O mensalão existiu? Existiu.
O propinoduto da Petrobrás existiu? Existiu.
Muitos têm dito cobras e lagartos a meu respeito porque, antes como agora, eu me nego a fingir ingenuidade.
No primeiro caso, ressalvei que todos os partidos influentes se emporcalhavam da mesmíssima maneira e que o rigor contra os réus petistas era inaudito; e também que o Dirceu e o Genoíno não haviam entrado nessa movidos pela ganância, mas sim por acreditarem que era o único jeito de garantirem a governabilidade (ou seja, não visavam ao enriquecimento pessoal, equivocando-se, contudo, quanto ao tipo de serviços que deveriam prestar à causa).
Mas, tapar o sol com a peneira, isto eu não faço, porque sempre considerei que revolucionários e jornalistas têm um compromisso fundamental com a verdade; o meu eu honro, custe(me) o que custar.
Então, fico satisfeito com o reconhecimento explícito e inequívoco, por parte de um figurão do petismo, de que quando há fumaça, há fogo.
O secretário-geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, acaba de afirmar que a corrupção continuará existindo "enquanto houver financiamento empresarial de campanha, e as campanhas tornarem-se o momento de muita gente ganhar dinheiro e de se mobilizarem muitos recursos".
Para não restar nenhuma dúvida, ele foi taxativo:
Gilberto Carvalho: sinceridade que fazia falta. |
"Não há quem controle a corrupção enquanto houver esse sistema eleitoral. Isso é com todos os partidos. Não há, infelizmente, nenhuma exceção".
Aplaudo a sinceridade do Gilberto Carvalho. Ele é um dos melhores quadros que restaram no PT depois que tantos idealistas saíram ou foram saídos.
Com idêntica honestidade intelectual, reconheço que ele está inteiramente certo quanto à receita para o sucesso no universo putrefato da política oficial. Os partidos que almejam eleger prefeitos, governadores e presidentes, bem como constituir fortes bancadas legislativas, são mesmo obrigados a, pragmaticamente, adotarem procedimentos ilícitos por baixo do pano.
Só não vejo como o financiamento público das campanhas eleitorais vá resolver o problema, pois os sucessivos escândalos nos revelam que os parlamentares e governantes corrompidos jamais se limitaram a obter o dinheiro sujo necessário para a caça aos votos; continuam se vendendo do primeiro ao último dia dos seus mandatos, já que, para tal escória moral, o céu é o limite.
E a admissão de que é impossível controlar a corrupção na política oficial me leva à seguinte reflexão: para nós, revolucionários, vale a pena magnificarmos a conquista e manutenção de posições num sistema tão carcomido e tão dependente do (portanto, tutelado pelo) poder econômico?
Depois de quase 12 anos de governos petistas, quanto a revolução brasileira avançou? Nem um milímetro. Algumas benesses foram distribuídas aos mais pobres, algumas conquistas sociais podem ser exibidas, mas, no que realmente conta, o grande capital continua dominando a sociedade e avassalando-a aos seus interesses. Esta é a verdade nua e crua.
O saudoso Plínio colocou o dedo na ferida |
Então, eu acredito que seria preferível a esquerda encarar a política oficial apenas como tribuna para amplificar suas denúncias e oportunidade para a acumulação de forças, sem sujar as mãos no afã de ganhar eleições ou no sentido de garantir a aprovação de seus projetos.
É o que, com sua profundidade característica, escreveu o grande Plínio de Arruda Sampaio (para acessar o artigo completo, clique aqui):
"O capitalismo real, tal como existe no Brasil era do imperialismo total, é incompatível com a democracia e a soberania nacional. A burguesia brasileira depende do imperialismo e sobrevive às custas de reprodução permanente de mecanismos de acumulação primitiva que perpetuam a superexploração do trabalho. Nessas condições, o espaço para mudanças dentro da ordem é praticamente nulo.
A 'democracia real', tal como ela existe no Brasil, não abre espaço para transformação social. Ela funciona como mero ritual eleitoral que operacionaliza a alternância no poder entre as diferentes facções da burguesia, dando um verniz de legitimidade a um padrão de dominação que é, na sua essência, profunda e intrinsecamente antidemocrático. Para sair do impasse em que se encontra, o movimento social terá de radicalizar a crítica ao capitalismo e redefinir o modo de conceber a complexa dialética entre reforma e revolução"..
Então, acrescento eu, inexistindo espaço para mudanças dentro da ordem, cabe-nos priorizar nosso maior (verdadeiramente único) patrimônio: a capacidade de inspiramos esperança ao povo. Se nos deixarmos desmoralizar, incidindo nas maracutaias praticadas "sem nenhuma exceção" pelos partidos convencionais, o povo não acreditará em nós nem nos acompanhará quando formos "radicalizar a crítica ao capitalismo", único caminho para transformarmos verdadeiramente a sociedade.
É simples assim.
Por Celso Lungaretti, no seu blogue