Ciberfantasias
Fantasias se criam e se destroem,Em torno dos sonhos, sonhos constroem,
Sonhar é um luxo bem acessível,
Basta pra isso não ser insensível. Para aquele infeliz que de dia labuta,
Seria um luxo pagar prostituta.
À noite na cama, amor solitário;
De dia, o mesmo problema:Salário.
Mas tem Internet. Se achar a comparsa,
Dizer que a ama seria uma farsa?
Não pode dizer que ama, afinal?
Eis o problema do pobre mortal.
E se lhe disser que é um qualquer,
Será que terá um segundo sequer?
Daquela que entra no chat como “Musa”,
Beldade hodierna um tanto obtusa.
O “chat”, é sabido, é neologismo.
Palavra importada, um anglicismo.
Lugar é de príncipe, nunca de sapo,
O antro sagrado do “Bate-papo”
De um lado, se tem um pobre coitado,
Só pena na vida, foi rejeitado.
Do outro, está a beldade obesa
Que ora é madona, ora marquesa.
Ele escreve: Eu sou um mancebo.
Ela responde: É claro, percebo.
Ele retruca: Sou executivo
E sou isso mesmo, sem diminutivo.
E a doce rainha tecla de onde?
Com muita vergonha de onde se esconde,
Responde a Ofélia “Quer mesmo saber”?
Eu sou sua musa, não uma qualquer.
Deusa eu sou, eu moro no Olimpo,
Com vista bonita e o céu sempre limpo.
Sou doce, sensível, já fui Miss Brasil,
Com corpo perfeito e alma febril.
Queria saber alguns outros detalhes.
O seu palácio é o de Versalhes?
Corada, a musa, no quarto alugado,
Responde: Olha como é abusado!
Fingindo morar no palácio francês,
Responde com erros de português.
E chega a hora de o outro falar,
Chegou sua vez de querer inventar.
Cara senhora, minha alma é pura,
Evite com isso qualquer conjetura.
Sou viúvo, sou rico, procuro um par,
Espero, princesa, poder-lhe agradar.
O papo já dura faz mais de uma hora,
O nobre senhor e a doce senhora.
Cada qual construindo um mundo farsesco
No qual o real deu lugar ao burlesco.
Basta uma clicada e ele é atleta
O mouse decreta ser ele poeta
Feliz com a sorte de ter numa tela
Prendido pra sempre a doce donzela.
E em mais uma hora vem o amasso
Bem virtual, lá no ciberespaço.
A paixão cresce, desenfreada,
Como todo amor à primeira teclada.
Moral da história quem há de achar,
Será suficiente parar para pensar.
Se for o seu caso, confesse: Errei,
Dessa água, não diga: Jamais beberei.
Do livro ´Desespero Provisório`, Ed. Edicon, 2006
*Alexandru Solomon é escritor, formado pelo ITA em Engenharia Eletrônica e mestrado em Finanças na Fundação Getúlio Vargas. Tem seu recente romance´Não basta sonhar` (Ed. Totalidade) disponível nas livrarias Cultura (www.livrariacultura.com.br), Saraiva (www.livrariasaraiva.com.br) e Laselva (www.laselva.com.br). | E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.