O mundo parece caminhar para uma exatidão científica um pouco aterradora. Predominam análises quantitativas e planejamentos estritos, com perguntas e respostas pretensamente previsíveis em fluxos de processos e de organização que acreditam tudo poder controlar e em um aperfeiçoamento permanente para que isso de fato aconteça.
Cabe lembrar, nesse contexto que, em 1929, há 90 anos, portanto, era lançado o filme “Um cão andaluz”, dirigido por Luiz Buñuel, com roteiro dele com Salvador Dalí. Ali está uma das cenas mais icônicas do cinema até hoje: uma mulher tem o olho cortado por um homem, o próprio diretor, portando uma navalha.
Muito foi escrito para interpretar essa cena inicial, talvez inutilmente. Afinal, esse curta de 17 minutos é criado dentro de uma atmosfera surrealista, muito influenciado pelos escritos de Freud sobre a interpretação dos sonhos e pelo pensamento de que a falta de lógica e o livre fluir das ideias e de associações de imagens é algo fundamental para a própria civilização.
Formigas saindo das mãos de um ator e cabeças de burro mortas sobre um piano complementam a instauração de uma supra realidade em que tudo é possível. Estamos falando de um universo que está além da realidade tangível e, portanto, em que não há necessidade de lógica cartesiana ou de proibições. Talvez seja dessa liberdade que a nossa sociedade precise para respirar livremente.
Oscar D’Ambrosio é jornalista pela USP, mestre em Artes Visuais pela Unesp, graduado em Letras (Português e Inglês) e pós-doutorando e doutor em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e Gerente de Comunicação e Marketing da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.