Caro José Milbs:
Meu amigo Celso Lungaretti é um pouco impressionado com meu estilo e
impulsiona-me, faz tempo, para escrever. Ele não sabe como estou
vagabundo. Houve época em que eu não era. Trabalhei décadas no grupo
Estado e só agora, aos 71 anos, estou terminando a Faculdade de
Jornalismo. Colo grau em 26 de fevereiro de 2008. Quando comecei, 1961,
não havia faculdade de jornalismo no Brasil. A primeira surgiu em 1966,
a Eca, da USP. Desde o primeiro dia na faculdade da Universidade São
Judas, eu dizia: estou aqui apenas para transitar pelas matérias de uma
faculdade de jornalismo. Queria desvendar esse mistério. Estava muito
aborrecido em ver gente com faculdade – que não sabia fazer o ó com o
copo – me olhar por cima. Agora sou jornalista também. Quando eu
morrer, quero meu diploma de jornalista bem em cima do caixão. Só falta
este mês de novembro, com a permissão de Deus. Para me formar, não
morrer.
Tudo isso para agradecer a acolhida que a minha crônica mereceu de você, e para me justificar por não querer escrever, no momento.
O Celso vai ficar louco comigo, mas depois de terminar a faculdade quero voltar a fazer exercícios – adoro correr, não como velocista – e escrever meus livrinhos. Tenho um pequeno, prontinho, mostrando o olhar espírita sobre o aborto, um outro sobre a decadência do bairro do Bixiga, em São Paulo, e um, obrigatório na faculdade, sobre morador de rua. Uma das entrevistas do livro é essa que o Celso te mandou. Tenho também uma peça de teatro iniciada, e no momento muito atravancada. Tem que sair um dia. É sobre um sujeito bonitão e garanhão chamado Pilatos. Aquele mesmo que lavou as mãos. Não tenho vontade no momento de me ocupar com crônicas de nenhum tipo.
Passei pela Rádio Eldorado, Estadão, Jornal da Tarde e Agência Estado. Breve passagem pela Folha e revistas, fora os free, os que mais me davam dinheiro. Da Agência Etado fui fundador e lá fiquei durante 18 anos. Nessa época editava por fora o jornal Estadinho, dos funcionários. O logotipo passou agora para o suplemento infantil. Para o Estadinho escrevi umas 20 crônicas sentimentais, muito babacas, que foram distribuídas pela Agência Estado. Bobageiras de adolescente. Se você quiser, essas estão prontas e são bem curtas.
Atente para um detalhe: sou semi-analfabeto digital. Não vou montar blog. Vai ser muita canseira para o velhinho aqui. Não tenho dinheiro. O INSS me sacaneou e tenho uma aposentadoria de velhinho. Qualquer dia te explico a sacanagem, essa sim, gostaria de ver publicada no mundo inteiro.
No ano do Nosso Senhor de 2005, segundo ano da faculdade, aos 68 anos, entregava trabalhos datilografados. Os professores me olhavam com cara de choro. A minha vida inteira foi a velha Olivetti. Quando a professora Jaqueline, bonita e talentosa, falou uma vez: esse trabalho tem de ter 1.400 caracteres, espaço duplo e justificado, eu suei e passei mal. Fui treinando e hoje ligo e desligo um computador, digito, salvo, imprimo e navego um pouco na internet. Só isso. Se você quiser as crônicas que eu fiz para o Estadinho, e que eu chamo de crônicas porque não sei que outra coisa chamar, avise que mandarei para o teu e-mail. Como disse, são curtinhas.
E se você quiser um livrinho sobre o Celso que eu escrevi no segundo ano da faculdade como trabalho escolar, avise-me que eu mando. Aliás, vou mandar sem você pedir. Tem 53 páginas muito pequenas, espaço dois.
Meu Deus, acho que acabei de escrever uma crônica, sem querer.
(Apóllo Natali)