“O ouro enchia as bruacas e como ninguém admitia a idéia de ali permanecer depois de rico, nada se plantava, não só porque do Rio das Velhas, tropas de negociantes para lá conduziam carnes e víveres de toda a natureza, como também as terras locais estavam revolvidas pela busca do ouro. Nem se empregariam os negros para plantações, pois que mais fácil seria comprar do que desviar um escravo das catas para semear mantimentos. O custo dos artigos mais necessários à vida, passou a custar cifras altíssimas”, conta o historiador Augusto de Lima Junior em “As Primeiras Vilas do Ouro”, onde narra o início da história das Minas Gerais. “Circulava ouro em pó, como moeda” e a escassez de alimentos fez com que muitos perdessem suas vidas por conta de uma fome devastadora que assolou as cidades daquela gente esquelética, em1700. “Defendia-se a saca de milho ou o saco de mandioca, de armas na mão”.
E hoje o que é defendido pelos que impunham armas? Será apenas a velha e boa riqueza, o apreço pelo conforto, ou a tentativa de obter, de alguma forma, algum tipo de poder?
Naquele tempo animais que serviam para o transporte dos forasteiros eram vigiados dia e noite, para que um faminto não arrancasse suas carnes de faca na mão.
Hoje dormimos de olhos bem abertos por medo de que nos arranquem o quê? Nossos próprios ossos, nossa própria vida? Tememos andar nas ruas, porque? Pelo ouro que vão nos tirar dos nossos dedos. Pelo carro que nos serve de mulas. Por nossa vida. Será que tememos, realmente, por nossa vida?
Existiria até a década de 60, em Minas, segundo Augusto de Lima Junior, um lugar chamado de Campo das Caveiras. Por terem encontrado nele milhares delas. Qual seria o nome que daríamos a ruas e becos do Rio de Janeiro hoje? E aos campos de guerras declaradas? Será fome ou pobreza que gera este massacre diário?
Pode-se dizer que pobreza corresponde à condição de não satisfação de necessidades humanas fundamentais como comida, abrigo, vestuário, educação, assistência à saúde, entre outras. Mas um indivíduo pode ser pobre sem ser afetado pelo grave problema da fome, bastando que sua condição de pobreza se expresse por carências básicas outras que não a alimentação.
Estaríamos nos matando por fome de quê? De comida ou de “sede”? Sede de quê?
Um cidadão que vive hoje com salário mínimo, em torno de R$400, tirando o que gasta de moradia, educação, alimentação, não vive certamente, sobrevive. Mas o que nada possui para alimentar-se, com certeza não possui forças para lutar.
Será mesmo a preocupação com alimentação ou com o futuro de seus filhos que levam pessoas sadias a marginalidade? Talvez existam outros caminhos para estas pessoas. Alguma oportunidade deve ser oferecida, para sonhos já esquecidos, ou nunca sonhados.
Políticas públicas sim. Educação sim. Amparo e proteção. Atenção pelo menos!
A ganância de nossos antepassados, dos nossos ancestrais não pode ser o motivo da guerra. Nem a pobreza é causa do caos urbano. Não é possível que exista algo que justifique esta insanidade.
Ações governamentais de combate à pobreza deveriam ter máxima prioridade na história deste país. Mas também ações que resultem em caminhos mais dignos a todo cidadão brasileiro. Intensificação de investimentos em educação, saneamento básico e cuidados com saúde. Alguma perspectiva de futuro.
Indignação justificada diante de uma sociedade tão injusta e plena de problemas como a brasileira.
