No finalzinho de 2013, os trabalhos da Comissão Nacional da Verdade foram prorrogados por sete meses. Então, com o novo prazo fixado pela medida provisória, o relatório final do colegiado não mais será divulgado no próximo mês de maio, mas sim em 16 de dezembro de 2014.
Fontes palacianas atribuem a decisão da presidenta Dilma Rousseff ao seu desejo de evitar um tiroteio direita-esquerda durante a campanha presidencial -o qual, evidentemente, seria prejudicial às suas pretensões reeleitorais.
Desta vez, pelo menos, o adiamento desnecessário do desfecho não manterá um cidadão sob prisão arbitrária durante uma eternidade, como aconteceu com o Cesare Battisti. Mas, se a verdade foi colocada na dependência do calendário eleitoral, ao que mais se sujeitará?
A própria comissão criou a expectativa de que uma de suas recomendações venha a ser a revisão da Lei da Anistia, passo inicial para o Brasil acompanhar a tendência mundial e seguir a recomendação da ONU, no sentido de que não sejam deixados impunes os agentes do terrorismo de estado. Trata-se do primeiro nó que tem de ser desatado para uma punição efetiva dos torturadores.
O segundo: levar a questão novamente ao Supremo Tribunal Federal, na esperança de que mude seu entendimento sobre os habeas corpus preventivos que os carrascos concedem a si próprios em plena vigência dos regimes de exceção.
A questão é: podemos confiar que as decisões da CNV não vão obedecer igualmente às conveniências políticas?
Como a Dilma fugiu do pedido de asilo do Edward Snowden como o diabo da cruz, sinalizando não querer de maneira nenhuma peitar os EUA, podemos supor que não quererá também peitar as viúvas da ditadura e os militares da reserva, cuja influência efetiva sobre as tropas é nenhuma, mas cujos blefes ainda provocam muita tremedeira no Palácio do Planalto.
Temo que a revisão da Lei da Anistia venha a ser recomendada pela CNV apenas na hipótese de derrota da Dilma; seria um dos vários abacaxis a serem colocados no colo do(a) sucessor(a).
E que, vitoriosa, ela não queira nem ouvir falar do assunto, com a CNV abstendo-se de causar-lhe aborrecimentos.
Tomara que meus temores sejam infundados...
* jornalista, escritor e ex-preso político. http://naufrago-da-utopia.blogspot.com