Mineiro tem umas coisas estranhas não é mesmo? Tem mania de chamar de
trem qualquer coisa que lhe aconteça ou que surja. Mas o maior barato
de reconhecer um mineiro é na praia. Ali ele é imbatível, até porque,
claro, Minas não tem mar, tem rios, e por isso o mineiro acha que o mar
é igual a um rio – quer dizer – igual não, porque o rio é doce, e o
mar, salgado.
Mas quem mora em beira de praia é que conhece as manhas do mar, do
vento, dos peixes e até do tempo. E o mineiro, que só consegue ver
montanhas e céu, ops, rio também, acaba achando que o mundo é
igualzinho, ao mundinho dele. Daí, que quando eles vêm o mar, ficam
espantados diante do tamanho, e da imensidão da distância do mar em
relação à linha do horizonte, e ao tamanho das ondas.
Pior ainda do que isso é quando as mineiras chegam na praia, e desconhecem os rigores do Sol, e acham que um dia na praia irá lhes dar o tom bronzeado de quem já vive a beira-mar, apenas para tirar um sarro de quem não foi à praia. E acabam virando o alvo de muitos risos, na praia, como por exemplo “vermelha como um camarão”. E elas ficam com tanta vergonha disso. Que no dia seguinte são obrigadas a ficar em casa, ou vestirem um camisolão para se banhar, ou, se lambuzarem com essas pastas e cremes que são vendidos aos olhos da cara, na praia.
Por isso conto em detalhes alguns momentos que passei em uma praia e convivia com mineiros diariamente.
Primeiro era um tal de “eh! Trem bão, sô!”, ai, ai. Coitados nem imaginam o que irão encontrar.
Você conhece uma mineira que chega na praia pelo modo todo tímido com que ela chega na areia. Sempre agarrada nos braços da mãe, vestida com uma camiseta que mais parece uma camisola de dormir, escondendo até mesmo os joelhos. Coitadinha, tão envergonhada!
Depois, para tirar a roupa, é uma vergonheira que só vendo. A vergonha é tão grande, que algumas vezes elas ficam tão tímidas que acabam passando o dia na praia com o camisetão, mas isso é só no primeiro dia, enquanto ela acha que tá todo mundo olhando para ela. No dia seguinte a situação já é diferente, e ela vai tirando a blusa devagarinho com todo o cuidado – não sei de quê!
Mas como em praia sempre venta muito. E às vezes parece que até o vento também gosta de fazer uma sacanagem com as mineiras. Parece que quando sabem que tem mineira na praia fazem questão de ventar bem forte, só para implicar. E foi numa dessas que um dia uma mineirinha chegou na praia e toda prosa resolveu desenrolar a toalha para estica-la na areia. Era um tal de desenrola, joga, estica e a toalha voltava, por causa do vento, que fiquei parado olhando por um bom tempo só para ver o que ela iria fazer, e assim foi por uma, duas, três, quatro, cinco vezes. Até que ela se tocou que eu estava ali, há uns 15 metros parando olhando para ela.
- Uai! O que ocê ta olhando?
- Sabia que você era mineira!
- Uai! Como é que ocê sabe?
- Claro! Querendo esticar a toalha contra o vento, só podia ser coisa de mineiro!
- E como é que eu faço?
- Ai, ai, ai, é simples. Ponha-se a favor do vento. De costas para o lado onde o vento vem. Vai, fica assim como eu (porque eu estava na direção que o vento ventava).
- Agora, estica a toalha! Viu como é mais fácil?
- Ah! Obrigado!
E fui embora morrendo de rir da mineirinha.
(...)
Num outro momento, caminhava na areia da praia e vi um bando de garotinhos correndo em direção ao mar. Mas quando o mais loirinho chegou na beira do mar se abaixou, molhou a palma da mão e a levou à língua, percebi de imediato que era mineiro. Como os outros já estavam correndo da onda que explodia na beira e vinha com toda força para cima da areia mais seca. O menininho me viu e com olhos arregalados e espantados me disse:
- Moço! Porque a água ta salgada?
Aproveitei então para tirar um sarro do menino.
- Ué! Você não sabe o que aconteceu?
- Não!
- Foi um caminhão Scania carregadinho de sal que virou bem ali – e apontei para algum lugar mais adiante no mar.
O garotinho, espantado com a revelação saiu correndo e foi gritando para a mãe que estava abrindo sua cadeirinha de praia.
- Mãe! O mar é salgado porque um caminhão carregando sal tombou bem ali.
Ainda bem que eu já estava bem longe, e não pude olhar para a cara da mãe do menino que devia estar fula da vida, porque alguém resolvera fazer troça do filho dela.
Mas a melhor mesmo foi quando conheci um pessoal de Minas e estávamos todos juntos na praia, até que uma das filhas veio correndo da água, pedindo socorro para a sua mãe.
- Mãe! Tem um trem no meu olho!
Parei e fiquei olhando para a cara das duas. Até que a garota resolveu me perguntar o que eu estava olhando.
- Uai! To tentando ver o tamanho do trem que ta no teu olho!
Então ela percebeu que para mim, trem é uma coisa bem diferente do trem que estava no olho dela.
* O autor é Bacharel em Comunicação Social com especialização em Jornalismo.