Hegemonia da Beija Flor expõe mazelas do privatizado Carnaval carioca!

“Vejam só o jeito que o samba ficou (e sambou), nosso povão ficou fora da jogada, nem lugar na arquibancada ele tem mais para ficar (oh,assim não dá!) Abram espaço nesta pista e, por favor, não insistam em saber quem vem ai, o mestre-sala foi parar em outra Escola carregado por cartola e o poder de quem dá mais, o puxador vendeu seu passe novamente, quem diria minha gente?! Vejam o que o dinheiro faz!

É Fantástico virou Hollywood isso aqui! Luzes! Câmeras! Som! Mil artistas na Sapucaí! (Refrão).

Mas, o show tem que continuar, pois muita gente ainda tem que faturar, compositores com mentes artificiais, hoje o samba é dirigido com sabor comercial, carnavalescos e destaques vaidosos, dirigentes poderosos criam tanta confusão!

E o samba? O samba vai perdendo a tradição!” (Refrão)

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Samba-enredo “E o Samba sambou” da São Clemente no Carnaval 1990 – Compositores: Helinho 107, Mais Velho, Nino e Chocolate.

O fundo da questão na hegemonia de títulos da Escola de Samba Beija Flor – nos últimos seis anos ela conquistou cinco - é a privatização do Carnaval carioca. Até a Passarela da Sapucaí ser construída (concebida genialmente por Darcy Ribeiro e Oscar Niemeyer) e inaugurada em 1984 pelo governador Leonel Brizola, os desfiles das Escolas eram bancados somente pelo Poder Público. O governador decidiu construir o Sambódromo “para acabar com a corrupção”. Isto é, o milionário “esquema” do próprio Poder Público com empreiteiras na montagem e desmontagem do aparato do desfile carnavalesco (arquibancadas, cadeiras, camarotes, palanques, cabines para imprensa, etc).

A ditadura militar acabou em 1984. Em 1985 surgiu a farsa da Nova República: Tancredo Neves foi declarado presidente. Moribundo, ele tomou posse simbólica e passou a presidência ao vice Sarney que governou com planos econômicos populescos (Cruzados I e II) até 1989 quando se elegeu presidente Collor. Sua posse ocorreu em 1990. Neste ano, o fim do autoritário e falso socialismo estalinista (estados operários burocratizados) no leste europeu trouxe como uma Tsunami mundial a moda das privatizações. Por isto, não foi à toa que no Carnaval carioca daquele ano uma Escola caracterizada pela irreverência (São Clemente) tivesse desfilado com o épico samba-enredo acima mencionado.

A partir daquele período a privatização chegou com tudo e para ficar no Carnaval carioca acarretando na exposição pública de uma mazela da sociedade carioca e brasileira que é a hipócrita tolerância com a atividade profissional (e marginal) do jogo do bicho uma vez tratar-se de contravenção penal. Por conta disto, quase todas as Escolas de Samba e a Liga Independente delas no Rio de Janeiro (Liesa) tornaram-se feudos de profissionais da contravenção penal do jogo do bicho. Com isto os desfiles carnavalescos das Escolas mais do que uma maravilha de espetáculo transformou-se no que vem a ser o dogma do capitalismo: Negócio para gerar lucros milionários.

As evidências são claras: A partir da era Sambódromo (1984) conquistaram títulos apenas Escolas de Samba dominadas por contraventores do jogo do bicho e principalmente aquelas cujos chefões, patronos e ou presidentes de honra tem poder na Liesa. Exemplos: Fundada em 1955, a Mocidade Independente de Padre Miguel, em função de sua magnífica Bateria é uma agremiação popularmente querida (inclusive por este portelense escrevinhador). Dos cinco títulos conquistados pela Mocidade só o primeiro (1979) não ocorreu na era do Sambódromo. Os demais (1985, 1990, 1991 e 1996) foram conquistados sob o comando do já falecido contraventor Castor de Andrade.

