta original aprovada pela Câmara, em flagrante desrespeito à seriedade pública.
O alvedrio (arbítrio) constatado, na realidade, foi o da ação capciosa do Senado em alterar o texto original para acomodar interesses de vereadores. E o clima de instabilidade institucional argüido não existe, porque a Câmara Federal apenas exerceu o seu direito de contestar uma irregularidade perpetrada pelo Senado a favor dos gastos públicos, que não estavam previstos no texto original.
Com esse imbróglio, eu pergunto: para que serve o Senado e o inchado Congresso Nacional, em que as duas Casas se digladiam por interesses particulares e não-nacionais? E eu respondo: só serve para gastar o dinheiro público e trabalhar na contramão do interesse social.
Lamentavelmente, vivenciamos um sistema político ultrapassado que não dá ao povo poder de interferir nos atos do Congresso para afastar políticos indecorosos e que demonstram não ter o mínimo respeito com coisa pública. Como se pode confiar na seriedade de um Parlamento que esquece os valores morais da República e só vive protegendo interesses de grupelhos políticos mal-intencionados e que só querem tirar vantagem?
Assiste-se, no País, ultimamente, ao embate de poderes da República desnecessário. O Poder Legislativo, por exemplo, não cumpre o seu papel de votar as leis do País e de acatar recomendações superiores jurídicas e fica melindrado com as decisões do STF.
Quando o STF se manifestou positivamente pela redução do número de vereadores, o Legislativo deveria - como todo mundo faz - acatar a decisão do Judiciário e não afrontar aquela Corte, partindo para o subterfúgio da PEC, visando acomodar interesses corporativos políticos paroquiais, mesmo sabendo que a grande massa da opinião pública brasileira é contra a excrescência de mais vereadores no País. E o que nos entristece é ver senadores, considerados sérios (Pedro Simon, Paulo Paim, Sérgio Zambiasi e outros), capitularem para não desgostar a paróquia eleitoral, e o relator da PEC, senador Cesar Borges, sofismar que não haveria aumento das despesas.
Quando o famigerado AI-5 fechou o Congresso Nacional, todos gritaram pelo absurdo cometido pelo regime então vigente. Mas as razões por que o Ato Institucional prosperou por quase um ano estão aí hoje estampadas, borbulhando com odores purulentos para todos sentirem.
Julio César Cardoso
Bacharel em Direito e servidor federal aposentado
Balneário Camboriú-SC