ASSOCIAÇÕES MÉDICAS SEGUEM À RISCA O JURAMENTO DE HIPÓCRITA

ano é 1930. As tropas insurgentes de Getúlio Vargas vêm do RS para tentarem tomar a capital federal (Rio de Janeiro). Os efetivos leais ao presidente que elas querem depor, Washington Luiz, esperam-nas na cidade de Itararé, divisa entre SP e PR. Canta-se em prosa e verso aquela que será a mais formidável e sangrenta das batalhas.

Mas, nem um único tiro é disparado: antes, o presidente bate em retirada, entregando o poder a uma junta governativa.

Ironizando, o grande humorista Aparício Torelly escreve que, como nada lhe reservaram no rateio de cargos governamentais entre os vencedores, ele próprio se outorgaria a recompensa:
"O Bergamini pulou em cima da prefeitura do Rio, outro companheiro que nem revolucionário era ficou com os Correios e Telégrafos, outros patriotas menores foram exercer o seu patriotismo a tantos por mês em cargos de mando e desmando… e eu fiquei chupando o dedo. Foi então que resolvi conceder a mim mesmo uma carta de nobreza. Se eu fosse esperar que alguém me reconhecesse o mérito, não arranjava nada. Então passei a Barão de Itararé, em homenagem à batalha que não houve".
Uma  batalha que não houve  é o desfecho para o qual se encaminha a pendenga entre associações médicas e o Governo Federal, pois inexiste qualquer base legal para elas se queixarem à Justiça ou chamarem a polícia, numa retaliação corporativa à importação de profissionais cubanos. É tudo blefe, dos mais patéticos.


Se algum energúmeno tentar, vai perder e se desmoralizar. Ponto final.

Quanto ao  presidente do Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais, João Batista Gomes Soares, que prometeu orientar os médicos do Estado a não corrigirem eventuais erros dos cubanos, está simplesmente aconselhando-os a incorrerem no crime de  omissão de socorro

Merece não só perder a  boquinha, como ser excluído da profissão e até processado criminalmente. Ao invés do juramento de Hipócrates, segue o juramento de hipócrita, colocando as suas pirraças acima da integridade física e até da vida dos pacientes. 

No que tange ao xis do problema, o Ministério da Saúde deveria ter encaminhado o assunto de uma forma mais perspicaz, exortando as entidades médicas a assumirem o compromisso de garantir o atendimento dos coitadezas dos grotões, dentro das disponibilidades orçamentárias da Pasta.


Se prometessem e cumprissem, maravilha.

Se alegassem ser-lhes impossível fornecer tal garantia, então não teriam moral para criar empecilhos à solução alternativa que as autoridades resolvessem adotar. Simples assim.

Sendo leigo em medicina, não me porei a discutir se os cubanos estão ou não suficientemente qualificados para cuidar de cidadãos brasileiros. 

Mas, pragmaticamente, as pessoas sem antolhos ideológicos decerto concluirão que a presença de quaisquer médicos nas comunidades carentes é melhor do que deixá-las em completo abandono. Se os doutores caribenhos se dispõem a trabalhar nas mesmas condições que os mercenários brasileiros recusam, então temos mais é de ser-lhes gratos. Simples assim... de novo!

Além da  batalha de Itararé, este vergonhoso episódio e o destaque desmesurado que lhe é dado pela imprensa canalha me fez lembrar Shakespeare: trata-se de muito barulho por nada elevado à enésima potência...

P.S.: depois de escrito este artigo, veio à tona o estranho esquema de pagamentos adotado no programa Mais Médicos. O dinheiro vai para as autoridades cubanas, que repassam só uma parte para os doutores, confiscando mais da metade. A colunista que aludiu a  condição análoga à escravidão  exagera, mas não deixa de ter certa razão. E, com isto, passaram a existir fundamentos legais para o questionamento do programa nos tribunais. Os responsáveis pela lambança deram, de mão beijada, a munição que faltava para os anticomunistas e/ou corporativistas extremados. Afora isto, o advogado geral da União, Luís Inácio Adams, declarou  parecer  a ele que os médicos caribenhos não têm direito a asilo político, se o solicitarem. Mas, como não cabe à AGU alterar a Constituição, tal direito continua existindo e o asilo tem de ser assegurado, não questionado, independentemente do que pareça ou deixe de parecer ao Adams.

     * jornalista e escritor. http://naufrago-da-utopia.blogspot.com

publicidade
publicidade
Crochelandia

Blogs dos Colunistas

-
Ana
Kaye
Rio de Janeiro
-
Andrei
Bastos
Rio de Janeiro - RJ
-
Carolina
Faria
São Paulo - SP
-
Celso
Lungaretti
São Paulo - SP
-
Cristiane
Visentin

Nova Iorque - USA
-
Daniele
Rodrigues

Macaé - RJ
-
Denise
Dalmacchio
Vila Velha - ES
-
Doroty
Dimolitsas
Sena Madureira - AC
-
Eduardo
Ritter

Porto Alegre - RS
.
Elisio
Peixoto

São Caetano do Sul - SP
.
Francisco
Castro

Barueri - SP
.
Jaqueline
Serávia

Rio das Ostras - RJ
.
Jorge
Hori
São Paulo - SP
.
Jorge
Hessen
Brasília - DF
.
José
Milbs
Macaé - RJ
.
Lourdes
Limeira

João Pessoa - PB
.
Luiz Zatar
Tabajara

Niterói - RJ
.
Marcelo
Sguassabia

Campinas - SP
.
Marta
Peres

Minas Gerais
.
Miriam
Zelikowski

São Paulo - SP
.
Monica
Braga

Macaé - RJ
roney
Roney
Moraes

Cachoeiro - ES
roney
Sandra
Almeida

Cacoal - RO
roney
Soninha
Porto

Cruz Alta - RS