Outros exemplos: Fundada em 1959 a Imperatriz Leopoldinense conquistou seu primeiro título em 1980 (junto com a Portela e a Beija Flor). Seus outros sete títulos (1981, 1989, 1994, 1995, 1999, 2000 e 2001) foram conquistados sob o comando do ex-presidente da Liesa e atual da Imperatriz, o contraventor Luiz Pacheco Drumond, o “Luizinho” preso pela polícia mais de uma vez, a última em 2007. O atual Secretário da Liesa é o ex-presidente e atual Diretor de Carnaval da Imperatriz, o economista Wagner Tavares de Araújo. A partir do tri-campeonato (1999, 2000 e 2001), a Imperatriz passou a ser caracterizada como “Escola que desfila técnica, fria e estrategicamente para os jurados da Liesa”.

Já a Estação Primeira de Mangueira foi fundada em 1928, tendo conquistado 16 títulos, sendo cinco durante a era Sambódromo (1984 junto com a Portela, 1986, 1987, 1998 junto com a Beija Flor e 2002). O ex-presidente Elmo José dos Santos é o Diretor de Carnaval da Liesa. Às vésperas do Carnaval 2008 estourou uma crise na agremiação quando a mídia televisiva exibiu imagem do presidente Percival Pires, o “Perci” na festa de casamento do traficante Luiz Fernando dos Santos, o “Fernandinho Beira-Mar”. O presidente renunciou, mas a Polícia Civil investiga a hipótese da passagem secreta encontrada na quadra da Mangueira servir para o tráfico de drogas.

Por sua vez, a Beija Flor de Nilópolis que foi fundada em 1948 conquistou seus primeiros títulos nada mais nada menos que com um tri-campeonato (1976, 1977 e 1978) quando sofreu suspeita de favorecimento imposto pela ditadura militar (o filho do general-presidente Figueiredo foi destaque e mandou na agremiação). O tri-campeonato assim como os outros cinco títulos conquistados pela Beija Flor (1983, 1998 junto com a Mangueira, 2003, 2004, 2005, 2007 e 2008) foram conquistados sob o comando de seu presidente de honra, o contraventor Aniz Abrahão David, o “Anízio”. Ele foi preso pela polícia mais de uma vez, sendo a última em 2007 pela Polícia Federal.

Outras agremiações permanecem dominadas por contraventores do jogo do bicho. Poucas pôs fim à ligação delituosa. A mais notória é a Portela. Fundada em 1923, a agremiação é a que mais títulos conquistou, 21. O último coincidentemente ocorreu em 1984, junto com a Mangueira. Por sinal, 1984 foi o ano em que a Portela sofreu o “racha” (Tradição) causado ironicamente por familiares do patrono portelense, o legendário contraventor do jogo do bicho “Natal” (Natalino José do Nascimento). Não por acaso, a Portela faz honra ao mérito de seu patrono. Porém, a partir de 2005 com a eleição de seu recém reeleito presidente Nilo Mendes Figueiredo, a agremiação pôs fim ao ciclo de sua ligação com o jogo do bicho.

Para não nos alongar, esta decisão de ruptura com a contravenção do jogo do bicho feita pela Portela é imprescindível, devendo o exemplo ser seguido por todas as co-irmães. Entretanto, não é tudo. Haja vista que conforme já afirmamos, além da hegemonia atual ser imposta pela Beija Flor – anteriormente foram Mocidade, Imperatriz e Mangueira – todas dominadas por contraventores. Da mesma forma, o mesmo ocorreu com as demais agremiações campeães durante a era Sambódromo: Vila Isabel (1988 e 2006), Estácio (1992), Salgueiro (1993) e Viradouro (1997). Daí o título do texto cuja conclusão-proposta-reivindicação apresentamos a seguir.

A Liga Independente das Escolas de Samba do Rio de Janeiro (Liesa) não é mais presidida por um contraventor do jogo do bicho, mas sim por um competente executivo. Este fato não anula o de que ele é um emergente que surgiu da indevida privatização do Carnaval carioca que consolidou prestígio, riqueza e poder aos contraventores do jogo do bicho. A solução é o Carnaval carioca ser realizado (concebido, organizado e executado) pelo Poder Público (Estado e Município), ficando para a Liesa o controle fiscalizador do Evento; haja vista tratar-se da entidade mor e representativa de grêmios recreativos e escolas de samba. Não uma prestadora de serviço privado para contraventores penais!

*jornalista (Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.) – enquanto amante de samba é torcedor da Portela.




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